O PS é um partido cómico. Nos últimos meses qualquer socialista que se preze parece ter tomado para si as dores de entreter o país. O último motivo de risota é terem dado em sugerir-nos que avaliemos as capacidades pessoais de Costa por oposição às suas ideias. E por que é isto tão divertido? Eu explico.

Lembram-se daqueles tempos longínquos em que os portugueses eram compulsivamente felizes, o governo ainda não fora tomado (através de magia negra) por malfeitores que têm como ambição empobrecer o país, quando havia dinheiro a rodos para distribuir o brinquedo Magalhães e colocar nas escolas candeeiros e torneiras de designers de topo (a expensas da Parque Escolar – e do contribuinte)? Tempo de governação competente que terminou num resgate da troika, mas só porque pessoas que nos costumavam emprestar dinheiro – os patifórios – deixaram (graças ao vudu) de o fazer?

Também se recordam, nesse tempo glorioso, de um ou outro caso mediático que envolvia o primeiro-ministro Sócrates em situações onde não fica bem um pm estar envolvido? E do rasgar de vestes dos apoiantes de Sócrates pela campanha pessoal que se fazia contra o distinto pm? E do enfado moralista porque se discutia o primeiro-ministro em vez de apenas as suas políticas?

Socorriam-se da frase de Eleanor Roosevelt (que disse muitos disparates ao longo da sua vida, há que elogiar à senhora essa consistência) ‘as grandes mentes discutem ideias, as mentes médias discutem eventos e as mentes pequenas discutem pessoas’ para esmagar com prova de pequenez os picuinhas que desgostavam de ter um primeiro-ministro que declarou comprar a sua casa consideravelmente mais barata do que os vizinhos que estavam isentos do pagamento de siza (um exemplo, entre tantos).

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Claro que esta conversa é inútil. Todos sabemos que não é indiferente sermos governados por quem organiza, delega, responsabiliza e implementa as políticas votadas ou quem se enrola nas ideias (mesmo se brilhantes) e não decide nem contorna os contratempos e termina sem resultados para apresentar. Quem tem ideias fixas que aplica sempre ou quem entende que respostas a situações diferentes são necessariamente diferentes e sabe reconhecer, se for o caso, que a ideia que um dia defendeu afinal não é a melhor abordagem. Quem exige vassalagem ou quem negoceia, respeita os adversários políticos e tenta o compromisso. Quem tem um ego insuflado e não aceita que a realidade não se vergue à sua vontade e quem tem uma noção realista da sua capacidade influenciar o mundo. Isto para não viajarmos até à personalidade governativa criminosa.

Com Sócrates não podíamos julgar a pessoa, com Costa devemos julgar a pessoa. Ignoremos por agora a incoerência socialista e festejemos que tenham finalmente chegado à boa conclusão: a personalidade de um político conta. E analisemos Costa. Este já fez o favor de referir, quiçá pretendendo gentilmente poupar-nos o trabalho, ‘liderança’ e ‘visão estratégica’.

Eu sugeria ao leitor um grau de exigência um tudo-nada superior e que não aceitasse apenas a auto-avaliação de Costa. Vamos à personalidade. Até porque não há mais nada para avaliar: se as ideias de Costa sobre si próprio são abundantes, sobre o país, até ver, são inexistentes. Correção: já sabemos que desvaloriza o problema da dívida e das contas públicas e favorece o dos não especificados ‘problemas estruturais’. Estranho, contudo, num país a braços com uma crise financeira – e ofereço desde já os préstimos do meu filho de 8 anos para explicar a Costa, com palavras simples, que para qualquer política pública é necessário ter dinheiro (dos contribuintes ou dos patifórios que emprestam) para a pagar. Também sabemos que as ideias que Costa entretanto magicar serão para uma década – o que é bom, já que, a ser eleito, será por 4 anos.

Aguardo ainda com expetativa que Costa nos informe dos ‘problemas estruturais’ do país cuja resolução solucionará o problema orçamental – e criará riqueza e trará outra vez a felicidade compulsiva, certamente. Resolução que, presumo, se obtém proferindo mantras tibetanos ou pela adesão sincera de todos os portugueses de boa vontade ao espírito de ‘mobilizar Portugal’ (o seu slogan). Porque, lá está, se para a resolução dos misteriosos ‘problemas estruturais’ for necessária dotação orçamental, entramos num argumento circular e as mentes menos mobilizadas podem desconfiar que os problemas orçamentais são em si mesmo um problema estrutural.

Mas Costa considera ter ‘visão estratégica’. Estamos salvos. Ufa.