Estamos, enquanto sociedade ocidental, a ser coniventes com os terroristas islâmicos? Estaremos a enfrentar a causa real do extremismo islâmico? Serão as teocracias islâmicas as verdadeiras responsáveis pelo islamismo radical? Os movimentos radicais islâmicos são idênticos aos movimentos de supremacia branca e de extrema-direita? É aceitável classificar um supremacista branco que mata 26 pessoas numa igreja do Texas de “inimputável” e descrever um islâmico que cometeu um crime idêntico de “terrorista”? Breivik, o norueguês que matou 78 pessoas, é o espelho de Bin Laden, o cérebro dos atentados de 11 de Setembro?

Esta e outra perguntas tomaram conta do debate que juntou Zuhdi Jasser, fundador e presidente da American Islamic Forum for Democracy, uma organização sediada nos Estados Unidos que pugna pela democratização dos países islâmicos, Bjørn Ihler, ativista e um dos sobreviventes do massacre de Utoya, Sasha Havlicek, diretora executiva do Instituto para o Diálogo Estratégico, moderados por Cenk Uygur, ativista e apresentador do The Young Turks, um programa norte-americano de notícias e comentário político transmitido no Youtube.

O objetivo desta mesa redonda, que decorreu à margem do evento principal do Web Summit, era discutir de que forma é que as narrativas mediáticas estão a contribuir para a construção da identidade dos grupos terroristas e para a proliferação da sua mensagem. No entanto, acabaria por transformar-se em algo muito mais complexo e controverso.

“Devemos recordar que, nos Estados Unidos, 73% dos ataques terroristas depois do 11 de Setembro foram perpetrados por grupos de extrema direita. Os extremistas, independentemente da sua religião e da sua identidade, partilham traços comuns e a ideia de superioridade de grupo. Se queremos derrotar o terrorismo temos de o tratar a causa e não segmentar o terrorismo em terrorismo islâmico e restantes”, começou por dizer Sasha Havlicek.

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“Os extremistas partilham entre si sentimentos como a necessidade de pertença e de mudar o mundo de acordo com as convicções do grupo a que pertencem. O terrorismo, todo o tipo de terrorismo, nasce da negação da diversidade”, concordaria Bjørn Ihler, ele que se tem dedicado a estudar o fenómeno do extremismo.

As diferenças entre os quatros convidados começariam precisamente aqui: o terrorismo islâmico é igual aos outros tipos de terrorismo? Zuhdi Jasser acredita que não e defendeu, em Lisboa, que essa narrativa não é mais do que uma forma de desresponsabilizar a comunidade islâmica e de proteger as teocracias islâmicas, como a Arábia Saudita e o Irão.

“A ideia de que o terrorismo islâmico é igual ou tem a mesma origem que os movimentos de supremacia racial branca é absurda. Esse tipo de narrativas só favorece os ditadores islâmicos. Estamos a negar o papel que Estados como a Árabia Saudita, o Paquistão, o Irão ou a Síria têm na promoção desses mesmo grupos terroristas. Percebam: não vamos conseguir destruir o Estado Islâmico com Assad no poder na Síria. Não vamos conseguir destruir o terrorismo sem democratizar e secularizar as sociedades islâmicas”, defendeu Zuhdi Jasser.

A afirmação do presidente da American Islamic Forum for Democracy mereceu a intervenção do moderador, que o confrontou com o facto de a sociedade ocidental, que encontra os seus pilares no Cristianismo, ter sido responsável pela morte de mais de 6 milhões de pessoas durante o Holocausto. E isso há menos de 70 anos. “Como é que pode afirmar que os muçulmanos é que são maus e que só é possível resolver o terrorismo secularizando a sociedade islâmica quando há 70 anos tivemos cristãos a assassinar mais de 6 milhões de pessoas!?”, insistiu Cenk Uygur.

Zuhdi Jasser defender-se-ia acusando o colega de painel de confundir fascismo racial com teocracias que patrocinam o terrorismo. “Com essa narrativa estamos a dar força aos regimes ditatoriais do Médio Oriente. Estamos a embalar (cudling, na expresão original) governos como o da Arábia Saudita, que é um dos grandes responsáveis pela existência de grupos terroristas”.

O presidente American Islamic Forum for Democracy criticou ainda o facto de o Ocidente e os Estados Unidos em particular de terem feito pouco para apoiar a Primavera Árabe, que, argumentou, seria o início da democratização e de abertura desses regimes. “A comunidade muçulmana ia ganhar com essa disrupção, precisava dessa disrupção. Infelizmente não foi isso que aconteceu”, rematou.

Os quatro acabariam, ainda assim, por concordar num ponto: num mundo global, onde o extremismo e o radicalismo escorre pelas redes sociais e pela Internet, a chave para combater o extremismo passa por dar ferramentas aos que se assumem como moderados. Só eles conseguirão levar a tolerância às suas comunidades.