A 9 de Julho, assinalei aqui os primeiros 190 anos da revista britânica The Spectator. Chegou agora a vez de comemorar os 175 anos da também britânica The Economist.

Uma primeira pergunta que os dois vetustos aniversários podem sugerir é por que motivo existem revistas independentes tão antigas em Inglaterra. E uma óbvia resposta que pode ocorrer em primeiro lugar é que o facto de não ter havido revoluções em Inglaterra desde 1689 deve seguramente ter ajudado. Um clima de liberdade ordeira permite que as instituições cresçam tranquilamente e se consolidem.

A óbvia pergunta seguinte ocorre de imediato: por que motivo não houve revoluções em Inglaterra nos últimos 329 anos? A leitura desta edição comemorativa dos 175 anos de The Economist pode certamente ajudar a começar a responder a esta pergunta.

A revista assinala os 175 anos com um longo ensaio (pp. 41-52) intitulado “The Economist at 175: Reinventing liberalism for the 21st century”. Não seria possível, nem certamente aconselhável, tentar resumi-lo aqui. Limitar-me-ei a destacar aquilo que me pareceu mais distintivo da liberdade ordeira inglesa. Creio que não é difícil de identificar.

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The Economist define-se como defensora do liberalismo — “não o esquerdismo progressista dos ‘campuses’ das universidades americanas, nem o direitista ultraliberalismo congeminado pelos comentadores franceses, mas um comprometimento universal com a dignidade individual, mercados abertos, governo limitado, e uma fé no progresso humano resultante do debate e da reforma”.

Em seguida, a revista declara que estes ideais — que contribuíram decisivamente para produzir o mundo moderno e a prosperidade inédita a ele associado — estão hoje em crise na Europa e na América que os geraram. E essa crise tem expressão na revolta dos eleitorados.

Até aqui, não parece haver nada de novo (com ligeira excepção da definição particular de “liberalismo”). O que é realmente original vem a seguir.

Em vez de culpar os eleitores pela revolta contra o “liberalismo”, ou culpar as conspirações destes ou daqueles, ou a ignorância dos “eleitores brancos pobres”, ou a “xenofobia nacionalista” desses eleitores contra os imigrantes, — em vez de tudo isso, The Economist procura entender as motivações dos eleitores.

E conclui que existem razões para a revolta dos eleitores: “a Europa e a América enfrentam uma rebelião popular contra as elites liberais, que são percepcionadas como usando o sistema para se servirem a si próprias e como incapazes, ou sem vontade, de resolver os problemas das pessoas comuns.”

A revista não subscreve essas percepções do eleitorado. Mas reconhece que há algum fundamento para elas: “o sucesso das ideias liberais tornou as elites liberais complacentes e totalmente alheadas das preocupações das pessoas comuns.” Para enfrentar este distanciamento, a revista propõe então uma longa lista de reformas, a que chama “um manifesto para um renascimento liberal — um liberalismo para as pessoas comuns”.

Não é possível resumir aqui essa longa lista de reformas. Nem esse é, de momento, o meu tema central. Não pretendo subscrever, nem contrariar, as medidas específicas propostas por The Economist (embora não possa deixar de mencionar a proposta de controlo da imigração). O que pretendo sublinhar é a atitude da revista:

“Os liberais precisam de gastar menos tempo a desprezar os seus críticos, classificando-os de doidos ou fanáticos, e de gastar mais tempo a corrigir o que está mal. (…) Os liberais devem aceitar as críticas e dar as boas-vindas ao debate como fonte de novas ideias que irão reavivar o seu movimento. (…) Isto significa liberdade de expressão. E expressão que seja bem informada e de boa fé.”

Estas palavras trazem imediatamente à memória a comemoração dos 190 anos de The Spectator, em Julho passado. Também ela condenou as dicotomias tribais que estão a dominar o debate actual. E defendeu “a tradição britânica de robusta mas amigável discordância.”

As duas revistas são de certa forma concorrentes: The Spectator ao centro-direita, The Economist ao centro/centro-esquerda (por padrões britânicos — ambas provavelmente ao centro-direita por padrões continentais). Mas ambas apontam a mesma convergência em torno de regras gerais de conduta civilizada: a recusa das dicotomias tribais e a retoma da tradição britânica de robusta mas amigável discordância.

Talvez esta convergência em torno de regras gerais de conduta civilizada por parte de propostas rivais possa ajudar a perceber por que motivo não houve revoluções em Inglaterra nos últimos 329 anos. E por que motivo subsistem revistas independentes tão antigas.