O compromisso das empresas e governos com a transição climática tem vindo a acelerar, contudo, o objetivo final é exigente, requerendo importantes esforços para ser alcançado. O caminho para a neutralidade das emissões traz desafios significativos à escala global, e implicará uma importante transformação económica.

Esta transição climática terá seis características importantes: será universal, já que todos os países e setores da economia serão afetados; significativa, dada a dimensão dos custos envolvidos; antecipada, por se prever um aumento dos custos antes da sua queda; desigual, por afetar desproporcionalmente setores, países e comunidades; exposta a riscos; mas sobretudo rica em oportunidades.

De acordo com o estudo “Transição Net Zero: quanto custaria, o que poderia trazer”, a transformação económica necessária para atingir uma descarbonização completa até 2050 implicará mudanças profundas na procura, na alocação de capital, nos custos, e no mercado de trabalho.

À medida que a transição avança, a procura por produtos ou serviços com elevados níveis de emissões associados irá reduzir em benefício de produtos ou serviços “verdes”, ou seja, com reduzidos níveis de emissões associados. Esta tendência tem por base os crescentes compromissos que múltiplas entidades, nos setores público e privado, têm feito relativamente à descarbonização. Isto terá impactos estruturais na procura ao longo de toda a cadeia de valor – por exemplo, o compromisso de vários fabricantes automóveis com o “net zero” até 2030 fará com que a sua produção seja inteiramente focada em veículos elétricos, sendo que para produzir os mesmos, será necessário recorrer a matérias com baixas emissões, como o aço “verde”, cuja produção requer o recurso a hidrogénio “verde”. Ou seja, esperamos assistir a um “efeito dominó” em múltiplas cadeias de abastecimento. Como resultado, estimamos que a procura por energia “limpa” seria mais do dobro da atual.

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Estas oscilações na procura desencadeariam profundas mudanças na alocação de capital em ativos físicos, sendo necessário um investimento na ordem dos 240 biliões de euros até 2050 – agora em unidades, porque é um número que impressiona, 240 000 000 000 000 de euros –, ou em média 8 biliões de euros por ano, o equivalente a 40 vezes o PIB de Portugal em 2020. Atualmente, são investidos mais de 3 biliões de euros em ativos associados a atividades altamente poluentes, como é o caso da extração de combustíveis fósseis, refinação de petróleo, produção de cimento e aço, ou transporte através de veículos de motores de combustão interna. Aproximadamente, 1 bilião desse investimento poderia ser transferido para a aposta em ativos de baixas emissões, tais como as energias renováveis, eletrificação de edifícios e veículos elétricos.

A transição verde será também acompanhada por uma série de custos. A curto prazo, os consumidores terão de lidar com o aumento do preço da eletricidade, mas também assistiremos a uma mudança nos seus hábitos de consumo no sentido da descarbonização. Apesar do aumento inicial, espera-se que estes custos diminuam substancialmente. Por exemplo, os custos de produção de eletricidade poderão diminuir mais de 60% em comparação com 2020, à medida que as energias renováveis ganham espaço no sistema elétrico.

Por último, o mercado de trabalho mundial terá de sofrer uma transformação. O alcance das zero emissões líquidas poderá resultar na perda de 185 milhões de postos de trabalho, ao mesmo tempo que seriam criados 200 milhões de empregos diretos e indiretos. Assim, a procura de emprego nos setores da extração e produção de combustíveis fósseis e de energia fóssil poderia ser reduzida em cerca de 9 e 4 milhões, respetivamente; enquanto as energias renováveis, o hidrogénio e os biocombustíveis gerariam 8 milhões de novos postos de trabalho até 2050.

A transição “net zero” requer uma ação urgente e um esforço concertado entre empresas, líderes e governos. Apesar da dimensão dos ajustes económicos necessários, os custos e riscos associados a uma transição descoordenada e abrupta poderão ser muito maiores, como por exemplo a escassez de energia, aumento de preços de energia, baixa utilização de ativos, ou deslocalização de trabalhadores. As recompensas de uma transição bem-sucedida vão muito além dos custos imediatos e da prevenção dos riscos associados às alterações climáticas, criando oportunidades económicas, mas também contribuindo para a resolução de desafios económicos e políticos globais, considerando o nível de colaboração necessário para a transição.

Dar a conhecer a dimensão da transformação económica necessária tem como principal objetivo encorajar o planeamento e gestão de uma transição ordeira e bem-sucedida, de modo a capturar oportunidades e minimizar possíveis riscos. A dimensão dos números apresentados não deve ser utilizada como justificação para a falta de compromisso e inação, mas deve ser vista como uma ferramenta útil na inadiável luta contra um dos grandes desafios dos nossos tempos: a transição climática.