Um tiro ao lado. Ou melhor, fogo amigo contra sociais-democratas e centristas. O objetivo era denunciar a aliança da esquerda. “Foi nisto que votou?”, lê-se em letras garrafais. Os alvos eram António Costa, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa, os responsáveis pela queda do Governo PSD/CDS. As armas de arremesso? A imagem de Lenine e a alusão à extinta União Soviética. A mensagem era clara: PS, Bloco e PCP assaltaram o poder.

Mas o cartaz da JSD trazia outro detalhe que não passou despercebido: a bandeira vermelha com a foice e o martelo sobre o Reichstag (Parlamento alemão), uma imagem histórica do século XX e que ficou imortalizada por representar a derrota de Hitler e do nazismo.

CARTAZ

O cartaz da JSD – Catarina Martins, Costa e Jerónimo. Ao fundo a fotografia que simboliza a derrota de Hitler

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Aqui, a imagem original que esconde, também ela, alguns segredos

O cartaz da JSD causou alvoroço nas redes sociais e foi partilhado até à exaustão. Na grande maioria das vezes, acompanhado por uma chuva de críticas, considerações pouco simpáticas e comentários carregados de ironia sobre a forma como, de forma involuntária, a JSD tinha comparado Passos e Portas a Hitler.

Entretanto, a JSD já se veio retratar. Num comunicado enviado às redações, os jovens sociais-democratas explicam que não quiseram, “logicamente”, fazer “qualquer alusão ao modelo nacional-socialista ou nazi”. “Ao contrário de outras forças partidárias, que agora querem governo o país sem o voto do povo (aquele “que mais ordena”), esta estrutura nega simpatia por um qualquer regime extremista e ditatorial, seja ele nazi, norte-coreano ou outro que tal”, reforçam.

Mesmo assim, a organização reitera as críticas “à frente de esquerda” – uma “união clandestina, sem conteúdo ou dignidade” alimentada por um PS que, “à custa da ambição pessoal do seu líder”, trocou “o centro pela esquerda radical”, a “moderação por um caminho antiprojecto europeu, antimoeda única, antiabertura de fronteiras”.

Bem sabemos que a pergunta “foi nisto que votou?” irrita alguns setores e organizações da sociedade portuguesa. E irrita porque a resposta é “não”! Os portugueses não votaram numa aliança escondida de esquerda, cujos elementos rejeitam o projeto europeu ou vitórias como as da queda do muro de Berlim. Não!”, escrevem.

Por isso, os jovens sociais-democratas garantem: “A associação entre esta frente de esquerda e momentos traumáticos da história europeia e da humanidade certamente perturbará quem prefere derrubar governos mantendo-se escondido no seu próprio silêncio”, mas a JSD “não se cala perante este presente penoso e aterrador, construído, ainda para mais, nas costas dos portugueses”.

Apesar das críticas generalizadas, houve, no entanto, quem defendesse o exercício de comparação da JSD. Michael Seufert, deputado do CDS na anterior legislatura, foi um deles. Num texto publicado no blogue “À vontade do freguês“, o centrista argumenta, entre outras coisas, que se o objetivo da montagem é “associar Jerónimo ao regime soviético” então “é bem escolhida”. “Nem o PCP nem Jerónimo de Sousa alguma vez se distanciaram dos crimes soviéticos e em particular dos crimes do exército vermelho“.

Mais, acrescenta o antigo deputado: “E se é um facto que Hitler foi derrotado no momento em que esse exército chegou a Berlim, vindo de Leste, é um reescrever da história chamar-lhe libertação ou celebrar esse dia. É que trocar um ditador – por muito horrível que fosse, como foi o caso de Hitler – por outro – e Estaline jogava com Hitler na liga dos crimes contra a humanidade – não é propriamente ficar livre ou ficar melhor. É trocar uma bota com uma suástica por outra com uma foice e martelo. As duas pisam a liberdade e a vida. Para o povo é igual”. 

A história da fotografia que marcou a II Guerra Mundial

A fotografia que retrata a queda dos nazis aos pés da União Soviética tem uma história longa. A 30 de abril de 1945, o exército vermelho avançava sobre Berlim, por entre ruas transformadas em ruínas. No primeiro dia da ofensiva, um jovem soldado soviético conseguiu subir ao edifício mais alto da fantasmagórica cidade e ergueu a bandeira vermelha com a foice e o martelo. No entanto, a bandeira foi removida horas depois pelas poucas forças nazis que ainda estavam na cidade – não chegou, sequer, a ser fotografada.

Já com a cidade tomada, em maio, o fotógrafo russo Yevgeni Jaldéi reconstituiu a cena e captou várias imagens de Berlim rendida ao exército vermelho. Foi esse momento que seria imortalizado e não sem que a imagem levassem, à posteriori, vários retoques: algumas colunas de fumo, para aumentar o drama, uns relógios a menos no braço do jovem soldado que aparece na imagem, relógios que eram frutos da pilhagem à cidade, e uma dose a mais de heroísmo. 

A imagem final foi divulgada a 13 de maio pelo jornal Ogonyok e foi amplamente divulgada pelos órgãos de comunicação social. Yevgeni Jaldéi, o responsável pela fotografia, chegou a explicar, anos mais tarde, que a modificação da imagem tinha sido uma forma de responder à propaganda nazi. Montagem ou não, a fotografia tornou-se um dos maiores símbolos comunistas.