O presidente da Câmara de Lisboa afirmou esta terça-feira que defendeu o adiamento da descentralização numa carta enviada ao primeiro-ministro porque as verbas que acompanham a transferência de competências, sobretudo nas áreas da saúde e educação, são insuficientes.

Os presidentes das câmaras de Lisboa, Carlos Moedas, e do Porto, Rui Moreira, enviaram uma carta ao primeiro-ministro, António Costa, apelando para que seja prorrogado o prazo para a transferência de competências nas áreas da educação e saúde, que devem passar definitivamente para os municípios no próximo dia 1 de abril, como já aconteceu com a ação social, que os municípios podem assumir até ao final deste ano.

Em declarações à Lusa à margem de uma cerimónia em Lisboa, Carlos Moedas esclareceu que no seu caso o problema é sobretudo com a área da saúde, salientando que não está em causa o exercício das competências em si, mas a falta de recursos financeiros que as acompanham.

“O primeiro ponto realmente que é claro é que aqui não é uma questão de não querer ter esses poderes. Esses poderes podem estar connosco, mas precisamos dos recursos e, portanto, não podemos pensar numa descentralização que seja uma “tarefização”. Ou seja, não é: “Faz esta tarefa, faz aquela tarefa”. Não. Temos que ter essa responsabilidade, temos de ter os recursos”, disse, defendendo que “o orçamento tem que vir do Estado para as câmaras” poderem executar.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“É sobretudo na saúde, que era a nova [área a descentralizar], que a educação já temos e já sabemos os problemas que temos”, afirmou.

Segundo Carlos Moedas, numa altura em que se espera um novo Governo, a carta trata de pedir “um tempo para discutir exatamente” com o executivo quais os montantes que deverão ser transferidos pela administração central e que permitirão às câmaras assumir todas as competências no âmbito do processo de descentralização.

Na carta enviada a António Costa em 7 de março, a que a Lusa teve acesso, os dois autarcas afirmam “que o prazo de transferência de competências nas áreas da saúde e da educação, à semelhança do que aconteceu na ação social, terá, necessariamente, de ser prorrogado”.

Moreira e Moedas pedem adiamento da transferência de competências em educação e saúde

Destacando que o atual modelo de descentralização de competências tem revelado desde o início “inúmeras dificuldades e inconsistências”, os dois autarcas afirmam que o calendário estabelecido “pela sua estreiteza” e “atraso na publicação de diplomas setoriais” não permitiu uma “reflexão cuidada” nem a “devida adaptação e preparação” dos serviços para as novas competências.

“Trata-se de um modelo excessivamente rígido que não atende às específicas necessidades, dimensões e estruturas de organização dos diferentes municípios”, lê-se na missiva, na qual os autarcas destacam que os municípios não foram devidamente envolvidos no processo.

Esta terça-feira, em Coimbra, a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública considerou que a transferência de competências na educação não justifica um adiamento e explicou que na saúde “a transferência efetiva” só se dará quando os autos com os municípios forem assinados.

“No caso da educação, a transferência [de competências para os municípios] resulta por efeito da lei e, pelas informações que tenho sobre a forma como o processo decorre, não creio que haja justificação para o adiamento“, afirmou Alexandra Leitão.

No caso da saúde, apesar de a data-limite ser 31 de março, terá de “haver a celebração de autos de transferência” entre municípios e administração central para a transferência se efetivar, acrescentou.

“A transferência ocorre nos termos da lei. Porém, a transferência efetiva só ocorre quando o auto é celebrado, o que significa que todos aqueles assuntos que ainda estão por resolver entre cada um dos municípios e a saúde são resolvidos no auto. Enquanto isso ainda não estiver resolvido — ou seja, enquanto o auto não for celebrado — a transferência não ocorre efetivamente“, explicou.

Questionada sobre se há um limite temporal para que esses autos sejam assinados no contexto da transferência de competências na saúde, Alexandra Leitão referiu que não foi posta “nenhuma fasquia temporal“.

O processo de transferência de competências em mais de 20 áreas da Administração Central para os municípios decorre desde 2019.

A transferência definitiva e obrigatória de competências nas áreas da Educação, Saúde e Ação Social para os municípios estava prevista acontecer a partir de 1 de abril de 2022, após vários adiamentos, devido ao atraso na publicação de alguns diplomas setoriais, nomeadamente naquelas três áreas, mais complexas e que envolvem também a transferência de montantes financeiros do Estado para os municípios

Em 3 de fevereiro, o Governo aprovou a possibilidade de os municípios requererem a prorrogação até 1 de janeiro de 2023 do prazo para a concretização da transferência de competências na área da ação social, mantendo o dia 1 de abril para a efetivação das competências de educação e saúde.