João Carreira foi condenado a dois anos e nove meses de prisão efetiva apenas pelo crime de detenção de arma proibida. O tribunal decidiu esta segunda-feira não condenar o jovem de 19 anos que terá planeado um ataque à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa em fevereiro deste ano pelo crime de treino de terrorismo, nem de terrorismo na forma tentada. João, que esteve presente na leitura da sentença, vai cumprir a pena de prisão num estabelecimento com acompanhamento psicológico adequado. O tribunal decidiu não aplicar pena suspensa — comum a condenações até cinco anos a arguidos sem antecedentes criminais –, uma vez que considera que o jovem “não está pronto para se reintegrar na sociedade”, nem está a sociedade pronta para o reintegrar.

Tal como aconteceu durante as sessões de julgamento, a família do jovem esteve presente e, esta segunda-feira, também o irmão de João Carreira, que estuda fora de Portugal, ouviu a leitura da sentença.

Nas alegações finais deste julgamento, que decorreram no mês passado, o Ministério Público pediu a que o jovem fosse condenado pelo crime de treino de terrorismo e de detenção de arma proibida, com uma pena de prisão efetiva “não inferior a três anos e meio, em estabelecimento com acompanhamento psiquiátrico adequado”. No entanto, o tribunal entendeu agora que o jovem não pertence a uma organização — pretendia atuar sozinho — e, além disso, não existia neste caso a ideia de repetir o ataque, uma vez que a ideia de João Carreira seria cometer suicídio depois do ataque. Uma vez que “não integra o conceito de terrorismo, fica também afastado o crime de treino de terrorismo”.

“Temos alguém que pretendia suicidar-se, ou ser morto, que anuncia, antes de levar a cabo qualquer ato, que o ia fazer, de tal forma que chegou a ser identificado pelas autoridades policiais. E não está demonstrado que está ligado a qualquer grupo de pessoas que quisessem praticar atos idênticos”, avançou o juiz Nuno Costa.

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“Pretendia matar pessoas, mas o objetivo do arguido era causar o pânico”

O Ministério Público não tem qualquer dúvida de que o arguido praticou um crime de terrorismo”, disse a procuradora do MP Ana Pais. “O que ele pretendia era ser considerado um assassino em massa e ter os cinco minutos de fama. Ele pretendia matar pessoas, mas o objetivo do arguido era causar o pânico, era ficar famoso, era ser conhecido depois de praticar este ato”, acrescentou.

Durante as sessões de julgamento, em que foram ouvidas várias testemunhas, incluindo os inspetores da Polícia Judiciária que acompanharam o caso desde que receberam as informações do FBI sobre o alegado ataque que João Carreira estaria a preparar. Destacaram-se então as palavras de Bruno Trancas, perito da PJ, que explicou que o jovem de 19 anos “estava afeto de uma perturbação depressiva, que influencia as escolhas, mas esta não era de tal forma grave que o impedisse de agir de outra forma”.

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Já diagnosticado com síndrome do espetro do autismo, João Carreira sofria de depressão na altura em que estaria a preparar o ataque à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. No entanto, adiantou também o perito da PJ, estas perturbações “não lhe toldavam uma distorção daquilo que era certo ou errado”.

Ataque estaria marcado para o dia 11 de fevereiro

Logo na primeira sessão deste julgamento, João foi ouvido e descreveu o seu plano: “levar as armas para a faculdade, depois ir à casa de banho preparar-me e depois fazer o ataque durante cinco minutos”. Como? “Talvez entrar no auditório, atirar cocktails molotov, atirar setas, esfaquear pessoas”, explicou ao coletivo de juízes.

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No entanto, o seu discurso foi variando entre a vontade que, alegadamente, teria para fazer o ataque e a falta de coragem. Aliás, o jovem adiou o seu plano quatro vezes, sendo a última data o dia 11 de fevereiro. “Sinto que era péssima a minha ideia, porque moralmente é errado matar uma pessoa”, disse. João acabou por ser detido antes do dia que tinha marcado para fazer o ataque na faculdade e ficou logo em prisão preventiva. Em maio, as medidas de coação foram alteradas e o o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu internar preventivamente o jovem no Hospital Prisional de Caxias.