Em abril de 2021, a Câmara Municipal do Porto e o Ministério da Cultura anunciaram que pretendiam assumir o custo em partes iguais das obras de reabilitação do Coliseu do Porto, avaliadas em 3,5 milhões de euros, suspendendo, assim, o modelo de concessão, no entanto, um ano depois, o cenário mudou. Esta sexta-feira, a direção da Associação Amigos do Coliseu (AAC) aprovou por unanimidade a entrega da sala de espetáculos a privados e o autarca, Rui Moreira, admite ser uma “solução definitiva”.
“Ninguém vai acabar com a marca Coliseu, ela vai continuar, o que não vai é ser um coliseu a cair. Não vou deixar é que o Coliseu desapareça”, começou por garantir, sublinhando que “já não existe” diversidade nem serviço público naquele equipamento cultural. “Há uma associação que lá desenvolve atividades e depois no resto do tempo o Coliseu é, e bem uma, barriga de aluguer. Aquilo que defendo é que a associação pode continuar a desempenhar as tarefas que sempre desempenhou, mas dentro de um edifico que é gerido pelas tais empresas que hoje contratam o Coliseu como barriga de aluguer.”
Para Rui Moreira esta não é uma mudança de intenções, mas sim um regresso ao plano “original”. “Alguma coisa tem de ser feita. Durante o período da pandemia seria impossível lançar uma concessão do Coliseu, era um suicídio de gestão.” O independente recusa ainda a ideia anunciada pelo ministério há um ano de a reabilitação da sala ser feita com fundos comunitários e, um ano depois, terá cansado de esperar. “Não havendo fundos, e tentou-se, não temos outra solução se não entregar a concessão a privados. Acabou de ser aprovada pela direção por unanimidade, é uma solução definitiva.”
CDU/Porto quer que representante da câmara se “empenhe” na reabilitação do Coliseu
Segundo o jornal Público, o autarca do Porto conta com o apoio do ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, do presidente da Área Metropolitana do Porto, Eduardo Vítor Rodrigues, e do provedor da Misericórdia do Porto e representante dos sócios institucionais na direção, António Tavares. Moreira alertou ainda que a solução encontrada para o futuro da sala poderia ser diferente caso o Coliseu integrasse na lista de investimentos culturais do Plano de Recuperação e Resiliência.
“Se consultarem a lista do PRR, tem lá uma lista de edifícios com 150 milhões inscritos pelo Governo e se verificarem não encontram o Coliseu, no Porto encontramos apenas o Museu Soares dos Reis”, afirmou, acrescentando com certeza que “o Coliseu vai fechar para obras”. “Quem vai fazer a obra? Serão os privados, se houver alguém interessado na concessão.”
A direção da AAC — associação que gere o equipamento depois do protesto que em 1995 impediu a venda do edifício à Igreja Universal do Reino de Deus — é composta por Mónica Guerreiro, presidente do Coliseu do Porto e representante do Ministério da Cultura, Maria João Castro, representante da Área Metropolitana do Porto (AMP), Nuno Lemos, representante da Câmara Municipal do Porto, Daniel Pires, representante dos Associados Individuais da Associação Amigos do Coliseu e António Tavares, provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, e esta sexta-feira aprovou por unanimidade a retoma do modelo de concessão à boleia de uma proposta apresentada pelo representante da autarquia, onde se pode ler: “Proponho que, tal como decidido a 13 de março de 2020, a direção inicie o procedimento de tramitação, permitindo lançar um concurso público com vista à concessão do Coliseu do Porto, tendo como objetivo principal a reabilitação, requalificação e exploração do equipamento.”
A concessão do Coliseu do Porto a privados foi aprovada por maioria na Assembleia Geral da AAC em 2020 pela impossibilidade de recorrer a fundos comunitários para garantir o restauro daquela sala de espetáculos. O presidente da Câmara do Porto afirmou, na época, que o município não tinha “nem enquadramento legal, nem vontade política” para reabilitar o Coliseu, frisando que o Estado perdeu oportunidade de o fazer através do Plano de Recuperação e Resiliência.
