Das muitas coisas intrinsecamente portuguesas que podemos encontrar, uma das mais evidentes de Norte a Sul, passando pelas ilhas, é a nossa cultura das festas populares. As cores, a comida, a música, a alegria, a bebida, a dança, o convívio que fazem parte da nossa identidade e da relação que temos com as festas, que têm uma linha comum em qualquer região de Portugal. Chegou há dias, às lojas, um jogo de tabuleiro com esta temática bem portuguesa. Desenvolvido pelos game designers Nuno Bizarro Sentieiro e Paulo Soledade, com ilustrações de Nuno Saraiva, Arraial traduz para o tabuleiro as tradições populares. Vence quem conseguir ter a festa mais concorrida.

Cada jogador começa com um pequeno retângulo quadriculado, que representa o seu arraial, e uma barra de cartão a representar os arcos das festas populares: é por aqui que os festeiros entram no recinto. No centro do tabuleiro temos um coreto rotativo, onde três tetrominos – as peças constituídas por quatro quadrados tornadas famosas pelo Tetris – se encontram. A disposição dos arraiais dos diversos jogadores à volta do coreto é algo que importa, já que é este o ponto de origem das peças que vão “caindo” para o nosso tabuleiro.

Quando chega a nossa vez de jogar, temos três ações e somos obrigados a ir buscar pelo menos uma peça. A lógica de colocação dos tetrominos no arraial segue o mesmo pensamento do Tetris: descem do topo (do coreto) na mesma posição até à base do nosso arraial. Visto que as peças não podem rodar por si mesmas, podemos optar por gastar ações a rodar o coreto para que os tetrominos fiquem na posição que queremos.

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Pontuar no Arraial é bastante simples e pode ser feito de diversas formas. A primeira, e mais simples, é que cada um dos tetrominos tem cores diferentes, e recebemos um meeple (uma “pessoa” de madeira, representando um visitante) sempre que fazemos uma nova área no arraial, com duas peças da mesma cor contíguas. Além disso, o arraial que possuir o maior conjunto de peças da mesma cor recebe um meeple duplo, que representa um casal. Se algum jogador suplantar o tamanho de dada área recebe de imediato a peça do casal da cor correspondente.

Tal como no Tetris, sempre que fazemos uma linha horizontal recebemos um ponto, neste caso um visitante branco que poderá entrar na nossa festa no final da ronda. As semelhanças com o famoso videojogo de Alexey Pajitnov passam também pela gestão do espaço quadriculado do nosso arraial, já que o arco de entrada da festa vai descendo ou subindo à medida que os turnos passam. A área para dispormos as peças fica cada vez mais pequena à medida que o jogo avança.

Arraial é um jogo simples sem qualquer necessidade de leitura, tornando-o numa ótima aposta para jogar com crianças. Colorido e divertido com as excelentes ilustrações de Nuno Saraiva, toda a abordagem casual e simples torna-o muito fácil de explicar a qualquer jogador, independentemente da idade. Se gerirmos a colocação das peças que nos calham é parte do desafio, depois de termos feito algumas partidas em família, percebemos que a simplicidade disfarça um ponto adicional para os mais novos: a exploração cognitiva do espaço bidimensional com peças de diversas formas. No caso das crianças, além da componente lúdica por si só, há um trabalho da organização e distribuição do espaço bidimensional, já que têm de antever e gerir a colocação das peças de forma otimizada no seu tabuleiro de arraial.

O “Tetris português” é um jogo com turnos muito rápidos, nas quais as próprias partidas não têm uma duração longa, com uma temática tão portuguesa que as próprias peças do jogo parecem trazer um aroma a manjerico consigo. Arraial é uma grande aposta para serões em família e amigos e de reboque uma forma de matar saudades das festas populares, das sardinhas e do vinho, em qualquer altura do ano. Afinal, os Santos Populares são sempre que alguém quiser, e o Arraial vem provar isso mesmo.

Ricardo Correia, Rubber Chicken