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A arte contemporânea de Gulbenkian e o gosto Déco

Este artigo tem mais de 1 ano

No nono episódio do podcast Only the Best, vamos conhecer o papel da arte moderna no seio da coleção Gulbenkian e a importância da National Gallery of Art de Washington no processo da sua descoberta.

No regresso a mais uma viagem na vida de Calouste Sarkis Gulbenkian, e à boleia do podcast Only the Best, uma parceria entre o Museu Calouste Gulbenkian e a Rádio Observador, que vai para o ar a cada quinze dias, com o historiador Rui Ramos como anfitrião, e secundado por João Carvalho Dias, diretor-adjunto do referido museu, vamos refletir sobre a paixão do filantropo arménio sobre a arte Déco, sua contemporânea, assim como entender o papel da National Gallery of Art de Washington para o destino da sua coleção.

E, se no episódio anterior “falámos do interesse de Calouste Gulbenkian pela arte do século XVIII, da pintura ao mobiliário, passando pela ourivesaria”, não podemos esquecer que o arménio “foi também, em termos de gosto, um homem do seu tempo”, refere Rui Ramos, lembrando ainda que o facto de que “tinha vinte anos em 1889, ano da grande Exposição Universal de Paris e quando foi construída a Torre Eiffel”.

Além disso, continua o anfitrião do podcast Only the Best, Calouste “viveu em Inglaterra e França durante a chamada Belle Époque, antes da I Guerra Mundial, no tempo da Art Nouveau em arquitetura e nas artes aplicadas, quando o impressionismo em pintura, que vinha da década de 1870, foi aceite e se tornou popular; quando Picasso começou a lançar o cubismo com o quadro Les Demoiselles d´Avignon, de 1907”, ou seja, “quando os artistas se atreveram a pôr em causa os cânones clássicos até aí em vigor nas academias”.

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Perante isso, surgem algumas questões: “As artes e os estilos do seu tempo interessaram Gulbenkian? Que traços existem de tudo isso na coleção? Ou, seria verdade que Gulbenkian achava que faltava à pintura do seu tempo o sentido da beleza clássica?”, enumera Rui Ramos

“A Coleção responde a todas as suas questões”, avança João Carvalho Dias, pois “todos os tempos convivem com diversas formas de arte, umas que podemos considerar mais experimentais (outrora já chamadas de vanguarda), outras mais populares, e ainda outras mais académicas”.

Até perante isso, “diria que a Art Déco, sobretudo as suas múltiplas expressões ocorridas depois da Exposição internacional das artes decorativas e industriais modernas (Arts décoratifs et industriels modernes), realizada em 1925, tiveram grande impacto em Gulbenkian”, considera o diretor-adjunto do Museu Calouste Gulbenkian, adiantando ainda que “a casa da avenue d’Iéna, em Paris, beneficiou do contributo de René Lalique na conceção do espaço da casa de banho; de peças de mobiliário e ferroneries por Edgar Brandt. Os interesses de Gulbenkian incluem desenhos de Jouve; lacas de Dunand; esculturas de Janniot e Joseph Bernard; livros de François-Louis Schmied, com ilustrações de Barbier; joias Cartier, Chaumet, Van Cleef and Arpels”, enumera.

Ainda com foco na Art Déco, João Carvalho Dias, sublinha que essa expressão artística “beneficiava de múltiplas referências do passado, atualizando-as do ponto de vista formal”, uma vez que “podemos encontrar paralelos entre o gosto requintado do século XVIII, a citação do “Clássico” e o fascínio pelo “mecânico” e o gosto Déco”.

Já na pintura, “Gulbenkian não encontrou esses referentes, não se interessando por Marie Laurencin, Raoul Dufy ou Fernand Léger”, ainda que, “tenha estado atento aos impressionistas, alguns deles foram seus contemporâneos: Degas morre em 1917, Renoir em 1919 e Monet em 1929”, refere o especialista.

Impressionismo além do Atlântico

Essa atenção à arte enquanto veículo de expressão idealista, ou o mero interesse enquanto colecionador, fez também com que Gulbenkian comprasse quadros de

de Edgar Degas, Claude Monet ou Pierre-Auguste Renoir”, lembra Rui Ramos, mas uma das “obras de referência da coleção, As Bolas de Sabão, uma pintura a óleo sobre tela de Édouard Manet, datada de 1867”, foi “uma aquisição tardia, de 1943, a conselho de Kenneth Clark”, historiador britânico e diretor da National Gallery londrina.

Fotografias: Catarina Gomes Ferreira

Terá nascido essa compra, da “ideia de criar um núcleo mais contemporâneo na coleção, isto é, de tornar a coleção representativa?”, pergunta o anfitrião do podcast Only the Best.

“Quando Kenneth Clark se insinua a Gulbenkian, e de alguma forma faz-se “convidado” a ver a sua coleção, refere amigos comuns como Chester Beatty e Arthur Upham Pope”, começa por responder João Carvalho Dias. “A excelente apreciação de Clark em relação à coleção leva Gulbenkian a fazer o empréstimo das suas melhores pinturas à National Gallery de Londres, em 1936″. Gulbenkian “entre 1936 e 1945, o fim da Guerra, mostra-se disponível para adquirir obras de Gauguin e de Puvis de Chavannes, que agradavam a Kenneth Clark”, acrescenta.

