Como unir a cidade à frente de rio, quando ao lado existe uma estrada e uma linha de comboio? A arquiteta britânica Amanda Levete respondeu a este problema com um edifício orgânico, futurista, em forma de onda e com textura de réptil. Apenas 14 metros de altura, muitos mais em profundidade.

Apresentado à imprensa portuguesa nesta segunda-feira de manhã, o MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, projeto da Fundação EDP com inauguração agendada para quarta, dia 5, custou cerca de 20 milhões de euros, disse o presidente do conselho de administração da elétrica portuguesa. Um milhão acima do que se sabia até agora.

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António Mexia, presidente da EDP (à dir.), atualizou valores: o MAAT custou 20 milhões

“É cerca de 0,6% do investimento total que a EDP fez ao longo do período em que o museu foi construído”, precisou António Mexia, em referência aos últimos seis anos.

Sorridente, o líder da empresa guiou os jornalistas pelo interior e exterior do museu. A mensagem que quis passar tinha dois eixos. Primeiro: o MAAT “tem o objetivo claro de tornar Lisboa uma referência no circuito internacional da arte contemporânea.”. Segundo: “Parece um novo miradouro de Lisboa, apesar de ser baixinho”.

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“Há muitos museus que proíbem as pessoas de fazer fotografias, mas aqui tudo é fotografável, o museu pretende ser experiencial”, acrescentou António Mexia, sugerindo que o MAAT, na busca de um público jovem, ávido e instruído, está pensado para a era das redes sociais na internet.

À pergunta sobre o porquê de o MAAT abrir portas agora, ainda que o projeto só venha a estar completo em março do próximo ano, com todas as salas operacionais e um jardim em volta, Mexia insistiu no mesmo registo: “A velocidade do mundo de hoje obriga a estas dinâmicas.”

Amanda Levete, presente na visita guiada – assim como Pedro Gadanho, diretor do MAAT, e Miguel Coutinho, diretor-geral da Fundação EDP – defendeu a importância de se criar “espaços públicos para as pessoas se encontrarem, para comunicarem”, o que é “quase tão importante quanto criar o edifício de um museu”.

“Este edifício não poderia existir em mais lado nenhum. O telhado é um fórum, um miradouro para o rio e também permite que nos voltemos de costas para o rio e apreciemos a zona antiga de Lisboa. É algo que muitas pessoas talvez nunca tenham experimentado, porque na zona ribeirinha não há miradouros”, disse Amanda Levete, prémio Stirling do Royal Institute of British Architects em 1999.

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O telhado transitável transforma o edifício em miradouro

O MAAT tem uma área expositiva de três mil metros quadrados e estende-se por mais quatro mil metros junto à Avenida de Brasília. A fachada é coberta de peças de cerâmica branca (e não dourada, como as imagens por vezes sugerem). Na segunda-feira, dezenas de operários terminavam a aplicação desse revestimento.

Quanto ao telhado, em pedra de lioz, típica de Lisboa, foi pensado como sala ao ar livre. É uma rampa curva, como uma bolha. De resto, nas formas dinâmicas, o MAAT faz lembrar um réptil, da mesma maneira que, por exemplo, se disse que o antigo Pavilhão Atlântico da Expo ’98 (agora Meo Arena do Parque das Nações) fazia lembrar uma tartaruga.

Ao lado, mantém-se a Central Tejo, ou Museu da Eletricidade, o qual passa a integrar o complexo MAAT. Amanda Levete falou da relação entre ambos os edifícios, um com tijolos cor de laranja, vertical, industrial, o outro quase vivo, continuação do antigo.

“A relação com a Central Tejo é essencial, é um edifício muito bonito, com uma presença imponente”, constatou a arquiteta. “Tive de responder a isso com outro edifício que tivesse presença, mas não desafiasse aquele, daí a altura reduzida. O espaço em redor flui até ao museu. Não quisemos criar uma entrada monumental, quisemos fluidez de circulação.”

O que haverá para ver

No Museu da Eletricidade terão lugar exposições baseadas na coleção de arte da Fundação EDP, um acervo que começou a ser construído em 2004 e que hoje é composto por milhares de obras contemporâneas de todo o mundo, tendo cerca 250 artistas portugueses representados. A Central Tejo passa a ser vista como a parte mais convencional do MAAT, local para as “obras de parede”.

Noutro sentido, o novo edifício, composto por quatro salas (Sala Oval, Galeria Principal, Project Room e Video Room), irá privilegiar abordagens inovadoras, com instalações e esculturas criadas para o lugar (site-specific). “A Sala Oval terá sempre projetos novos, encomendados a artistas de reputação internacional”, resume o diretor, Pedro Gadanho.

A primeira dessas artistas é a francesa Dominique Gonzalez-Foerster, e o seu “Pynchon Park”, um estranho objeto com bolas de Pilates e colchões no chão, espécie de jaula em plástico na qual se entra através de portões cujo acesso é controlado por um algoritmo informático. A inauguração é na quarta-feira.

“Os visitantes são convidados a ativar a peça”, contextualiza Pedro Gadanho. “Tem um aspeto lúdico, a pensar nas crianças, mas também lança uma reflexão crítica sobre o comportamento humano, como se as pessoas estivessem a ser observadas por alienígenas.”

Ao longo de 2017, serão convidados mais três artistas para a Sala Oval: o mexicano Hector Zamora (no âmbito da bienal Boca), o cubano radicado em Madrid Carlos Garaicoa e o norte-americano Bill Fontana.

O peso da América Latina nestas escolhas explica-se pelas transformações políticas e económicas que ali se vivem, segundo Pedro Gadanho. “Queremos introduzir, como já estamos a fazer com Dominique Gonzalez-Foerster, uma dimensão política nas exposições e assim instigar o debate”.

Quando à Project Room, será dedicada maioritariamente a artistas portugueses, mas o diretor entende ser cedo para divulgar nomes de pessoas que já tenha convidado.

Pedro Gadanho foi curador no departamento de arquitetura e design do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, MoMA, o que vai influenciar algumas das escolhas que fará enquanto diretor do MAAT.

“Foi uma aprendizagem indispensável em termos de gestão de um museu, porque o MoMA é uma instituição de topo com processos organizativos muito avançados”, explica. “A nível curatorial trouxe a ideia de criar intersecções entre arte e arquitetura e a visão de apresentar uma coleção [da EDP] não como uma exposição permanente, mas como um olhar renovado com perspetiva temática. Por isso, na Central Tejo teremos exposições com curadores internos e outros convidados, todos portugueses para já, em torno da coleção de arte.”

A programação tem um orçamento de dois milhões de euros por ano. E o número esperado de 250 mil visitantes anuais está a ser revisto, mas ainda não é oficial.

Pedro Gadanho refere que através de uma agência de comunicação o MAAT tem vindo a promover-se lá fora. António Mexia disse que “o mercado internacional é fundamental” e adiantou que estão a ser negociadas parcerias com instituições dos EUA, do Reino Unido, de França, de Itália e de Espanha, bem como portuguesas, como seja a Fundação de Serralves.

A inauguração acontece no feriado do 5 de outubro, a partir do meio-dia, com uma programação de 12 horas já noticiada pelo Observador. “Esperamos que apareçam milhares de pessoas, mas não tantas quantas as que se associaram ao evento no Facebook, umas 260 mil, isso criaria um pequeno problema logístico”, ironizou Pedro Gadanho.