Não há maior sentido de satisfação na área dos negócios do que conseguirmos convencer um cliente a confiar os seus projetos de transformação mais desafiantes nas nossas mãos. Tanto mais, quando temos um contrato de centenas de páginas que tentam concretizar uma visão digital de um futuro incerto baseado num presente tantas vezes ainda mais indefinido.

No entanto, é habitual os projetos falharem os seus objetivos porque não entregam o que os clientes esperavam, ou porque demoram mais tempo do que estava previsto, ou, ainda, porque acabam por custar muito mais caro do que estava estabelecido no orçamento inicial.

Mas não tem de ser assim.

Qualquer projeto digital começa com uma lista de desafios existentes ou antecipados: custos altos, complexidade na gestão de recursos, falta de inovação, pobre atendimento ao cliente. Normalmente, estes desafios são identificados e discutidos ao nível da administração executiva, também conhecida por C-level (CEO, CFO, CMO, CTO etc).

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É neste nível que começa o extenso processo do estabelecimento de confiança e do relacionamento com um cliente para se chegar onde se pretende: uma relação de longo prazo.

Um dos erros clássicos promovidos pelas equipas comerciais passa por assumirem que o cliente sabe tudo sobre a sua organização, sobretudo nesta era onde o tempo nos foge, o que muitas vezes nos impede de parar para perceber os problemas de fundo. Trabalhar só com a direção de alto nível, portanto, não chega. É preciso também entender as várias camadas organizacionais e trabalhar com todas as equipas no terreno, estabelecendo, assim,  uma lista honesta e o mais completa possível dos requisitos funcionais e técnicos dos desafios.

A importância da diversidade.

As organizações são naturalmente diversificadas nas funções, nos percursos, nas experiências pessoais, cada vez mais no background cultural das suas equipas. Ora, se a nossa equipa comercial é apenas composta por especialistas digitais ou financeiros, saídos das mesmas universidades ou meios sociais, ou apenas com experiência em projetos tecnológicos, perdemos muitas vezes a essência dos desafios apresentados pelo cliente. Daí a importância de ter equipas diversificadas, tanto na área comercial como na técnica, financeira ou de gestão, mas também de origens e percursos de vida diferentes. É que, para criar empatia e estabelecer confiança, é preciso uma abordagem  genuína e falar a mesma linguagem do nosso cliente, adaptando aos vários níveis da organização, conquistando o seu ativo mais desejado, a confiança. Não é por acaso que empresas de referência do sector começam a integrar especialistas  em “change management” em equipas de desenvolvimento de software.

A intuição e a inteligência emocional como factores chave.

Muitas organizações simplesmente não têm consciência das suas ineficiências e, mesmo que as tenham, poucas são as que irão admiti-lo abertamente, ora por orgulho ou por incapacidade de aceitação. Este comportamento não faz dessas empresas entidades desonestas ou ignorantes. Apenas demonstra que os nossos clientes são seres humanos, com qualidades e defeitos, com mais ou menos conhecimentos, aspeto que muitas vezes nos esquecemos ou, simplesmente, não pomos em equação.

As áreas comerciais ignoram ou, pior, escolhem ignorar estes factos, procurando um negócio para faturar a curto prazo, e construindo uma lista de requisitos para um business case que não reflete a realidade do cliente. Tal como em todas as relações, o prazer imediato tem, por vezes, como preço a pagar, a perda de credibilidade para uma relação de longo prazo.

Qualquer mudança leva o seu tempo.

O mundo inteiro entusiasma-se com conceitos do estilo Cloud, Inteligência Artificial, aplicações altamente intuitivas, atendimento personalizado, online, instantâneo e eficiente para clientes, 24/7… Mas poucos refletem sobre a gestão da mudança inerente à complexidade de transição e transformação que é necessária para, por exemplo, atualizar infraestruturas obsoletas, mudar processos de gestão de IT ou gerir novos comportamentos dos utilizadores das organizações, entre outros desafios mais concretos, como gerir “legacy software fade outs”.

Neste contexto, é fácil chegar à conclusão que os contratos de serviços digitais devem durar vários anos. Não é possível passar de uma casa com infraestruturas e pilares antigos construídos ao longo de vários anos, por vezes décadas, para um modelo moderno de automação e infraestrutura contemporânea em apenas algumas semanas ou até meses.

Poucos entendem que a parte tecnológica já não é apenas uma ferramenta, mas que a mudança digital necessita de uma revisão completa e holística de toda uma organização, com a tecnologia como núcleo central do seu futuro ADN.

É preciso saber parar, pensar, promover e entregar projetos e serviços de qualidade que cada cliente merece e que, no limite, como consumidores finais, também merecemos. Este empenho em sair do status quo, saber pensar de maneira diferente, com inteligência emocional, com honestidade intelectual, não deixa de ser uma forma de criação para cada cliente, uma forma de Arte.

Manuela Doutel Haghighi tem 20 anos de experiência em Projetos de Transformação Digital, tendo trabalhado mais de 17 anos na IBM UK e Global. Manuela começou a sua carreira na área comercial como dealmaker de negócios de outsourcing e depois passou a gestora de largos programas internacionais de transformação digital com clientes diversos em tamanho como industria: da banca de investimento aos media, das minas de ouro a serviços governamentais. Manuela é trilingue, multiculural, diplomada da Toulouse Business School e tem um MBA da Universidade de Oklahoma. Manuela promove regular e ativamente a diversidade e inclusão no mundo das tecnologias nas áreas do género, origens étnicas, geracional, e da mobilidade social. Manuela é coChair do Women’s Network da sua atual empresa, da regularmente palestras pela Europa fora e é também mentora do Portuguese Women in Technology.

O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.