A empresa municipal de cultura de Lisboa, EGEAC, foi processada pela produtora de teatro Yellow Star Company, que ficou em segundo lugar no concurso público de concessão do Teatro Maria Matos, disse ao Observador o diretor-geral da produtora, Paulo Sousa Costa. A ação judicial deu entrada no Tribunal Administrativo de Lisboa há duas semanas e pode implicar que a sala da Avenida de Roma se mantenha fechada ao público durante vários meses.

A Yellow Star considera ilegal a decisão da EGEAC de adjudicar o Maria Matos à empresa Força de Produção, que ficou em primeiro lugar no concurso, e acusa o júri de “violação do dever de fundamentação” e “erros na avaliação” das propostas.

Por decisão da Câmara de Lisboa, o concurso de concessão da gestão artística do Maria Matos foi promovido pela EGEAC, entre 13 de abril e 24 de maio, com o objetivo de arrendar a sala a uma entidade privada durante cinco anos, por um valor mensal de três mil euros. Cinco pessoas compunham o júri: a jornalista Pilar del Rio; a presidente da EGEAC, Joana Gomes Cardoso; a atriz e encenadora Natália Luiza; o dramaturgo e crítico Jorge Louraço Figueira; e o jornalista e escritor Nuno Galopim.

O resultado provisório chegou a 3 de julho. Em primeiro lugar, ficou classificada a Força de Produção, com 24,77 pontos; em segundo, a Yellow Star Company, com 18,02 pontos; e, em terceiro, a Meio Termo, com 11,82 pontos. A Yellow Star não aceitou o resultado e reclamou por duas vezes, segundo Paulo Sousa Costa, tendo o júri respondido que mantinha a decisão inicial.

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“Nas respostas aos nossos recursos, não nos provaram que não tivesse havido ilegalidades”, comenta Paulo Sousa Costa. “Temos o maior respeito pela EGEAC, pelo júri e pela Força de Produção, mas perante um processo ferido de várias ilegalidades, não poderíamos ficar impávidos”, acrescenta. Por isso, avançou para tribunal.

Impugnação e suspensão

O processo é uma “ação de contencioso pré-contratual” e tem a Yellow Star como autora e a EGEAC como ré. Aquela produtora de espetáculos, com sede no Estoril, pede ao tribunal a impugnação das decisões do júri e a “suspensão imediata” do concurso e de uma eventual assinatura de contrato de arrendamento entre a EGEAC e a Força de Produção.

Os advogados argumentam na petição ao tribunal que se “impunha [ao júri] a exclusão da proposta apresentada pela concorrente Força de Produção, em virtude de a mesma contrariar requisitos e condições previstos no programa de concurso”.

Dizem que a primeira classificada incluiu na candidatura um portefólio com mais de 30 fotografias de espetáculos que produziu, quando o regulamento do concurso determinava um máximo de 20 imagens. Alegam que os jurados analisaram um conjunto de depoimentos abonatórios de vários artistas, remetido pela Força de Produção, sem que o regulamento a isso fizesse referência, o que terá criado no júri “a sensação” de que a concorrente teria mais reportório e maior capacidade para gerir o Maria Matos.

Os advogados acrescentam que a pontuação atribuída às três empresas candidatas “não é acompanhada da devida fundamentação” e que a “estratégia de captação de públicos” da Yellow Star foi subvalorizada.

A administração da EGEAC disse esta quinta-feira ao Observador que já apresentou contestação à ação e que a empresa municipal “tem vindo a esclarecer todas as dúvidas” apresentadas pela Yellow Star.Questionada sobre o atraso na abertura da sala, a EGEAC respondeu que “a ação está a seguir os termos normais, não se verificando para já qualquer atraso na abertura”. Pilar del Rio, a presidente do júri, entende que não deve fazer comentários uma vez que o assunto já não está sob a alçada dos jurados.

O caso será decidido sem que, em princípio, haja audiências de julgamento. O diretor-geral da produtora admite uma demora de vários meses.

“Não digo que temos razão absoluta, mas alguém tem de analisar o assunto e só pode ser um tribunal”, afirma João Paulo Sousa. “É importante para a cidade que o Maria Matos seja concessionado e se ficar nas mãos da Força de Produção fica muito bem entregue. Mas não é isso que está em causa. Quero é que o concurso seja legal. Não acho que tenha havido marosca da parte de ninguém, mas é como no desporto: se alguém pisou a linha, é falta.”

Decisão polémica

A decisão de concessionar a gestão artística do Maria Matos foi anunciada a 17 de dezembro do ano passado pela vereadora da cultura da Câmara de Lisboa, Catarina Vaz Pinto, em entrevista ao jornal Público. Vários partidos e um número significativo de lisboetas e agentes culturais contestaram a medida. No início deste ano, um grupo de cidadãos entregou na Assembleia Municipal de Lisboa a petição “Por Uma Gestão Pública do Maria Matos”, com mais de 2.500 subscritores. Mas a Câmara avançou.

Em simultâneo, Catarina Vaz Pinto anunciou a reabertura do Teatro do Bairro Alto (que até 2016 acolheu a companhia de teatro da Cornucópia) e do Teatro Luís de Camões (uma sala de fins do século XIX, em Belém). O primeiro tem diretor artístico escolhido, Francisco Frazão, mas ainda não está a funcionar. O segundo é agora conhecido por LU.CA e abriu portas em maio, com direção artística de Susana Menezes.

O Maria Matos foi inaugurado em 1969 e adquirido pela Câmara em 1982.saída de Mark Deputter do cargo de diretor artístico deste equipamento, em outubro do ano passado, foi um dos motivos que determinaram a reorganização na rede de teatros municipais da capital, segundo Catarina Vaz Pinto. Informações prestadas pela EGEAC indicam que os trabalhadores do Maria Matos foram entretanto integrados noutras três salas municipais: São Luiz, LU.CA e Teatro do Bairro Alto.

O gabinete da vereadora da Cultura informou esta quinta-feira que para já não comenta o processo. Sandra Faria, diretora da Força de Produção, disse aguardar pela decisão do tribunal.