Não é um épico, porque nunca o poderia ser; não é sequer uma tragédia tout court, que pintasse o lado negro de uma cidade – Paris, a cidade-luz – que, aqui nunca reconhecemos. Não há grandiloquência alguma porque a recusa desde o primeiro instante; “Vernon Subutex” é um requiem indie, shoegaze, se existe tal coisa; uma noitada que começa e acaba em ressaca e tem ocasionais momentos de felicidade plena – crowd surfing. É o epitáfio aos anos 90, mortos pelo tempo, pela net, pelo inevitável fracasso da grande ilusão da geração sem ilusões. Afinal, não ter ideal algum não nos salvou de envelhecer tão dececionados e dececionantes como os idealistas.
Virginie Despentes foi nomeada ao Man Booker International pela trilogia dos romances originais (em Portugal, a edição é da Elsinore), o Canal + adaptou à televisão francesa em 2019 e chega agora a Portugal pela mão criteriosa da Filmin. “Vernon Subutex” centra-se mais na personagem que lhe dá nome e menos na galeria de cromos que formam a genial caderneta que Despentes colecionou de um tempo e de uma geração: os dela, quarentões de t-shirt de banda rock, drogas ainda no bolso das calças de ganga e uma recusa, fatal, mas sem dramatismo, em crescer. Persiste, na versão televisiva, o pecado original do subplot vagamente policial que une os nove episódios da primeira temporada – e até ver, única. Mas há pelo menos uma geração que não pode perder esta série. Além de que confirma o que já todos suspeitávamos: as boas séries fazem-se hoje em muitos lugares e em muitas línguas para lá do inglês. Abençoado sejas, streaming nosso senhor.
“Vernon Subutex”. Os maiores medos do nosso tempo estão na trilogia de Virgine Despentes
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