Pedro Caldeira era uma máquina de fazer dinheiro. Era o homem certo na altura certa a quem tudo, no final, deu errado.
Em meados dos anos 80, época da adesão de Portugal à então CEE (Comunidade Económica Europeia), forma-se uma “bolha” na Bolsa de Lisboa, à semelhança do que acontece noutros mercados de ações da Europa e dos Estados Unidos. Fazem-se fortunas do dia para a noite. Quem já tem dinheiro ou poupanças dificilmente resiste a entrar na “febre”. Todas as manhãs, na baixa de Lisboa formam-se filas que dão a volta ao quarteirão. Os mais idosos levam cadeirinhas de plástico para se sentarem à portas dos escritórios.
No centro de todos estes negócios estão os corretores, naquela altura ainda um grupo muito restrito de intermediários: e só eles podem fazer os negócios entre quem vende e quem compra. O movimento é tanto que nenhum consegue manter os registos e a contabilidade em dia, muito antes da era dos computadores e quando tudo era em papel e recortado a tesoura. Muito menos aquele que rapidamente se tornou o mais importante corretor da bolsa de Lisboa: Pedro Caldeira.
Em finais de 1987, esta “febre bolsista” sofre um primeiro abalo quando o então primeiro-ministro, Cavaco Silva, vai à televisão dizer que na bolsa se vende, por vezes, “gato por lebre”. Alguns dias depois, vem a derrocada: um dos maiores crashes da história dos mercados financeiros mundiais coloca pela primeira vez Caldeira em apuros.
Nessa altura, o corretor já não era apenas o “príncipe da Bolsa”. Era também um dos mais conhecidos membros do jet set de Cascais e Lisboa, onde não faltava a uma festa, com as suas fotos — ao lado da mulher, Cristina — sempre nas revistas sociais. O glamour, a forma como se vestia (sempre com suspensórios, fato e o indispensável lenço) e o cabelo penteado para trás tornaram-se uma imagem de marca.
Mas após o colapso da bolsa, o corretor vê-se num enorme sarilho. Um sarilho que vai acabar por ditar a sua queda, alguns anos depois.
O Banco Pinto e Sotto Mayor obriga-o a reconhecer uma dívida (pessoal) de quase dois milhões de contos – hoje seria algo como 35 milhões de euros. Era tanta a confusão dos registos que Caldeira não teve como se defender. Aceitou, confiante de que conseguiria dar a volta por cima. Não conseguiu.
Tenta então um outro plano. Sabe que todos queriam estar com ele, todos queriam ser vistos com ele e todos queriam fazer negócios com ele. Por isso, como um encantador de serpentes, procura seduzir as principais figuras da alta sociedade portuguesa. Quer que lhe entreguem dinheiro para gerir e promete juros altos. Pelas suas mãos vai passar grande parte das fortunas e investimentos dos mais ricos e poderosos do país: as principais famílias, empresários de sucesso, um jogador de futebol famoso, um general, um músico e o mais conhecido apresentador de televisão da altura.
Mas quando começa a não conseguir pagar e recebe ameaças de morte acaba por fugir.
O “Encantador de Ricos” é o novo podcast narrativo do Observador. Conta a história de como Pedro Caldeira teve na mão o dinheiro dos mais poderosos – e de como o perdeu.
[Ouça aqui o trailer da série “O Encantador de Ricos”]
Surge depois do sucesso de “O Sargento na Cela 7” — que contou a vida do militar português que mais tempo passou em cativeiro durante a guerra de África —, de o “Piratinha do Ar” — que revelou a história do bom aluno e fã de óvnis que aos 16 anos desviou um avião da TAP — e de “Um Espião no Kremlin” — que mostrou a rede de dinheiro e poder que Putin montou de forma secreta ao longo de anos para chegar ao poder.
Ao longo de vários meses, o Observador falou com várias pessoas próximas do corretor ou que com ele trabalharam, consultou o processo, ouviu o juiz que o julgou e quem o investigou. Também leu o livro em que narra a sua história, dezenas de artigos de jornais e o documentário da SIC em que até participa. Tudo para reconstruir o que aconteceu com o homem que dominou a Bolsa em Portugal e acabou como um dos fugitivos mais procurados do país.
“O Encantador de Ricos” é também uma série dos Poddcast Plus do Observador para ouvir em seis episódios, que vão estar disponíveis todas as terças-feiras, não apenas no site e nas redes sociais do Observador mas também em todas as habituais plataformas de podcast. Já pode ouvir o trailer e o primeiro episódio estreia na próxima terça-feira, dia 7.
A narração da história está a cargo da atriz São José Correia e The Legendary Tigerman é o autor da banda sonora original. A investigação e os guiões são de Edgar Caetano, a sonoplastia é de Artur Costa e a edição é de João Santos Duarte.