Momentos-chave
- As Bahamas eram um banco offshore. Só 30% dos depósitos eram de emigrantes
- "Houve uma grande confusão de autoridades" no Banco de Portugal
- Investidores dariam 300 a 400 milhões pelo Banif. Nunca os 700 milhões que o Estado investiu
- "Um banco funciona sem capital e com prejuízos, mas sem liquidez, nem meia hora"
- "Foram anos de guerra com a DG Comp"
- Ativos do Banif que ficaram no Estado serão um grande negócio para quem comprar
Histórico de atualizações
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A segunda audição a Jorge Tomé terminou quatro horas depois de ter começado. Amanhã às 2.30 da tarde será ouvido novamente o governador do Banco de Portugal. Será a terceira audição de Carlos Costa nesta comissão parlamentar de inquérito ao Banif. Boa noite e obrigada por nos ter acompanhado.
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Se o Banif tivesse sido vendido em 2016, não haveria necessidade de ajuda pública
O antigo gestor defendeu ainda que a antecipação do concurso de venda do Banif para o final de 2015 “prejudicou muito o valor das propostas. “Se tivesse sido vendido em 2016, não haveria necessidade ajuda pública”, acredita. E se tivesse sido reestruturado (com a separação dos ativos de pior qualidade) e vendido mais tarde, em 2018, o Estado poderia até ter recuperado.
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As Bahamas eram um banco offshore. Só 30% dos depósitos eram de emigrantes
Os custos de reestruturação do Banif ao longo destes anos foram cerca de 70 milhões de euros, diz Jorge Tomé em resposta ao deputado Miguel Tiago do PCP.
O deputado comunista coloca ainda a pergunta: Mas afinal o que existia nas Bahamas? Miguel Tiago lembra a informação contraditória sobre esta operação que foi comprada pelo Santander e está em liquidação. O banco comprador já veio admitir que terá perdas nesta operação cujos ativos não correspondem à descrição que foi feita no processo de venda,
Jorge Tomé demora um pouco antes de responder. Acaba por dar números: o banco nas Bahamas tinha créditos de 46 milhões e depósitos de 255 milhões de euros. Lembra que as Bahamas são um paraíso fiscal, ainda que com regulação. Era um banco offshore e admite que apenas 30% seriam dos depósitos seriam de emigrantes. Justifica que não fazia distinção entre clientes.
O gestor admite ainda que uma parte dos depósitos que saíram na última semana pode ter vinco das Bahamas.
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"Houve uma grande confusão de autoridades" no Banco de Portugal
As questões deputado do CDS centram-se nos últimos meses que antecederam a resolução do banco. Para Jorge Tomé, “não há nada pior para um plano que a inconsistência”. E quando localiza essa inconsistência? — pergunta de João Almeida — Jorge Tomé diz que aconteceu sobretudo no último trimestre do ano. E veio de onde? “Na minha opinião, veio do Banco de Portugal.” Jorge Tomé lembra o período eleitoral e um certo vazio que havia no Ministério das Finanças.
O antigo presidente do Banif assinala que houve “uma grande confusão de autoridades. Acho que se confundiu o papel da autoridade de supervisão e de resolução. Não consigo avaliar o papel do Banco de Portugal”. E destaca ainda a contradição entre administradores do Banco de Portugal sobre o banco de transição.
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Jorge Tomé não consegue perceber a exclusão da Apollo
João Almeida do CDS volta ao tema da Apollo. A proposta vinculativa do fundo americano chegou já depois do prazo definido. “Foi pena”, conclui o ex-presidente do Banif. Jorge Tomé concorda com a posição defendida por João de Almeida de que se deveria ter tentado manter a Apollo na corrida à compra do Banif com o Santander. O gestor não consegue perceber a exclusão e lembra que a Apollo tinha um banco em Espanha.
O ex-presidente admite ainda que se perderam três meses, quando Maria Luís tentou substituir a administração depois de ter recebido o ultimato da nova comissária da concorrência em dezembro de 2014.
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Ainda uma pergunta sobre a TVI. Em resposta a Mariana Mortágua, o ex-presidente do Banif esclarece que o comentador da TVI, António Costa, lhe ligou para confirmar a notícia que estava a ser avançada pela estação e não para saber qual era a situação do Banif. Este testemunho contraria de certa forma a versão dada pelo jornalista na comissão de inquérito. António Costa disse que não participou na elaboração da noticia e que fez telefonemas, designadamente a Jorge Tomé, para obter enquadramento para fazer o comentário.
