Por ocasião do Dia Mundial do Tumor Cerebral, assinalado a 8 de junho, quero aproveitar para falar dos tumores benignos do cérebro, tema que acredito valer a pena abordar de um ponto de vista didático, de forma a fornecer alguma informação útil para o comum das pessoas que, felizmente, não têm, nem querem ter, contacto com esta realidade.

Quando nos referimos a tumores benignos do cérebro queremos assinalar os tumores que afectam o cérebro, quer a partir da sua origem, quer através do seu crescimento. Estes tumores podem ter como ponto de partida tanto o tecido cerebral propriamente dito, como as membranas que envolvem o cérebro chamadas meninges, ou ainda as estruturas adjacentes ao cérebro, como os nervos cranianos. Dependendo do seu local, podem afetar diferentes funções motoras, de aprendizagem, de memória e, até mesmo, emocionais. O risco de perder ou deteriorar o domínio destas funções é a maior preocupação de muitas das pessoas que recebo em consulta, receosas pelo impacto de tratar ou não o tumor.

Quando se afirma que um tumor cerebral é benigno, tal significa que as características celulares deste tumor não possuem, no momento do diagnóstico, estigmas de malignidade. Referimo-nos, assim, às propriedades morfológicas e moleculares do tumor e não necessariamente à sua evolução clínica. É óbvio, no entanto, que o comportamento dos tumores benignos é, de uma forma geral, significativamente mais benevolente quando comparado com os tumores de índole maligna, os quais possuem uma capacidade de permanente replicação e crescimento que, com frequência, frustram a médio e longo prazo os gestos terapêuticos.

Os meningiomas são os tumores benignos com que lidamos mais frequentemente. Estes tumores têm origem numa das membranas que revestem o cérebro, a dura-máter. Têm quase sempre uma evolução clínica benigna e o seu tratamento passa, na maior parte dos casos, pela cirurgia de remoção. Em alguns destes tumores, por serem de pequenas dimensões ou por ocorrerem em idades mais avançadas e serem bem tolerados pelo cérebro, ou ainda por não terem mostrado evidência de crescimento ao longo dos anos, podemos optar por uma atitude expectante e de vigilância, com realização espaçada de exames de imagem como TAC ou Ressonância Magnética Neurológica.

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Numa pequena percentagem de casos, os meningiomas assumem um comportamento agressivo, com capacidade de crescimento mais rápido e resistência aos tratamentos alternativos à cirurgia. É assim de enorme importância que se proceda a uma ressecção o mais completa possível do tumor e da sua base de implantação na meninge, de onde tem origem, por forma a minimizar o risco de recidiva.

No universo dos tumores do cérebro propriamente dito, os gliomas são de longe os mais frequentes e podem ser tanto benignos como malignos. Os gliomas classificados como benignos não têm, à partida, as características típicas de malignidade, mas, no entanto, possuem um potencial de transformação maligna com o decorrer do tempo que pode atingir os 50% aos cinco anos. Por essa razão, a cirurgia que permita remover o tumor próximo da sua totalidade reveste-se de uma importância capital para o prognóstico do doente.

Os tumores que têm origem no tecido do cérebro não apresentam limites definidos, o que torna a cirurgia, por vezes, mais complicada. Torna-se assim necessário, através de técnicas sofisticadas de imagem do cérebro e estimulação da sua função, estabelecer os limites de segurança para remoção do tumor, evitando criar ou aumentar defeitos neurológicos. Recorre-se de forma crescente à cirurgia com o doente acordado, a fim de se poderem testar as funções superiores e, em particular, a linguagem, o que permite estender a remoção cirúrgica até ao limite da preservação da função.

Casos há de tumores sem características de malignidade, mas que comprovadamente apresentam potencial de recrescimento apesar da cirurgia, em que há necessidade de utilizar técnicas auxiliares de tratamento, onde se inscreve o uso muito selectivo de formas de radiação e/ou excepcionalmente, alguns agentes químicos do tipo da quimioterapia.

Os tumores que têm como ponto de partida os nervos cranianos, que asseguram funções como o controlo dos movimentos oculares, a sensibilidade e mobilidade da face, a audição, o equilíbrio ou a deglutição, provocam queixas relacionadas com a função do nervo afetado. A cirurgia é, também nestas situações, a solução ideal, se bem que em casos selecionados se deva optar pela radiação sobre o tumor a fim de estabilizar o seu crescimento.

É certo afirmar que os tumores benignos do cérebro devem ser tratados, tendo a cirurgia um papel primordial e, geralmente, único na abordagem terapêutica, podendo dispor como coadjuvantes, em casos particulares, da radio e da quimioterapia.  Apesar de extremamente exigente e meticulosa do ponto de vista técnico, a cirurgia e as restantes técnicas terapêuticas garantem uma elevada taxa de sucesso e um risco baixo e bem controlado no tratamento destes tumores.