Diretos aos assunto: chega Setembro e o regresso às aulas e o que se discute sobre Educação são os questões de sempre. Colocação e falta (e as eternas medidas sem nexo com isto relacionadas) de professores, duração de períodos lectivos, insegurança, falta de motivação. Até já li algures que o problema mesmo era ter-se passado de trimestres a semestres no que toca a avaliação. Argumento profundo, como se vê. É verdade que a já célebre disciplina para a pseudocidadania fez pensar mais no tema e que a incapacidade de captar pessoal docente também o fará, a seu tempo. Mas são e serão sempre discussões pontuais, sectárias, que aprofundam a divisão dos vários intervenientes e das quais resultam soluções avulsas, de muito curto prazo e que raramente têm em conta o aluno e o ser humano que enquanto sociedade temos o dever de cuidar e fazer crescer.

Vinte anos de docência no sector privado mostraram-me que não há milagres mas que, quando há coordenação e espírito de entreajuda entre as várias partes, quando há tempo, espírito de missão e vontade e objectivos bem definidos a acção transformadora da Escola no seu conjunto pode acontecer. Por este país fora há inúmeros e extraordinários exemplos disso mesmo. Mas essa ou essas são as excepções, não a regra. E muito pouco valorizadas. Por incapacidade, por falta de meios, por processos burocráticos cada vez mais penosos, por questões ideológicas e ausência de visão, por programas curriculares não isentos e desajustados no tempo e no espaço. E que não promovem (talvez propositadamente ) o mais importante: o desenvolvimento do sentido crítico, do saber/fazer pensar que nos deve acompanhar para além da Escola mas que tem naqueles anos uma essencial importância para a aquisição e potenciação do verdadeiro conhecimento e das vivências em sociedade e que vai muito além da mera memorização ou repetição acrítica do que é transmitido.

Em conflito dois modelos opostos entre si: um demasiado eivado de ideologismo, por um lado, e de pragmatismo, por outro, que visam, num caso, formar cidadãos obedientes ao Estado e, no outro, produtores eficientes no mercado; o segundo, que privilegia o sentido crítico e que forma Seres Humanos em toda a sua dimensão e dignidade para seres eles próprios agentes de mudança, conscientes e actuantes. Livres, portanto.

Como já defendi anteriormente, e como outros países, como a Finlândia, já fizeram, deve ser este um dos grandes desígnios estratégicos nacionais. Continuar a ignorar o problema por muitos mais anos, seguindo a primeira via e reportando para outros responsabilidades que são de todos irá, e já o estamos a sentir em algumas áreas, comprometer o nosso futuro enquanto país.

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Pais e encarregados de educação, professores e educadores, dirigentes, sector público, privado e social, pessoal auxiliar, psicólogos, mas também médicos, historiadores, sociólogos e representantes das comunidades religiosas mais relevantes, necessariamente com visões diferentes e por vezes até antagónicas mas fundamentais para sermos capazes de, em conjunto, refletir e pôr em prática conclusões que promovam a revolução estrutural que se pretende para a estratégia da educação em Portugal nas próximas décadas. Um pacto para a educação só possível com o contributo comprometido daqueles mais directamente envolvidos. Em que o centro seja a formação, oposta à formatação actual, dos portugueses do futuro.

O populismo e a falta de representatividade dos nossos eleitos, a pobreza material e imaterial, a gestão dos recursos cada vez mais escassos e a coesão territorial passam também por aqui. A mediocridade versus a procura da excelência. Sem uma população capaz de pensar por si mesma de forma fundamentada, aquilo a que estamos a assistir será só o começo.

Resta saber se haverá coragem política (e cívica) para o toque de entrada neste decisivo desafio. E se, mesmo assim, ainda vamos a tempo de perceber de que matéria falamos e de, a partir dela, criar conhecimento e elites capazes de liderança e mudança de rumo do país. Acredito que sim. Talvez porque, não há muito tempo, ter reencontrado um antigo aluno hoje com responsabilidades públicas que me disse “sabe, nunca me esqueci das suas aulas, fizeram-me pensar. Hoje sou assim também por isso”.

Já não há é mais tempo a perder nem faltas a dar.