Marcelo falou, foi claro, duro e deixou um recado. Recado, esse, não directamente ao ministro das Infraestruturas mas a todo o governo.

Não exercendo os seus poderes constitucionais, o perfil do Presidente da República deixa adivinhar os seguintes capítulos da crise política que António Costa deliberadamente abriu.

Marcelo Rebelo de Sousa, de fácil trato com o povo e de certa forma acarinhado por ele, começará uma ronda pelo país com toda a comunicação atrás sem qualquer ministro a acompanhar, para ver a degradação dos serviços públicos nas mais variadas áreas e a obra que não está feita, bem como os atrasos na aplicação do Plano de Recuperação e Resiliência. Se, de alguma forma, o caso TAP começou a ser a verdadeira oposição ao governo, o PRR será a sua grande humilhação.

Marcelo tem neste momento um objectivo claro: ser mais intervencionista. E vai sê-lo. A partir de agora o Presidente pode tudo e ninguém o poderá impedir.

A rua será o seu habitat natural e sem qualquer ministro atrás mas com as televisões em directo. A tentativa clara de mostrar ao portugueses a realidade do país vai ser a sua principal função nos próximos dias.

Vamos ver Marcelo às 5 da manhã à porta dos centros de saúde, vamos tê-lo nos tribunais e nas escolas e em todos os sectores que envolvem a vida diária de todos nós.

Se há algo que caracteriza Marcelo, é a sua fértil imaginação. Vai andar sozinho e não vai ser agradável de se ver. É esta a magistratura de “influência” que o Presidente vai escolher.

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O PRR parece ser a tábua de salvação política de Costa, onde este aposta todas as fichas. Marcelo aproveitará esse facto, mas também já percebeu que os atrasos da execução dos fundos são uma constante e vai por a nu o melhor que o PS sabe fazer: pura propaganda.

A humilhação política de Costa vai começar agora e o Partido Socialista ficará ainda perto do esvaziamento político, onde muitos dos socialistas mais conhecidos, conseguindo perceber isso mesmo, vão deixando claros avisos ao primeiro ministro, que de uma forma autista não lhes dá qualquer importância.

A influência de Marcelo, incapaz de estar em silêncio, será duramente exercida e de forma bastante curiosa. A sua magistratura, com o poder constitucional de que é titular mas que não está escrito, vai começar.

No fundo, Marcelo prefere a humilhação pública do governo. O capital de simpatia que recolhe parece dar-lhe ânimo e na sua intervenção junto do povo português pediu ainda mais esse apoio. O povo dar-lhe-á ainda mais força.

A partir de agora, o aviso está feito.

Se a influência de Marcelo Rebelo de Sousa na exoneração do ministro João Galamba não foi acolhida, o agravamento da crise política está aí e será mesmo ele o maior opositor ao governo.

O Presidente tem uma densidade de comunicação única, gostando e querendo ser ainda mais popular. Não iremos encontrar nos tempos mais próximos nenhum líder da oposição capaz de ser tornar tão eficaz na oposição política ao executivo como Marcelo tão claramente quis demostrar que vai fazer.

Hoje, sabemos que o Chefe de Estado não confia no chefe do governo e, aqui chegados, Marcelo irá provar com factos reais do dia a dia a razão porque não confia em Costa.

Eu já avisei a minha tia. Se às 5 da manhã ela encontrar Marcelo sem o ministro da saúde por perto no seu centro de saúde enquanto espera para ver se há vaga, que não se admire. Habituem-se porque a partir de agora a política portuguesa não vai ser bonita de ser ver.