“Uma vergonha”. Foi desta forma que os sindicatos dos professores descreveram a reunião desta sexta-feira com o Governo, na qual ouviram as propostas para a contabilização do tempo de carreira que estava congelado. Os representantes dos docentes dizem que a proposta do executivo está ferida de ilegalidade e querem que o parlamento fiscalize a ação nesta matéria.

“Se for esta a versão que é aprovada, é inconstitucional, porque há aqui ultrapassagens de toda a ordem. Conseguiram [o Governo] reconhecer isso. Há professores que nunca terão uma recuperação e há professores que serão ultrapassados. Os seis mil professores que progrediram em 2018 para o 9.º escalão vão ser ultrapassados por todos os professores que em 2019 progridam para o 9.º escalão, que vão chegar mais cedo ao 10.º. Isso é inconstitucional”, disse esta sexta-feira o secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), Mário Nogueira.

Para o líder sindical, o parlamento, “no seu papel de fiscalização do Governo, não pode deixar de suscitar a fiscalização da constitucionalidade e de não considerar legal uma lei que não respeita a lei do Orçamento do Estado” (OE) para 2018.

O sindicalista, que falava em nome da plataforma que junta dez estruturas sindicais nas negociações com o Governo para a recuperação integral do tempo de serviço congelado, que esta sexta-feira teve uma reunião de negociação suplementar no Ministério da Educação, apontou este exemplo de ultrapassagens na contagem do tempo de serviço que a proposta do executivo pode vir a permitir para defender a inconstitucionalidade do projeto de decreto-lei.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Mário Nogueira disse que a aprovação deste diploma, que apenas prevê a contagem de dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço congelado, dos mais de nove anos que os professores reivindicam e dos quais não abdicam, pode levar a que o Governo viole a lei OE para 2018, com os sindicatos a insistir que o que o orçamento prevê é apenas a negociação do prazo e modo de recuperação do tempo congelado, não a negociação do tempo a recuperar. “Estamos a negociar com um Governo que está fora da lei. Os partidos na Assembleia da República que fiscalizam a ação do Governo sabem que o Governo tem uma lei para cumprir e não cumpriu, penso que vão ter que tomar posição e fazer alguma coisa”, disse Mário Nogueira.

O líder da Fenprof dirigiu o seu discurso especialmente para os partidos de esquerda que suportam no parlamento o executivo socialista, que Mário Nogueira insistiu em sublinhar que é “um Governo minoritário”. “Iremos falar com todos, do CDS-PP até ao Bloco de Esquerda. Evidentemente que iremos confrontar […] os partidos que votaram favoravelmente o OE. […] Parece-nos a nós que a negociação que é feita com o Governo por estes partidos é uma negociação que vai fazer uma avaliação do que se fez em 2018, senão, que diabo… Ou seja: se estes partidos chegarem à conclusão que negociaram com o Governo e agora ele não cumpre, que confiança podem eles ter para negociar para 2019?”, questionou Mário Nogueira.

“Os professores sabem que nesta matéria o Governo minoritário do Partido Socialista não tem a faca e o queijo na mão. Os professores sabem que este Governo minoritário do PS pode passar o tempo a dizer que não faz parte do seu programa recuperar o tempo de serviço, mas o problema é que não tem maioria absoluta. Este Governo tem que assumir e cumprir os compromissos a que com outros chega, senão pode não poder continuar” acrescentou o sindicalista.

Mário Nogueira, mas também João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional de Educação (FNE), disseram à saída da reunião — que apenas contou com a presença da secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, em representação do Governo, que o encontro desta sexta-feira, o último deste processo negocial, foi “uma vergonha”, “um logro”, considerando o líder da FNE “inacreditável que o Governo persista inflexivelmente numa posição sem ter em linha de conta outras propostas em cima da mesa”.

Dias da Silva foi categórico: “Não negociaremos o incumprimento da lei”.

Ambos apontam agora para a próxima semana, para a qual estão previstas uma greve de quatro dias, com incidência regional em cada um deles, e uma manifestação nacional de professores a 05 de outubro, em Lisboa, contando mostrar na rua “a revolta” dos docentes. “Vamos para a rua com a confiança reforçada de que a razão está do lado dos professores”, disse Mário Nogueira.

A luta vai fazer-se também nos tribunais, reiterou Mário Nogueira, que adiantou ainda que os sindicatos vão fazer chegar uma queixa a órgãos europeus comunitários de sindicatos, pretendendo fazer o mesmo para a Organização Internacional do Trabalho.