O ex-gestor procurou ainda falar com o diretor da estação. Mas Sérgio Figueiredo enviou-lhe um SMS a dizer que não podia falar. A assessora de comunicação do Banif falou com o editor de economia, Paulo Almoster, que lhe comunicou que ia colocar a questão a nível superior.
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Pergunta da deputada do Bloco: O destaque de ativos de pior qualidade seria possível sem uma garantia de Estado?
A solução mais compaginável, diz Jorge Tomé, era fazer um carve-out com uma solução jurídica separada, mas sem fazer o concurso para realizar a venda forçada. O que a DG Comp queria não era nada disso, queria condições de mercado. Queria que os ativos fossem imparizados (desvalorizados) e vendidos.
O gestor recorda no dia 8 de outubro, foi bem defendido o plano mas a DG Comp levantou reservas, duvidas, como fazia sempre, Colocou questões. Mas não concluiu logo que haveria uma ajuda de Estado, assegura.
Depois de uma reunião com o diretor geral da Concorrência, a DG Comp comunica em dezembro que concorda com o conceito de ajuda pública, desde que clean bank (o banco limpo) saísse (fosse vendido) a um valor superior ao da garantia pública que teria de ser dada para financiar o destaque dos ativos (carve-out).
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Investidores dariam 300 a 400 milhões pelo Banif. Nunca os 700 milhões que o Estado investiu
Em resposta a Mariana Mortágua, Jorge Tomé confirma que sugeriu ao Ministério das Finanças a abertura de um concurso em 2015 depois do contacto com vários investidores. O gestor lembra a animação das bolsas asiáticas no segundo trimestre. Foi nessa altura que o Banif terá recebido uma manifestação de interesse de um grupo chinês com uma oferta de 600 milhões, mas exigia uma due-dilligence. Este interesse terá entretanto desaparecido com a queda das bolsas chinesas, segundo testemunhou o administrador do Estado, Miguel Barbosa.
“Pela informação que tinha dos investidores, admitia que dariam 300 a 400 milhões de euros pela posição do Estado”. No entanto, reconhece o Estado nunca recuperaria os 700 milhões que colocou no capital do banco.
O representante do Estado argumentou que as hipóteses de vender o banco seriam melhoradas se entretanto fosse executado o plano de reestruturação que previa o destaque dos ativos de pior qualidade e a venda do banco limpo. Jorge Tomé admite que achou na altura o racional da explicação forte. “Hoje tenho de concluir que se devia ter aberto o concurso no segundo trimestre”.
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A deputada do Bloco quer saber se ficou claro para a Comissão Europeia que Portugal era contra a redução do Banif a banco das ilhas.
Jorge Tomé não sabe o que disse o governo a Bruxelas, mas em relação ao Banco de Portugal cita as declarações do governador na primeira audição em que Carlos Costa contou que escreveu à DG Comp e ao presidente da Comissão Europeia quando soube a exigência de redimensionamento de 60% do ativo do banco, alertando que com tal requisito não seria possível ao Banif reembolsar o Estado.
Revela ainda que era conhecida no mercado a intenção do governo de substituir a presidência executiva, mas assegura que nunca houve uma conversa com Maria Luís Albuquerque sobre o tema e desconhece o racional dessa mudança.
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O Banif não era responsável pela dívida da Rentipar que vendeu aos clientes
Mariana Mortágua do Bloco de Esquerda retoma o tema da Rentipar (a acionista do Banif) para colocar perguntas sobre uma emissão de 60 milhões de euros colocada nos balcões do Banif. Era normal os clientes do banco financiarem a Rentipar?
Essa emissão é muito anterior a 2012 e não é exposição Banif, responde Jorge Tomé. O banco não tinha responsabilidade perante os clientes das obrigações. Não pode ser contabilizada como risco Banif. Em 2012, 50% do financiamento da Rentipar estaria no Banif, admite anda o gestor.
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O deputado socialista volta ao tema do prospeto do empréstimo obrigacionista de 85 milhões de euros. A recomendação forte da Comissão Europeia no sentido de fazer um carve-out (cisão de ativos) para transformar o Banif no banco das ilhas. Jorge Tomé insiste que era uma má solução e recorda que a DG Comp admitia outro caminho, mas tinha de ser acompanhado da venda.
