A fórmula para estimar as baixas reais num conflito militar, e em particular na Guerra na Ucrânia, pode ser calculada a partir do que se passou na II Grande Guerra: dobrar as baixas de cada lado e depois fazer a média das baixas de ambos os lados. É desta forma que chegamos a entre 2 a 4 mil mortos no exército ucraniano, guarda nacional e corpos de voluntários e a entre 5 a 6 mil soldados russos mortos. Não serão os 7 para 1 sofridos pelos russos na invasão da Finlândia em novembro de 1939 (em que um milhão de russos foram travados por 300 mil finlandeses) mas esta campanha também permite tirar duas lições: o exército russo de então era muito bom a adaptar-se e quando Hitler invadiu a Rússia ajustou-se rapidamente em material e tácticas. A outra lição é que os russos conseguiam lidar com altos números de baixas através do seu carácter nacional, muito messiânico, para-religioso e por via do alto nível de censura e controlo da informação imposto pelo regime de Estaline. A questão está em saber se hoje em dia, no século XXI, a actual autocracia o consegue fazer e se o nível de controlo de Putin sobre a sociedade russa é suficiente para conter este nível de baixas que tenderá a aumentar ainda mais nas próximas semanas de combates e ocupação de grandes cidades.

Por outro lado, nos primeiros três dias, os alemães avançaram 650 km. Compare-se com as dezenas de quilómetros que os russos agora avançaram na Ucrânia em mais de duas semanas para se poder comparar o quanto mal está a correr esta operação, apesar da desproporção de meios (2 navios vs 74, 0 submarinos vs 51, 125 mil soldados de infantaria vs 280 mil, 2110 blindados vs 13 mil, 1900 peças de artilharia vs 5900, 2800 AFVs vs 19 mil, dez vezes menos aviões e helicópteros que os russos). Algo está a correr mal na “operação especial” e a atrasar uma operação que os generais russos esperavam que estivesse concluída em três dias com a recepção entusiástica da população russófona nas cidades do leste da Ucrânia (o que não aconteceu: bem pelo contrário).

Outro elemento que merece reflexão é o facto de os russos terem perdido sete oficiais de alta patente em menos de três semanas de campanha. Isto revela que as baixas totais do exército russo são muito maiores que a meia centena oficial, que o estilo de comando russo não aposta na autonomia dos comandos inferiores o que exige a presença dos comandos superiores na frente e que provavelmente foram usadas formas de comunicação não encriptadas (segundo consta telemóveis de operadoras ucranianas que foram facilmente interceptadas e levaram à localização dos generais).

Mas esteja a correr bem ou mal, o que está a acontecer na Ucrânia está a ser atentamente observado pela Coreia do Norte e pela China. A impunidade russa na Ucrânia pode convencer a Coreia do Norte (potência nuclear) de que pode tentar uma operação semelhante na Coreia do Sul. A diferença é que aqui há forças dos EUA na linha de frente e que a Coreia do Norte deve ter a percepção de que teria ainda mais que os russos de manter logisticamente uma campanha de grande duração e intensidade. Na Ucrânia há também uma lição para a China: se os russos não estão a ser capazes de executar uma operação a esta escala por falta de experiência e organização, Pequim não será também capaz (as suas forças são ainda menos experientes que as russas) de invadir Taiwan porque a ilha é uma ilha sem extensas fronteiras terrestres, está melhor defendida e tem uma economia muito mais vigorosa que a Ucraniana e que, consequentemente, será capaz de resistir melhor ao embate contra as forças chinesas.

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