Muito se tem discorrido acerca das Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ), mas nada do que foi dito acertou no tema, como aliás sucede com quase tudo o que envolve a Igreja. São as críticas do costume. Aliás para muitos a Igreja está sempre em falta. É relativamente fácil perceber porquê…

O foco das notícias foi apenas o Palco que acolherá o Papa Francisco em Agosto próximo. E pelas piores razões: porque a sua construção está atrasada, um desperdício de dinheiro, uma afronta aos milhares de portugueses que vivem tempos de cinto apertado, algumas famílias com fome, mesmo. Que, e mais uma vez, a Igreja proporciona uma situação paradoxal: ela que teria vindo para os pobres, em vez de lhes matar a fome alimenta mas é os ricos que vivem à custa dos milhões de euros ali a enterrar. Mais uma vez critica-se um tipo de vida dupla, cínica, tal como se critica a pedofilia, e outro escândalos, no seu seio. Mais uma vez vêm ao de cima histórias passadas, de violência e corrupção, de uma Instituição que tem feito o mundo olhar para Roma, não por se interessar propriamente pelo ímpar fenómeno religioso em causa, mas para lhe apontar falhas e crimes.

Olhar para a miséria alheia é uma tendência dos homens, quanto mais não seja para a comparação com a vida própria, afinal assim não tão miserável como se imaginaria antes da comparação. Ou simplesmente com aquele espírito bota abaixo tão característico daqueles que mais não sabem do que idealizar e não metem as mãos nas obras para não se sujarem. Quem não conhece preguiças e invejas, sinal da alienação em que vivem aqueles que não sabem arriscar?

E há ainda aqueles que nos querem distrair das suas misérias, chamando a atenção para outras misérias, pondo assim no palco não os seus erros mas antes os erros alheios, desfocando até o terreno. A nossa observação é manipulada, é verdade, mas quem detém a última palavra, a manipulação ou a minha observação?

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Apesar de se prever muita música e animação, não estamos a falar de um espetáculo dos Coldplay ou da Madonna, ou de um qualquer Rock in Rio. Nem de mais uma edição da Websummit. As JMJ foram uma invenção de S. João Paulo II que, em 1986, deu início à sua primeira edição em Roma. Elas surgem portanto não dum qualquer mood ou fashion trend, whatever, mas de um homem que conhecia e amava o coração dos homens, o coração de cada homem.

Karol Wojtyla, o homem que nunca envelheceu por dentro, mesmo se por fora estava irreconhecível por um Parkinson brutal, ao qual não terá sido alheia a bala com que foi atingido “mortalmente” no dia 13 de Maio, festa na Cova da Iría. O homem que a uma semana antes de partir para a Casa do Pai, apareceu à janela da Praça de S.Pedro, e que não conseguiu articular uma palavra, mas antes mostrou esgares de um rosto esmagado pela dor e pelo sofrimento. Aquele que em tempos fora um atleta, amante do mar e das montanhas, era naquele domingo de Março de 2005, à vista de todos, um homem aparentemente esmagado. E fez manchete dos jornais de todo o mundo.

A ideia genial das JMJ vem deste amor pelo homem. O papa polaco tinha necessidade de estar com aqueles que têm o coração mesmo nas mãos, os jovens. Já muito doente, via-se, nesses encontros belíssimos, como ele revigorava! E cada Jornada com os jovens foi também, como se viu em Roma, Buenos Aires, Santiago de Compostela, Czestochowa, Denver, Manila, Paris e Toronto (com Bento XVI em Colónia, Sidney e Madrid; com o Papa Francisco: Rio de Janeiro, Cracóvia e Panamá), foi também ocasião de mais vida para toda a Igreja.

Cada um de nós, se for sério consigo mesmo, à medida que avança na vida, faz a experiência de não ser capaz de matar a sede de plenitude que traz dentro de si (Audiência Geral, 12 de Outubro de 1983). É para isto que é o Palco, palermas! Não é para ficar nas fotografias, como se fossemos o dono da obra…

As JMJ são antes de mais a demonstração da vida em grande, em expressões de frescura e beleza, que os jovens gritam bem alto.

As JMJ levam a Igreja a olhar para si mesma. Mas o que é afinal esta realidade paradoxal, santa e pecadora? O que nela há de negativo em toda a sua História Milenar, é o que eu encontro, também, na minha vida desde o dia em que nasci: os meus limites e desamores.

Importa então ter bem claro o ímpar fenómeno religioso que temos entre mãos: que a Igreja não nasce de uma vontade de Poder mas de uma preferência de Deus por uma mão de pescadores/pecadores, uma escolha pessoal para uma vida em Companhia. E essa é oferecida aos homens como caminho. A Igreja é assim um instrumento humano do Divino.

Cheia de contradições, erros, pecados, mas assim foi querida. Jesus conhecia muito bem aqueles que escolhera. E foi apesar dessas limitações o caminho escolhido para a salvação de todos. Melhor, foi através das limitações, é através das nossas limitações, que a Vida Acontece.

Estranhas parecem estas palavras. Mas não será estranha esta minha forma de vida, como canta a Amália? Pois nestas matérias não se vai lá com números de entretenimento, é preciso mesmo pare, escute e olhe e perceber que estamos diante de uma construção à prova de bala: “Tu és Pedro e sobre ti construirei a minha Igreja!”