O gestor considera por isso que os riscos reais já estavam considerados no prospeto, apesar de reconhecer que a solução do carve-out era nova, mas insiste que Por isso, desvaloriza o risco para os investidores.
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O deputado que é o relator desta comissão coloca questões de detalhe para esclarecer vários pontos ainda em aberto.
Jorge Tomé confirma que quando foi feita a recapitalização do Banif havia um draft (esboço) de um plano de reestruturação. O ex-gestor admite que sabia as exigências da DG Comp de que o banco fosse reduzido à dimensão das ilhas e o seu ativo encolhido em cerca de 60%. Jorge Tomé confirma que sim, mas adianta que o plano inicial apresentado não respondia a esses requisitos.
Mas assinala que o caderno de encargos (committment catalogue) “desrespeitava os compromissos assumidos no plano de recapitalização pública”.
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O deputado socialista Eurico Brilhante Dias começa por perguntar qual era o crédito do Banif ao grupo acionista (a Rentipar). Era de 195 milhões, mas foi sendo amortizado. A partir da entrada do Estado, o acionista Rentipar passou a ter uma posição residual. A sua atuação passou a ser silenciosa, diz o ex-gestor. Jorge Tomé foi ao Brasil e percebeu logo que a situação era grave. Assim que foi feita a recapitalização, o Banco de Portugal promoveu uma auditoria. Foram mudados logo alguns administradores.
Eurico Brilhante Dias questiona o antigo presidente do banco sobre as falhas de controlo interno no banco e a auditora forense que detetou falhas na concessão de crédito. O maior problema, responde Jorge Tomé, era a qualidade de informação introduzida na base de dados. Não havia controlo sobre essa informação.
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"Um banco funciona sem capital e com prejuízos, mas sem liquidez, nem meia hora"
A pressão para se encontrar uma solução no fim de semana deu nisto, conclui. “Um banco sem liquidez é como uma máquina sem energia. Não funciona. Pode funcionar sem capital e com prejuízos, mas não sem liquidez. Nem meia hora”.
E quanto custou a perda de mil milhões em depósitos ao Banif — um efeito atribuído à noticia de domingo da TVI– ? Jorge Tomé compara as ofertas indicativas e as ofertas vinculativas cuja entrega até o surpreendeu. As primeiras eram 150 milhões incluindo os ativos problemáticos. As ofertas finais eram nesse valor, mas exigiam garantias para os ativos Legacy (de pior qualidade).
Jorge Tomé não sabe quem passou a notícia à TVI. Revela que falou com Sérgio Figueiredo (o diretor da estação que não estava em Queluz de baixo naquele domingo) e que este lhe confirmou que a estação tinha a notícia, que na sua versão inicial (a passar em rodapé) começou por dizer que estava tudo pronto para o fecho do banco e que haveria perdas para grandes depositantes. Para o ex-presidente do Banif, “as alterações e correções que foram fazendo, só acirraram a notícia.”
Pediu então para a notícia ser conferida com o Ministério das Finanças e com o Banco de Portugal. O comunicado que o Banif fez naquela noite foi aprovado pelo administrador com pelouro da supervisão, António Varela.
“Como responsável do Banif, acho que deveria ter sido feito um esforço adicional por parte do Banco de Portugal para segurar o estatuto de contraparte”, Podia-se ainda reforçar a linha de emergência de forma a encontrar uma solução negociada e competitiva para o Banif.
Jorge Tomé acredita que se tivesse anunciado que existiam negociações com mais do que um competidor “a tesouraria do Banif seria equilibrada num ápice”. Na sexta-feira já estava quase, acrescenta.
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E havia tempo para negociar a proposta da Apollo?, quer saber Miguel Morgado. O ex-presidente do banco recorda que o Banif estava muito exaurido de liquidez por causa da notícia da TVI.