Entretanto, “Calouste enviava para a National Gallery as pinturas que ia adquirindo, entre as quais, se encontra As Bolas de Sabão, de Manet, que assim se juntava a outra pintura do mesmo artista, no caso O Rapaz das Cerejas”, adquirida em 1910. A referida obra “era proveniente da coleção Adolf Lewisohn – banqueiro, ligado à mineração do cobre, colecionador e filantropo, de origem alemã, falecido em 1938”.

Mas seria “em 1943, que surgiu a oportunidade de comprar o referido quadro ao filho, Sam Lewisohn, com mediação de André Weil”, explica o diretor-adjunto do Museu Calouste Gulbenkian. “A negociação começou em 150 mil dólares, descendo posteriormente para 90 mil, valor que Gulbenkian considerava excessivo, acabando por fechar a negócio por 65 mil, com a aprovação de Kenneth Clark e também de George Davey, da Knoedler & Co., tornando-se proprietário de uma das mais importantes pinturas de Manet”, salienta Carvalho Dias.

Estes quadros, “que passaram pela National Gallery, em Londres, iriam, depois da II Guerra Mundial, a partir de 1945, atravessar o Atlântico e ser a base da colaboração de Gulbenkian com outro grande museu internacional, a National Gallery of Art, em Washington, nos EUA”, contextualiza Rui Ramos. “Como surgiu essa cooperação? E, mais uma vez, sabe-se se esteve associada à ideia de criar um espaço para mostrar toda a coleção?”, questiona.

“Este episódio foi designado pelos americanos como ‘Gulbenkian Affair’”, assinala João Carvalho Dias, “mais concretamente por Herman Baruch, médico e embaixador dos EUA em Lisboa, entre 1945-1947”. Refira-se que “Gulbenkian conheceu o Dr. Baruch antes de conhecer John Walker, o conservador principal (chief curator) da National Gallery of Art de Washington”.

Em 1947, “Baruch assumiu um novo posto em Haia, sucedendo-lhe em Lisboa, John Wiley, um velho amigo de Walker”, continua o diretor-adjunto do Museu Calouste Gulbenkian. “Na embaixada estava também Theodore Xantraky, conselheiro entre 1944 e 1964, que havia servido os interesses americanos no Rio de Janeiro,  falava português e tinha estado envolvido em negociações com Salazar sobre a presença de forças militares americanas nos Açores, a adesão à NATO e a aplicação do Plano Marshall a Portugal”.

É sob este “pano de fundo que John Walker faz chegar à embaixada em Lisboa um filme a cores sobre a National Gallery of Art, que era então um museu relativamente recente (inaugurado pelo presidente Roosevelt, em 1937). Em julho de 1947, Walker chegou a Lisboa, a convite de Gulbenkian para iniciar conversações, que iriam conduzir a empréstimos de longa duração. Primeiro, a coleção egípcia em 1948, seguindo-se, em 1950, o núcleo de pintura, que se encontrava anteriormente à guarda da National Gallery de Londres”, afirma Carvalho Dias.

Alfred-Auguste Janniot, A Primavera: Homenagem a Jean Goujon Fotografia: Carlos Azevedo

René Lalique, uma referência

Uma vez que o episódio de hoje é dedicado à “arte contemporânea de Gulbenkian e o que colecionou”, faz sentido “falar de um artista seu contemporâneo, e por quem Gulbenkian parece mostrar uma particular preferência. Refiro-me ao grande joalheiro francês René Lalique, que nasceu em 1860 e morreu em 1945, e que é autor de joias com um estilo inconfundível, extremamente inovador”, sublinha Rui Ramos, além de ter sido, “amigo pessoal de Gulbenkian ao longo de 50 anos, tendo o arménio lhe comprado diretamente dezenas de joias”. Mas o que é que este gosto e esta relação dizem sobre Gulbenkian enquanto colecionador?

“Dizem que Gulbenkian também soube arriscar”, começa por responder João Carvalho Dias, e que “começou a adquirir obras de Lalique, em finais do século XIX, quando este ainda não era um artista conhecido. No entanto, a sua notoriedade chegaria cedo e quando da Exposição Universal de 1900, em Paris”.

Por outro lado, continua o diretor-adjunto do Museu Calouste Gulbenkian, “os anos da Arte Nova enquadram o gosto de Gulbenkian pela representação feminina, pela natureza, pela combinação de materiais inusitados, ouro, vidro, esmaltes, pedras preciosas e semipreciosas, verdadeiros criadores de ‘efeito’”. Também por isso, “as joias e os vidros que Gulbenkian adquiriu a Lalique são objetos únicos, longe dos múltiplos que o artista viria a conceber em vidro, a partir da década de 1920. No fundo, Gulbenkian admirava o talento de Lalique conservando na sua coleção os magníficos desenhos preparatórios para joias, com notas autografadas pelo artista, indicações preciosas sobre a sua execução”.

Para ver algumas dessas peças e as obras impressionistas referidas no episódio de hoje no Museu Calouste Gulbenkian, em Lisboa, “aconselha-se uma incursão ao átrio do museu, espaço onde encontramos o grupo escultórico de Janniot, A Primavera ou Homenagem a Jean Goujon, ao gosto Déco”, refere Carvalho Dias. “A sala reservada à pintura e escultura do século XIX, reúne a coleção de pintura impressionista, enquanto a coleção de obras de René Lalique, única no mundo, encontra-se reunida na última sala do Museu”.

Terminada mais uma viagem, “hoje dedicada à arte contemporânea de Gulbenkian, resta despedir-nos até daqui a quinze dias, altura em que sairemos da Europa, do mundo mediterrânico e da Ásia central, para saber o que atraiu o colecionador Gulbenkian em mundos mais distantes”, promete Rui Ramos.

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