Vítor Raposo, antigo sócio de Domingos Duarte Lima, que cumpria pena de prisão no caso BPN/Homeland — relativo à compra de  terrenos em Oeiras — foi libertado este sábado cerca das 8h, depois de ter recebido um perdão ao abrigo do regime excecional de flexibilização da execução das penas, no âmbito da Covid-19.

Ao que o Observador apurou, o empresário, e também antigo deputado do PSD por Bragança, já havia cumprido metade da pena, faltando-lhe menos de dois anos para o fim, situação que o enquadrava dentro dos casos em que era permitido um perdão da pena. Vítor Raposo estava no Estabelecimento Prisional de Bragança a cumprir uma pena de quatro anos por burla qualificada.

Segundo a alínea 1 do artigo 2.º deste regime, “são perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igual ou inferior a dois anos”. Além disso, prevê-se também um perdão para “os períodos remanescentes das penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração superior à referida no número anterior, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igual ou inferior a dois anos, e o recluso tiver cumprido, pelo menos, metade da pena.”

A saída, sabe o Observador, poderia acontecer logo às 00h01 de sábado, mas, como o procedimento não é comum e o arguido não pediu qualquer exceção, aguardou até ao horário habitual de saída, as 8h da manhã.

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Contactado este domingo, Vítor Raposo disse não querer fazer por enquanto quaisquer comentários.

Como funcionava o fundo imobiliário Homeland

A 7.ª Vara Criminal de Lisboa deu como provado em novembro de 2014 que Duarte Lima e o seu sócio Vítor Raposo burlaram o BPN na compra de terrenos em Oeiras, estando no centro deste processo o fundo imobiliário Homeland. O coletivo presidido pela juíza Filipa Valentim condenou ainda outros arguidos por participação no esquema.

Este fundo, cuja criação remonta a 2007, tinha como objeto a compra de terrenos em Oeiras “com grande expectativa de valorização em futuro próximo”. No total, 85% do fundo (o que correspondia a 8,5 milhões de euros) eram detidos por Pedro Lima – filho de Duarte Lima – e Vítor Raposo. E os restantes 15% eram do Fundo de Pensões do BPN.

A aquisição da participação de Pedro Lima e de Vítor Raposo foi suportada por créditos conseguidos junto do BPN, que à data tinha como presidente do Conselho de Administração Oliveira e Costa. E mais: o pagamento destes empréstimos contraídos foi ele também feito com recurso a contas a descoberto no mesmo BPN. A Justiça concluiu, por isso, que, ainda que o banco detivesse através do seu fundo de pensões 15%, a verdade é que o BPN havia entrado com o total do capital para a criação do fundo.

Mas o caso ainda fica mais complexo, uma vez que o pagamento dos descobertos não fora feito com dinheiro de Lima e Raposo, como deveria ser, mas com dinheiro do banco. Como? É que, depois de criado o Homeland, foram pedidos 22 milhões de euros para a compra de terrenos em Oeiras que na verdade foram adquiridos por 5 milhões (apesar de na escritura terem sido inscritos os 22 milhões para que o fundo nunca soubesse que havia dado dinheiro a mais).

Com o valor que sobrou (17 milhões) foram pagos os 8,5 milhões de euros das contas a descoberto que serviram para a compra das participações. Além deste montante, outros 8,5 milhões foram parar às contas dos arguidos, sendo que parte deste valor foi usado para pagar luvas aos advogados dos herdeiros da família Neta Franco, proprietários dos terrenos — estes advogados terão aceitado que os terrenos fossem escriturados por valores diferentes do montante real pago. João e Pedro Almeida e Paiva foram dois dos condenados neste processo, por terem recebido contrapartidas de 620 mil euros, agindo contra os interesses de quem patrocionavam.

Pedro Lima, por sua vez, acabou absolvido, por ter ficado demonstrado que era o pai quem agia em seu nome e que terá beneficiado do negócio.

As condenações e a redução de penas dos desembargadores Rangel e Caramelo

Um ano e meio depois da decisão de primeira instância, em abril de 2016, a Relação de Lisboa, num acórdão de Rui Rangel e Francisco Caramelo, confirmou a condenação de primeira instância, tendo, no entanto, considerado as penas aplicadas demasiado pesadas. Assim, Duarte Lima viu a sua pena de prisão reduzida de dez para seis anos (por burla qualificada e branqueamento de capitais) e a Vítor Raposo os desembargadores encurtaram a pena de prisão de seis para quatro anos. Francisco Canas, dono de uma casa de medalhas na Rua do Ouro e peça central em esquemas de lavagem de dinheiro, que entretanto morreu, teve a sua pena reduzida de quatro para três anos (por branqueamento de capitais). E os advogados João e Pedro Almeida e Paiva tiveram as suas penas fixadas em dois anos e seis meses e dois anos de prisão, respetivamente — em primeira instância haviam sido condenados a quatro e dois anos de prisão.

Mas a redução das penas não foi justificada com qualquer alteração dos factos, bem pelo contrário. Os juízes desembargadores consideraram ter ficado provado que a totalidade dos terrenos Homeland foi vendida “ao Fundo Homeland por 47 845 000 euros, por via de um empréstimo concedido pelo BPN”. Estes montantes contemplavam não só os terrenos dos herdeiros Neta Franco como outros. E, segundo o tribunal, “o valor real da venda dos terrenos era de 30 milhões de euros”, sendo que “o prejuízo da Parvalorem (BPN) é a diferença entre estes valores, ou seja, 17 845 000 euros”.

Duarte Lima está atualmente a cumprir pena de prisão na Carregueira, no âmbito deste processo. Depois de uma maratona de recursos, o caso acabaria por transitar em julgado 5 de abril de 2019. Está a cumprir três anos e meio de pena, dado que foi descontado o tempo em que esteve em prisão preventiva. Além disso, está agora a contas com o julgamento do homicídio de Rosalina Ribeiro que acontecerá em Portugal.