A proposta de criação de uma Área Marinha Protegida no mar de Cascais, Sintra e Mafra poderá estar pronta dentro de 12 a 18 meses, disse Emanuel Gonçalves, responsável científico de uma expedição na região que terminou esta quarta-feira.

A criação de uma Área Marinha Protegida de Iniciativa Comunitária (AMPIC) é uma proposta dos três municípios que, com o apoio da Fundação Oceano Azul e de diversas instituições, deu agora o primeiro passo, através de uma expedição científica, que neste dia terminou.

A bordo do veleiro Santa Maria Manuela, um antigo bacalhoeiro pertença do grupo empresarial Jerónimo Martins, e com apoio de vários pequenos barcos, incluindo de pescadores, uma equipa que juntou 150 pessoas, incluindo muitos cientistas, terminou hoje uma expedição destinada a conhecer o mar da região.

Emanuel Gonçalves, da Fundação Oceano Azul, liderou os 12 dias da expedição e disse agora que o relatório científico da expedição deverá estar pronto no final deste ano, contendo um conjunto de recomendações científicas para dar suporte a um outro processo, participativo, que vai começar a ser estruturado pelos três municípios.

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Estão previstos estudos em continuidade “para que dentro de um ano, ano e meio, haja uma proposta a entregar ao Governo, já com todos os elementos necessários para a criação de uma Área Marinha Protegida”.

Ainda a bordo do Santa Maria Manuela o responsável explicou que a área em questão, apesar de tão próxima da capital do país, é ainda pouco conhecida, sendo um dos objetivos da expedição “compilar informação“, que é o princípio de um trabalho que vai apoiar as medidas de proteção da região que venham a ser adotadas.

E se o trabalho ainda não acabou, apenas ficou finalizado o “trabalho de campo”, Emanuel Gonçalves já adiantou que, como mostravam os indícios, há “valores naturais importantes”, como a montanha de Camões, uma zona que “poucas pessoas sabem que existe”, com florestas submarinas, com peixes como lírios ou atuns, ou como a zona do Cabo da Roca, com jardins de corais, ou ainda como a zona da Ericeira, “com plataformas rochosas de interesse do ponto de vista da biodiversidade”.

O responsável destaca ainda, mesmo junto a Cascais, ambientes construídos por animais, como recifes na areia, obra das poliquetas, uma espécie de minhocas, que depois atraem outra fauna e que são “espécies com interesse para conservação“.

Sobre a expedição que terminou Emanuel Gonçalves disse que compilando todo o conhecimento vai poder mostrar-se que toda a zona é extremamente importante do ponto de vista da biodiversidade, do ponto de vista da conservação, mas e também muito importante para a valorização das atividades económicas.

“Para ter uma pesca mais sustentável temos de ter mais peixe o mar, e para isso as medidas de conservação servem para ajudar que essa pequena pesca possa ter futuro”, afirmou, destacando que a atividade turística, ou a observação de aves e de cetáceos, é cada vez mais procurada.

Tratando-se de uma região junto de uma zona densamente povoada os investigadores detetaram nestes 12 dias “indícios” dessa pressão humana, salientando que também por isso é importante proteger. Nesse sentido, Emanuel Gonçalves destacou, também o facto de terem sido os municípios a tomar a iniciativa, a liderar o processo. “A Fundação Oceano Azul acredita que é o caminho certo para que depois os projetos fiquem para o futuro“, diz.

“Não acreditamos que publicar um decreto sobre uma área marinha seja proteger o oceanos, isso é a parte, muitas vezes, fácil, e de facto a maior parte das áreas (protegidas) à escala global estão muitas vezes no papel”, disse, acrescentando que neste caso tudo começa com uma estruturação científica, passando depois por um processo participativo, uma proposta legislativa e a implementação, incluindo uma gestão participada, financiamento e fiscalização.

Este, disse, para as zonas costeiras, “é o caminho certo” e pode ser um “exemplo significativo”, dado por Portugal e que pode ser replicado à escala global.

Este trabalho conjunto dos municípios “não é habitual”, garante, destacando também o envolvimento das associações piscatórias, elas igualmente envolvidas na pesquisa dos últimos 12 dias.

Emanuel Gonçalves assegurou que a Fundação Oceano Azul “estará presente” noutros processos idênticos, caso para isso seja chamada, e o mesmo disse, em declarações à Lusa, o administrador executivo da Fundação Oceano Azul, Tiago Pitta e Cunha, lembrando que em cinco anos de existência a Fundação já esteve envolvida em três processos de Áreas Marinhas Protegidas, nas ilhas Selvagens (Madeira), no Algarve (Câmaras de Silves, Lagoa e Albufeira) e nos Açores.

O que está agora em causa é parecido com o que aconteceu para a AMPIC do Recife do Algarve: a Câmara de Sintra deu o primeiro passo, as de Cascais e Mafra juntaram-se, as três procuraram a Fundação para ajudar a desenvolver uma AMPIC entre Ericeira e Cascais, explicou.

A primeira ação foi concluída hoje, uma expedição ao mar das três autarquias para colher informação de base científica.

Para Tiago Pitta e Cunha, “o bom” é que começa a haver um conjunto de “boas práticas” que se podem aplicar a outros projetos e replicadas noutras regiões da zona costeira.

“Preservar o mar vai contribuir para recuperar os territórios, para os valorizar e qualificar”, defendeu.

Otimista, Tiago Pitta e Cunha afirmou que na região dos três municípios há locais que se justifica proteger, pela segurança alimentar, pelo ambiente e pelo futuro. E aplaudiu a iniciativa das autarquias, que tem o apoio da Fundação e de outras instituições científicas e também do Governo.

“Não é comum isto”, salientou, acrescentando que está a surgir um modelo “que não tem precedentes na Europa, que é criar de baixo para cima estes projetos de criação de AMPI”.