Presidente do Coliseu fala em “previsibilidade” e rejeita críticas de Rui Moreira
Quando Mónica Guerreiro chegou à presidência da direção do Coliseu do Porto, em março de 2020, o modelo de concessão tinha sido aprovado com poder vinculativo, mas o compromisso entre a autarquia e o ministério da Cultura, em abril de 2021, fizeram prever que o desfecho seria outro. Esta sexta-feira regressou-se à intenção inicial, a discussão instalou-se, mas não apanhou a presidente de surpresa.
“A minha reação é de absoluta previsibilidade em relação aquilo que se vinha desenhando nos contornos deste processo. É evidente que passado o período pandémico, outras soluções podem vir a ser equacionadas, incluindo uma solução possível de a própria AAC continuar a fazer uma gestão direta do Coliseu, mas os estatutos também preveem que a associação pode fazer uma gestão indireta, não extinguido a sua missão. A AAC pode encontrar formatos de gestão indireta para algumas das suas valências e aparentemente é isso que está em cima da mesa.”
Ao Observador, a presidente da direção do Coliseu do Porto admite que poderia existir outras soluções e sublinha que o importante é que a AAC “não deixe de ter o seu papel” e que trabalhe “de mãos dadas” com um futuro concessionário. “Poderia haver vários desfechos, mas há este e está tudo bem, desde que este não seja o caminho para extinguir a associação.”
Confrontada sobre as declarações de Rui Moreira que afirmou “já não existir” diversidade de programação e serviço público no Coliseu do Porto, Mónica Guerreiro diz não entender a crítica. “Isso é desatenção certamente. Basta frequentar o Coliseu ou ver o nosso site para ver a enorme variedade e diversidade de estilos de todas as disciplinas artísticas. Tenho alguma dificuldade em responder a isso, deve ser desatenção do Sr. Presidente, com certeza.”
A responsável defende ainda que a concessão da sala não coloca em causa a continuidade do trabalho que tem sido desenvolvido e revela que após o seu mandato, que termina em 2023, gostaria de continuar a contribuir para o futuro do equipamento cultural da cidade.
As obras, tal como informou a presidente da direção do Coliseu, Mónica Guerreiro, deverão demorar cerca de oito meses, estando ainda por determinar o tempo que o Coliseu estará fechado. A responsável revelou que as intervenções previstas vão incidir essencialmente na fachada, cobertura e torre e assegurou que os trabalhos não arrancam este ano porque ainda são necessários estudos técnicos e projetos de execução.
Ministro da Cultura: “Opção feita sem nenhum preconceito”
Já ministro da Cultura afirmou que “apoia” a concessão do Coliseu do Porto a privados e que a opção é feita “sem nenhum preconceito” quanto ao modelo de gestão e financiamento da reabilitação. “O Ministério da Cultura apoia a decisão e proposta da Câmara do Porto”, disse Pedro Adão e Silva à agência Lusa.
“As autarquias são a instância mais bem posicionada para tomar posições sobre estas matérias e fazer escolhas”, reforçou. “Essa opção é feita sem nenhum preconceito, nem em relação ao modelo de gestão, nem em relação à forma de financiar o imóvel. E, aliás, é uma posição que está conforme e alinhada com aquilo que continua a ser a decisão em vigor tomada pela Assembleia Geral da Associação Amigos do Coliseu do Porto”, afirmou.
Sobre a preservação do interesse público, o ministro defende que é “compatível e compaginável” com a concessão a entidades privadas e com a garantia de que a associação Amigos do Coliseu vai continuar a ter “um papel” na programação da sala de espetáculos que, diz, “tem um papel e lugar fundamental na vida cultural do concelho do Porto”.