Nós, os pais, estamos habituados a escutar que se fôssemos, por uma vez, mães a demografia mundial ficaria comprometida, para sempre. Porque os pais não suportariam estar grávidos. E, sobretudo, porque se passassem – uma vez! – pela experiência de parto nunca mais seriam “mães”. Na verdade, a forma “Ai!, que não suporto ver sangue!”, com que muitos pais reagem à sua presença eventual numa sala de partos, ajuda a compor esta “imagem de marca” do pai. Mas – desculpem se pareço devolver o “cumprimento” – eu gostava de ver muitas mães a fazer de pai, por algum tempo. Porque, acho que não estou enganado, as mães não aguentariam ser pai, logo a seguir.

Como é que uma mãe, que adora ser “a primeira figura” d’ “o seu bebé”, aceitaria que ele fosse, sobretudo, “o bebé do pai”? Pois é assim que um pai se sente: “segunda figura”, todos os dias. Completamente enternecido para aquele bebé. Mas com a convicção que ele é, sem sombra de dúvidas, “o bebé da mãe”.

Como é que uma mãe, que não tolera outra alternativa que não seja que o bebé tenha olhos para ela, viveria se ele lhe fizesse (durante meses a fio) aquilo que algumas pessoas nos fazem, a seguir a cumprimentarem um amigo que converse connosco, e depois de nos terem ignorado, repensam e, condescendentes, nos esticam a mão, enquanto nos dizem: “Já agora…”. Pois é isso que um bebé faz ao pai, durante muito tempo. Qualquer coisa do género: “Ai, estavas aí?… Que engraçado! Não te tinha visto…”. E nós, o que é fazemos? Sorrimos. Com bondade!

Como é que uma mãe, que ama sem limites e eternamente, iria conviver com a  “agradável” sensação de ser a “nº2 oficial, lá de casa”, e se comportasse, delicadamente, de forma a nunca ocupar espaço demais e, mesmo assim, “se babar” e se encantar, por um bebé encantado só… pelo pai? Pois é isso que nós fazemos!

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Como é que uma mãe iria aceitar uma certa “desconfiançazinha” de que o bebé gosta sempre mais do pai do que da mãe, andando “aos papéis” como nós andamos, durante tempos e tempos, até que, finalmente, começasse a ganhar alguma importância? Pois é assim que se passa connosco: sempre na sombra, à espera que, um dia, todo o sol do olhar daquele bebé seja para todos.

Como é que uma mãe reagiria se, rasgasse o mais bondoso dos seus sorrisos e , de coração aberto, contasse os segundos até que o seu bebé viesse até si, de braços esticados, e, quando se está prestes a dar um abraço final, ele passasse por si e se aninhasse nos braços… do pai? Pois é isso que acontece connosco! E o que é que fazemos, a seguir? Cá estamos, de braços abertos, até que a “sorte” nos proteja.

O que é que se passaria com a mãe se o pai, de forma pronta, passasse por cima de qualquer interpretação da mãe ao comportamento do seu bebé e, vezes sem conta, convivesse com o desconforto de ter ao seu lado um pai, desenvolto, que lhe advertisse (quase como se lhe explicassem que “cada um é para o que nasce”): “eu conheço o meu filho!”? Calava-se, muito calada, como nós o fazemos, mesmo quando achamos que o conhecemos melhor? Não calaria, não senhor! Pois… Mas nós calamo-nos. E nem sequer protestamos. Registe-se: mesmo quando temos razão!

Como é que a mãe aceitaria que, sempre que um filho se aleija, gritasse: “Papá!!!!”? E, mal ela fizesse de pronto-socorro, ele dissesse: “Quero o pai!”. E, apesar dela fazer tudo direitinho para o socorrer, ele lhe lembrasse: “O pai é que sabe!”? Pois é com estes “afagos” todos no nosso amor-próprio que um pai se debate, todos os dias. E nós, o que é que fazemos? Cedemos o nosso lugar à mãe. Estando sempre de prevenção. Esperando o dia que uma criança queira o pai.

E como é que, finalmente, seria a mãe capaz de conviver com a ideia de que, ninguém pergunta a uma criança pequenina: “Gostas mais da mamã ou do papá?” porque, se o fizesse, a resposta seria, sempre: “Do papá!”? Pois nós não perguntamos, é verdade, mas sabemos que, por mais que a amemos sem obstáculos e sem restrições, ela gosta sempre mais da mãe.

Eu sei que “pai que é pai” faz de distraído como mais ninguém. E quando está “a olhar para o boneco” e a mãe lhe pergunta: “Em que é estás a pensar?” o melhor que ele consegue responder é: “Em nada…”. E, sempre que é preciso dar colo, mimos e carinho o pai parece, quase sempre, um bocadinho mais “tosco”. É claro que, quando chamamos a atenção para o nosso “lugar… zinho” na atenção de um filho, nos primeiros quatro ou cinco anos dele, não esperamos nem que tenham pena de nós, nem que sejam solidários connosco, nem que nos achem “o máximo”. E é verdade que nem sempre estamos onde devíamos estar e que nem sempre fazemos o que “tínhamos” que fazer. E que nada — nem as “desconsideraçõezinhas” que coleccionamos — justificam as nossas omissões. Mas pai que é pai é — regra geral — bondoso! Tão bondoso que, apesar de tudo, estamos aqui, de braços abertos, para amar. Mas se a mãe passasse algumas vezes pela forma como somos colocados no “nosso lugar” não sei se ela iria, por muito mais tempo, conseguir ser pai. Eu acho que não. Mas é só uma ideia…