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“Good Lord Bird”. Ethan Hawke expõe a dor americana numa das séries do ano

Este artigo tem mais de 3 anos

Depois do livro de James McBride, já se estreou na HBO a produção que leva ao pequeno ecrã a história de John Brown, o abolicionista que criou um exército e deu início a uma guerra civil.

Ethan Hawke, além de produtor e ideólogo desta adaptação, é o protagonista, no papel de John Brown. Joshua Caleb Johnson é Henry Shackleford (ou Little Onion)
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Ethan Hawke, além de produtor e ideólogo desta adaptação, é o protagonista, no papel de John Brown. Joshua Caleb Johnson é Henry Shackleford (ou Little Onion)

Ethan Hawke, além de produtor e ideólogo desta adaptação, é o protagonista, no papel de John Brown. Joshua Caleb Johnson é Henry Shackleford (ou Little Onion)

Preto e branco. Os Estados Unidos de 1850 como os de 2020. E não estamos necessariamente (ou apenas) a falar da cor da pele, mas de perspetiva. A dimensão bipolar daquele país está entranhada na sua história. E tudo isso aparece sem aviso numa das melhores séries desta reta final do ano: “Good Lord Bird”.

A minissérie de sete episódios (HBO Portugal), que se estreou no passado dia 4 de outubro, conta a história de John Brown, um abolicionista que dedicou a vida a tentar acabar com a violência do esclavagismo com, precisamente, mais violência. Outros tempos, sim, mas outros tempos em que as ações de um homem acompanhavam os passos de um país prestes a entrar em total conflito interno. “Good Lord Bird” vai além de John Brown e quer também falar do início desse conflito. E dele próprio. De como a sua incursão por Harpers Ferry, em plena demanda pela libertação dos escravos, é um ensaio da guerra civil americana.

Mas isso é a história. Há o livro, a mini-série e um Ethan Hawke que é o responsável de transformar o primeiro na segunda. À medida que envelhece, Hawke envolve-se mais e mais com os seus projetos. Não quer ser só um ator. E quando só é isso, quer ser especial, quer passar para uma patamar diferente da interpretação. É assim que o temos visto nas últimas duas décadas. Alguém que vai além nos seus projetos, seja em “Antes da Meia-Noite”, “Boyhood: Momentos de Uma Vida” ou “No Coração da Escuridão”. É a sua entrega que torna alguma das suas personagens memoráveis. É também por isso que o seu John Brown causa impacto logo nos primeiros instantes.

[o trailer de “Good Lord Bird”:]

Foi durante a rodagem do filme “Os 7 Magníficos” (filme de 2016, realizado por Antoine Fuqua) que surgiu a ideia para transformar “Good Lord Bird” em série, quando alguém diz a Ethan Hawke que ele daria um bom John Brown. O romance de James McBride estava na berra na altura (venceu o National Book Award de ficção em 2013) e Hawke pega nele e vê mais do que uma simples história sobre John Brown. É o modo como é contada e o humor que rodeia uma narrativa que consegue ser trágica, que o convence da importância de adaptar a história escrita por McBride para o pequeno ecrã. A Showtime pegou na ideia e assim nasceram estes sete episódios.

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Eis o que se passa: James McBride teve a brilhante ideia de contar a história não através de John Brown ou de um narrador ausente, mas através dos olhos de um adolescente, Henry Shackleford (Joshua Caleb Johnson), escravo, que é “salvo” por John Brown das garras do seu dono. Agora vem o twist: Brown pensa que Henry é uma rapariga e trata-o sempre como tal. Agora vem outro twist: Brown trata Henry, que entretanto ganha a alcunha de “Little Onion” como alguém que libertou, enquanto Henry se vê como um prisioneiro e Brown como o seu novo dono.

Estas perspectivas são dinamite. A história de John Brown passa a não ser só um pedaço da História norte-americana – que não é muito falada – mas também excelente entretenimento. A perspectiva de Henry/Little Onion dá outras cores ao que se passa em redor. É uma das valências do romance de James McBride que surge nesta adaptação para televisão como uma qualidade que alavanca o dinamismo da série para outro lugar. A voz de Henry proporciona uma série de leituras às acções de John Brown e cria um bom paralelismo com os Estados Unidos de hoje.

Passado e ficção juntam-se para o presente, com o espectador a pensar no ontem de “Good Lord Bird” como o hoje

William Gray/SHOWTIME

Tanto no romance como na série, é Henry que conduz os sentimentos com que acompanhamos a narrativa. A sua perspetiva diz ao espectador quando ter medo da violência, quando se deve rir. A visão bipolar da sua condição de escravo/homem-livre, dependendo do espectador, fala nas entrelinhas destes Estados Unidos bipolares, em que no meio de ações e determinações tão fortes, apoiadas em princípios fundadores e convenções de a favor ou contra, se esquece de que existe um cinzento.

“Good Lord Bird” não é esse cinzento, mas tem argumentos para que se procure essa cor no meio daquele preto e branco. Porque a violência parece tão necessária como exagerada. Tanto McBride como esta adaptação jogam com isso. Henry/Little Onion faz o resto. A sua narração conta a história de um homem, primeiramente, e depois das suas ideias e de como elas moviam as pessoas.

Henry/Little Onion não perde oportunidades para desfazer a figura de John Brown. Seja pelos seus discursos longos, intermináveis e sem sentido ou pelos homens que se juntam ao seu exército, sem qualquer fio condutor, a maioria fracos de corpo e de espírito (e que fogem com o rabo à seringa, assim que veem a dita seringa à distância). A vida e a história de John Brown não têm humor, mas as palavras do narrador constroem isso e criam um laço entre o leitor/espectador com a figura de John Brown.

As ideias deste abolicionista moviam pessoas. Por vezes a bem, por vezes à força. Os seus atos violentos foram um mal necessário e hoje olha-se para eles sabendo como aconteceu a história. São esses mesmos atos que, quando expostos através dos olhos de Henry/Little Onion e da sua existência dupla, quando ele fala de um homem que arrastou outros homens com uma ideia, podem deixar o espectador a pensar no ontem de “Good Lord Bird” como o hoje. Passado e ficção juntam-se para o presente, numa das grandes séries da reta final de 2020. Não, do ano.

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