Peças de teatro, dança ou circo. Atividades paralelas de artes visuais. Funcionamento permanente. Coproduções e estreia absoluta de espetáculos — sempre a pensar no público infantojuvenil. É este o projeto artístico que Susana Menezes quer desenvolver na nova sala de Lisboa, o Teatro Luís de Camões, em Belém, com inauguração marcada para esta sexta-feira. Passa a ser conhecido como LU.CA (Lugar para as Crianças e Jovens e para as Artes).

A programação dirigida a crianças e jovens é muitas vezes um anexo da programação principal das salas de teatro, mas aqui queremos que ela tome a dianteira e se emancipe”, explicou Susana Menezes, durante uma visita guiada ao espaço, na terça-feira. “É uma sala independente com uma programação em que as crianças possam ter um papel na cultura da cidade.”

Susana Menezes estudou design e tornou-se programadora cultural para crianças há 17 anos. Primeiro no Teatro do Campo Alegre, no Porto, e a partir de 2006 no Teatro Maria Matos, quando Diogo Infante era diretor artístico. Assume agora a liderança do LU.CA, equipamento gerido pela empresa municipal de cultura, a EGEAC, cuja remodelação custou 1,2 milhões de euros, dizem os números oficiais.

A inauguração vai durar três dias: sexta, sábado e domingo (1, 2 e 3 de junho), das três da tarde às oito da noite, com propostas iguais nos três dias. Começa com um concerto de 60 minutos baseado nas fábulas de La Fontaine, pela Orquestra Juvenil Metropolitana, com música original de Lino Guerreiro, direção do maestro Élio Leal e projeção de nove imagens do fotógrafo Daniel Blaufuks. Nesses dias inaugurais, as famílias são também convidadas a:

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  • conhecer livros relacionados com a temática das fábulas, iniciativa com curadoria de Sara Amado;
  • espreitar a sala com binóculos;
  • imprimir e pintar fotografias;
  • observar a exposição “Abrigo”, com projetos de alunos do primeiro ano da Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha;
  • assistir à performance “Girafas”, que começa na rua e se prolonga pelo edifício, da autoria do grupo catalão Xirriquiteula Teater.

No dia 16 de junho, terão lugar visitas guiadas, para que o público conheça todos os recantos do teatro num ambiente mais calmo. No fim de junho, e ao longo do mês de julho, serão apresentadas 10 sessões de espetáculos infantis que passaram pelo Maria Matos na última década: “Hamlet Sou Eu”, do grupo Teatro Praga, e “A Montanha”, de Ana Brandão e António Jorge Gonçalves, são apenas dois exemplos.

O LU.CA estará encerrado em agosto e reabre em setembro. A partir dessa data, funciona de terça a domingo. Nos dias úteis acolhe visitas de escolas e ao fim de semana tem espetáculos e atividades para as famílias. O preço dos bilhetes ainda não está definido.

Estamos num teatro e não vamos fugir dessa função, no entanto, é nosso propósito olhar para a arte contemporânea sob diferentes perspetivas”, explicou a diretora. “Podemos ter um espetáculo, mas também exposições de objetos de design. O foco central são as artes de palco, que serão apresentadas na sala principal, mas há uma programação paralela que nasce do objeto artístico que se vê no palco e se relaciona com ele. Aí incluímos outras práticas artísticas, como a fotografia, o cinema, a música ou a ilustração. Não vamos dar às crianças atividades fáceis, queremos propostas complexas, com lastro, que estiquem os horizontes.”

350 mil euros por ano

A abertura do equipamento resulta da decisão de reorganizar os teatros municipais da capital, anunciada em dezembro pela vereadora da cultura da Câmara de Lisboa, Catarina Vaz Pinto – decisão polémica, contestada por vários partidos e um número significativo de lisboetas e agentes culturais. A reorganização implica o arrendamento a privados do Teatro Maria Matos, processo ao qual se apresentaram dois candidatos e que está fase de análise por parte de um júri. Implica também a transferência da programação para duas novas salas: LU.CA e Teatro do Bairro Alto/Cornucópia.

A direção artística do LU.CA ficou desde logo definida, porque é essencialmente a mesma que estava a programar para crianças no Maria Matos. Para escolha do diretor do Teatro do Bairro Alto foi lançado um concurso público pela EGEAC, que terminou a 6 de abril. Decorrem entrevistas aos 27 candidatos e o vencedor será conhecido no fim desta semana ou no início da próxima, apurou o Observador junto da EGEAC.

Com o LU.CA, a programação infantojuvenil “vai ganhar um outro fôlego, outro ritmo e outra escala”, defendeu Susana Menezes. O orçamento é de cerca de 350 mil euros por ano, só para programação – mais do dobro do que aquilo que estava disponível no Maria Matos. Susana Menezes, Glória Silva, Bruno Reis, Manuel Martins e Sérgio Azevedo formam o núcleo central da equipa e a estes poderão juntar-se nos próximos meses mais 10 a 13 pessoas a tempo inteiro.

Columbano na sala principal

O teatro foi totalmente remodelado, mas conserva corrimões, escadas e pormenores decorativos originais. O teto da sala principal é composto por frescos da autoria de Columbano Bordalo Pinheiro, presumivelmente desconhecidos até agora. A plateia tem 81 lugares e nos camarotes cabem mais 50 pessoas. Há espaço para um café, que ainda não está concessionado, e os artistas tem camarins coletivos. Algumas arcadas mantiveram a traça antiga e são muito mais baixas do que é hoje habitual, obrigando quem passa a agachar-se com frequência.

Edifício de gosto neoclássico tardio, na definição dos especialistas, fica no número 80 da Calçada da Ajuda, uma lateral do Palácio de Belém, e remonta a 1737. A história é mais ou menos conhecida, mas não está estudada em detalhe e a reabertura pode agora impulsionar esse trabalho.

Foi Casa da Ópera do rei D. João V (antes do aparecimento do Teatro de São Carlos), funcionou como armazém e celeiro, passou a Teatro Luís de Camões em 1880 (nos 300 anos do nascimento do poeta) e no último século acolheu o Belém Club, coletividade cultural que se mudou para a Rua da Junqueira em 2016.

A sala esteve fechada entre 2012 e 2015 por falta de condições de segurança. A reconstrução começou nessa altura e terminou em abril último, com projeto da dupla de arquitetos Manuel Graça Dias e Egas José Vieira.