Se houvesse um reforço da liquidez de emergência, acredita que teria sido possível negociar com o fundo de investimento. Lembra que a Apollo até tinha feito a melhor proposta para a compra dos ativos desvalorizados, previa uma perda de 300 milhões de euros, mas a venda desses ativos seria feita em dois anos. Mas quem fez a proposta para o capital do banco foi um outro veículo da Apollo. E quando estavam a negociar para melhorar a proposta, aquele veículo levantava o problema do carve-out (destaque) que estava a ser tratado por outra empresa da Apollo. Tinha de haver tempo para a direção do fundo conciliar a posição dos dois veículos.
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"Foram anos de guerra com a DG Comp"
O Banco precisava de 300 milhões de euros de aumento de capital em 2015. O Estado teria de meter a sua parte correspondente aos 60% que tinha na altura e os privados teriam de subscrever os 120 milhões. Tomé garante que o fariam num “ápice”. Mas a Comissão Europeia não terá aceitado este plano.
Refere uma reunião do início de dezembro em Bruxelas onde esteve o representante do Estado. No dia seguinte, refere, há uma carta da DG Comp disponível para dar a luz verde se o financiamento exigido pelo carve-out fosse inferior ao aumento de capital do Estado não haveria problema,
Jorge Tomé desmente a ideia de que era contra o plano. Admite que estava enviesado em relação à posição da DG Comp. “Foram anos de guerras com a DG Comp” — a autoridade europeia da concorrência.
Jorge Tomé revela ainda que teve uma reunião no dia 18 de novembro com Mário Centeno, quando ainda não era ministro, e que descreve como muito positiva. Ainda o ministro não tinha tomado posse. Disse toda a gente estava muito entusiasmado com o plano. Incluindo Maria Luís Albuquerque.
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Para a DG Comp, viabilidade é retorno de 10%. E quem gerou esse retorno nos últimos anos?
Fala agora na série de precipitações que ocorreram em 2015. Fazer um carve-out (destaque dos ativos) que não eram das ilhas, no valor de quatro ou cinco mil milhões de euros, seria impossível de financiar. O carve-out do banco da ilhas era completamente inviável. Mas era possível, diz, fazer um carve-out que melhorasse os rácios do Banif, que incluía os ativos imobiliários.
O conceito de viabilidade para a DG Comp é que um banco gere a rentabilidade de 10%. E quem gerou na Europa essa rentabilidade nos últimos cinco anos? Nem 5%, nem 3%.
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Pelas exigências de Bruxelas em matéria de reestruturação, o Banif teria de passar de ativos de 12 mil milhões para seis mil milhões, o tal banco das ilhas que as autoridades portuguesas nunca aceitaram.
Mas o banco foi limitado na possibilidade de trabalhar o banco de mass market (retalho). Reconhece que a gestão também cometeu erros, “erros estratégicos”. Deveria ter respondido a Bruxelas, admite. Devia ter dito que era preciso rever (alongar) o tempo de devolução de ajuda ao Estado. Ou então, devia ter-se exigido que a reestruturação fosse aprovada antes de ir para o mercado procurar investidores privados.
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Jorge Tomé assegura ainda que pode provar, com a confirmação de perito de contabilidade bancária, a tese que já defendeu e, segundo a qual, com base na evolução dos custos e dos proveitos do banco, o Banif teria condições para cumprir os rácios exigidos, o que contraria a tese do Banco de Portugal. O Banif estava numa trajetória positiva, realça.
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Ativos do Banif que ficaram no Estado serão um grande negócio para quem comprar
Terminou a intervenção inicial do ex-presidente do Banif, bastante mais curta do que a feita na primeira audição.
Miguel Morgado do PSD questiona-o sobre questões concretas que foram colocadas ao longo de dezenas de audições. E uma delas incide na transferência de ativos com uma desvalorização muito elevada — o tal haircut de 66% — imposto na resolução.
O ex-presidente assinala que os ativos de credito do Banif estavam já imparizados (perda reconhecida) a mais de 60% e tinham colaterais de 130%. “O que se está a passar no mercado com a venda forçada de ativos a fundos e empresas especializadas, é um grande negócio para quem compra”. Como estes créditos têm colaterais superiores a 100%, a mais-valia para o comprador será muito elevada, realça.
O gestor recorda então o processo que correu antes da resolução já de venda forçada dos ativos ditos problemáticos promovida pela N+1, ainda no quadro da execução do plano de reestruturação em curso. E diz que as propostas de compra desses ativos, que ainda poderiam ser negociadas, dariam uma perda de 30%, um pouco acima de 200 milhões de euros.