A Academia das Ciências Sueca, em Estocolmo, atribuiu esta terça-feira o prémio Nobel da Física 2015 ao japonês Takaaki Kajita (56 anos), da Universidade de Tóquio, e ao canadiano Arthur McDonald (72 anos), da Universidade de Queen, pelas observações que lhes permitiram determinar que os neutrinos têm massa. A medição das propriedades do neutrinos, permitiu-lhes perceber que “a meio do voo” sofrem metamoforses. Estas transformações dos neutrinos de um tipo, nos de outro tipo, ao longo do tempo, chamam-se oscilações.

A colaboração de duas entidades que estudam neutrinos – o Observatório de Neutrinos de Subdury (SNO), dirigido por Arthur McDonald, e o Super-Kamiokande (SK), onde trabalha Takaaki Kajita – permitiu recolher dados suficientes para mostrar que estas partículas afinal têm massa, ao contrário do que se pensou durante muito tempo. E isto foi demonstrado porque entre o sítio de produção de neutrinos e o sítio de recepção, estes mudam as propriedades, logo tinham de ter uma massa diferente de zero. “Esta foi uma descoberta, que mostrou que o Modelo Padrão da Física de Partículas não era uma teoria completa”, acrescenta em comunicado de imprensa o Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP), um dos laboratórios que colabora com SNO. O Modelo Padrão, apesar de central na física de partículas, previa que os neutrinos não tinham massa.

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“Houve um momento Eureka quando fomos capazes de perceber que os neutrinos pareciam mudar de um tipo para o outro quando se deslocavam do Sol para a Terra”, disse Arthur McDonald aos jornalistas.

Os neutrinos são partículas elementares do grupo dos leptões, isentos de carga elétrica e com muito pouca massa. São formados pela fusão nuclear no interior das estrelas, durante o decaimento radioactivo ou quando os raios cósmicos colidem com a atmosfera da Terra. Para os estudar os grupos de investigação dos dois laureados dividiram-se em dois grupos: o SK estudou os neutrinos produzidos na atmosfera pelos raios vindo do espaço e o SNO, um observatório subterrâneo, estudou os neutrinos solares.

“É irónico que para observar o Sol tenhamos de ir uns quilómetros para debaixo da Terra. Não se esperaria que aí fosse o melhor sítio para olhar para o centro do Sol”, disse Arthur McDonald em entrevista.

Desde os anos 1930 que se previa teoricamente a existência de neutrinos para garantir que a conservação da energia não era violada nas desintegrações radioativas. Porém, apesar de serem das partículas fundamentais mais abundantes do universo, só foram detetadas pela primeira vez em 1956. Como não têm carga elétrica não interagem com campos magnéticos e interagem pouco com outras partículas, o que as torna tão difíceis de estudar.

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“O  puzzle com o qual os físicos se debatiam há décadas foi resolvido”, escreveu o Comité do Prémio Nobel no comunicado, explicando que os trabalhos de ambos os laureados foram responsáveis por esta “descoberta histórica”. A Terra está constantemente a ser bombardeada por neutrinos, explica o Comité, referindo que se espera que esta descoberta contribua para mudar o nosso entendimento atual da história, estrutura e destino futuro do universo.

Embora se saiba agora que os neutrinos oscilam, como um pêndulo, e se transformam com o passar do tempo, não se sabe exatamente qual a massa de cada tipo de neutrino, já que as oscilações permitem apenas medir o valor absoluto das diferenças de massa. A física de neutrinos é uma importante área de investigação, com experiências planeadas por várias décadas de forma a compreender a natureza destas partículas. A investigação em neutrinos já levou à atribuição dos prémios Nobel da Física em 1988, 1995, 2002 e agora em 2015.

Carlos Fiolhais fala dos “misteriosos neutrinos”

O professor de Física da Universidade de Coimbra, Carlos Fiolhais, já reagiu ao anúncio do prémio e, num pequeno depoimento para o Observador, falou dos “misteriosos neutrinos”:

O prémio Nobel da Física de 2015 premiou a investigação de uma das partículas mais misteriosas do universo: o neutrino. Sabe-se que os neutrinos não têm carga, daí seu nome, mas só desde há 15 anos, com os trabalhos agora reconhecidos, se sabe que os neutrinos têm massa, embora muito pequena. Os laboratórios que revelaram isso foram grandes detectores em minas nas profundezas da Terra, uma no Japão e outra no Canadá. O número de neutrinos recolhidos, por exemplo, do Sol não estava de acordo com as expectativas. Percebeu-se que eles mudavam de identidade no trajecto até à Terra, o que só era possível se tivessem massa. Esclarecida essa questão, permanecem ainda muitas dúvidas sobre os neutrinos. Os físicos querem ir mais além do actual modelo de partículas e forças. A pergunta básica continua: De que são feitas as coisas? Como foram e como são feitas as coisas?

Física foi a primeira área referida por Alfred Nobel

O terceiro e último testamento de Alfred Nobel (1833-1896) previa que grande parte da sua riqueza fosse destinada a premiar “aqueles que durante o ano anterior tenham feito o maior contributo para a humanidade”. O dinheiro deixado pelo químico e inventor deveria servir para constituir uma fundação que atribuiria os prémio anualmente. E a primeira área referida por Alfred Nobel foi a Física, talvez porque, no final do século XIX, a Física era a mais relevante das ciências.

O prémio Nobel da Física deveria ser atribuído “à pessoa que tenha feito a descoberta ou invenção mais importante na área da Física”. Alfred Nobel, no testamento, reforçou que “na atribuição dos prémios [este e os restantes quatro] não fosse tida em conta a nacionalidade dos candidatos, mas que fosse atribuído àquele que mais o merecesse, fosse escandinavo ou não”.

A existência de neutrinos foi postulada nos anos 30 de forma a que a conservação de energia não fosse violada em desintegrações radioactivas. Como interagem muito fracamente com a matéria, a detecção directa de neutrinos apenas aconteceu em 1956.

A investigação em neutrinos já tinha levado à atribuição dos prémios Nobel da Física em 1988, 1995 e 2002.

Factos e números do prémio Nobel da Física:

  • Foram atribuídos 108 prémios Nobel da Física entre 1901 e 2014;
  • 47 desses prémios foram atribuídos a uma única pessoa;
  • Até agora apenas duas mulheres receberam este prémio;
  • John Bardeen foi o único que recebeu o prémio duas vezes: em 1956, pela investigação em semicondutores, e em 1972, pela teoria dos supercondutores;
  • O mais jovem laureado, Lawrence Bragg, tinha 25 anos (1915) e recebeu o prémio juntamente com o pai;
  • A média de idades dos laureados é 55 anos.

Os dez laureados mais populares segundo o site do prémio Nobel:

  1. Albert Einstein
  2. Niels Bohr
  3. James Chadwick
  4. Marie Curie
  5. Erwin Schrödinger
  6. J.J. Thomson
  7. Robert A. Millikan
  8. Wilhelm Conrad Röntgen
  9. Werner Heisenberg
  10. Max Planck