Taxistas de toda a Europa estão em pé de guerra com as aplicações de telemóvel que prometem motoristas privados à distância de um clique. Depois de na quarta-feira dezenas de milhares de táxis terem instaurado o caos em cidades europeias como Londres, Paris, Madrid, Barcelona, Roma e Berlim em protesto contra uma destas plataformas – a Uber -, lançou-se o mote para repensar a forma como hoje em dia se chama um táxi. Aliás, para repensar a forma tradicional como hoje se anda de táxi – um transporte habitualmente encarado como inseguro, tanto para clientes como para motoristas.

João Mota de Campos é advogado e costuma sair tarde do escritório onde trabalha, no centro de Lisboa. Àquelas horas da noite já não há metro a circular e por isso procura um táxi. Precisamente na rua da frente há uma praça de táxis, mas nem por isso costuma ter sorte. “A primeira vez que pensei nisso foi na perspectiva do cliente”, disse ao Observador o jovem empreendedor de 27 anos que está a trazer para Portugal uma das aplicações para smartphone mais usadas no Brasil. “Não só do ponto de vista de facilitar e acelerar a chegada do táxi, mas também para aumentar a segurança para quem não gosta de andar no carro de um desconhecido”, explica.

A 99Táxis (disponível para iOS, Android e Windows Phone) quer dar essas garantias de segurança e ser uma ponte entre condutores e passageiros. Para isso funciona nas duas frentes: como instrumento de angariação de clientes para os taxistas e como instrumento que agiliza a chegada do carro ao local exato onde o cliente se encontra. O único requisito para ter um táxi na mão é que as duas partes tenham um telemóvel com acesso à internet – “não é preciso nenhum topo de gama, serve qualquer um com [o sistema operativo] Android” – e tanto o registo como a aquisição da plataforma são gratuitos.

João estava de férias no Brasil quando ouviu pela primeira vez falar neste sistema. Estava de partida para o aeroporto e preparava-se para chamar um táxi da maneira dita tradicional quando um amigo se antecipou e fez o pedido através da app. “Nunca tinha visto nada assim”. Rapidamente o taxista que estava mais perto detectou o pedido e João, através do telemóvel, conseguiu rastrear o percurso feito pelo carro até chegar ao ponto onde se encontrava. Foi rápido e, já se sabe, no que toca a idas para aeroportos todos os minutos são preciosos.

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À semelhança da 99Táxis, começaram a entrar no mercado português no último ano aplicações como a GeoSensi, a TaxiMotions, a Taxi Link ou a Taxi Click – que está em força em Espanha -, que procuram modernizar a profissão do taxista.

Mas como funciona exatamente? 

O utilizador regista-se através do Facebook, ou fornecendo os dados básicos – nome, email e número de telefone – e assim que entra na aplicação, o sistema identifica a sua localização com base nas informações de GPS. Depois de clicar em “pedir táxi”, pode corrigir a morada exata em que quer que o vão buscar e especificar a forma como quer pagar a viagem (dinheiro, cartão de débito, cartão de crédito ou Pay Pal). Ao confirmar o pedido, o sistema disponibiliza o taxista registado que está mais próximo. Depois de a aplicação fazer a correspondência entre condutor e passageiro, o utilizador recebe no telemóvel as informações sobre o táxi, modelo e matrícula; e sobre o taxista, nome, fotografia, número de telefone.

Depois, através de um mapa, tanto o taxista como o cliente conseguem monitorizar o ponto exato em que cada um se encontra.

Se for uma rua muito movimentada, “o cliente pode mesmo especificar na aplicação como está vestido ou se tem alguma coisa que o identifique para facilitar o encontro”, explica João.

O recurso à geo-localização é, para João, uma das principais vantagens da modernização da chamada de táxis, que se distancia bastante das tradicionais rádios-táxi: “o taxista vê no mapa o ponto correspondente à pessoa que vai buscar e a pessoa que espera pelo táxi vê no mapa o ponto correspondente ao automóvel”. O processo é acompanhado em tempo real, por GPS. Ou seja, torna obsoleto o ritual de ligar para a central de táxis e esperar às escuras pelo táxi x na rua y.

A segurança é outro dos pontos fortes, e foi o motivo principal que levou à criação deste tipo de aplicações num país com elevados índices de criminalidade como o Brasil, explica o advogado ao Observador. “O cliente tem acesso às informações básicas sobre o táxi e o taxista, portanto se algo correr mal o cliente pode fazer queixa, e o próprio taxista sabe disso”, explica. Além de que, “para o taxista estar registado na app tem de fornecer todos os documentos que provem que está no exercício legal da profissão”. E para quem tem receio de fornecer dados como o nome ou o número de telefone, “os dados são encriptados, claro, para respeitar a privacidade e garantir segurança”.

Portugueses desconfiam

Fundada em 2012, já mais de 55 mil taxistas no Brasil trabalham com a aplicação no bolso e cerca de 1,2 milhões de brasileiros servem-se dela para se deslocar. Em Lisboa, o processo é muito recente. Numa semana e meia de trabalho nas ruas a equipa da 99Táxis conseguiu registar apenas 30 taxistas, mas não considera um número problemático. “No início é difícil num mercado tão fechado e regulado como o dos táxis, mas depois pega”, acredita João.

A previsão é conseguir entre 100 e 120 até ao final do mês. E para isso estão a ser delineadas estratégias de parceria com outras empresas para ultrapassar a barreira da desconfiança dos profissionais.

“Os mais novos, e que têm mais experiência, com as novas tecnologias são muito receptivos”, diz João. Mas outros, ou por não terem um smartphone no bolso ou por “desconfiança”, mostram-se relutantes. “Os portugueses são muito desconfiados e alguns taxistas não percebem por que é que lhes estão a oferecer um serviço gratuito para os ajudar no seu trabalho”.

Mas plataformas como esta já são um sucesso um pouco por todo o mundo, sendo muito usadas em países europeus como Reino Unido, Espanha e Alemanha, por exemplo. Ou seja, nos mesmos que na quarta-feira fizeram greve contra a Uber, a empresa de transporte privado que trabalha com motoristas credenciados pela empresa, mas não profissionais, que está a ser acusada pelos taxistas de “concorrência desleal” por não se regular pelas tarifas impostas pelas diretivas comunitárias.

“Ser taxista não é fácil nem barato, implica comprar uma licença [o Certificado de Aptidão Profissional] paga, ter o carro registado, e ter todos os documentos em ordem, e o que a Uber faz é contornar as regulamentações da profissão para oferecer preços mais atrativos”, acusa João Mota de Campos. Daí que em Londres, por exemplo, onde andar nos icónicos táxis pretos é considerado caro, a contestação tenha sido muito elevada: mais de 10 mil táxis pararam no centro londrino. No fim do dia, e feitas as contas, a Uber assistiu a um aumento de 850% no número de inscritos na app.