Um total de 48 dos 51 arguidos num processo de uma alegada rede que contratava imigrantes para a agricultura no Alentejo vão ser julgados, embora tenham “caído” crimes de tráfico de pessoas que envolviam vítimas timorenses.
De acordo com a decisão instrutória do processo, datada desta terça-feira e consultada esta quarta-feira pela agência Lusa, a juíza Helena Marques Bellas determinou que vão a julgamento, em tribunal coletivo, quase todos os 51 arguidos que estavam acusados.
Só não foram pronunciados três dos arguidos, todos homens e de nacionalidade portuguesa, que o Ministério Público (MP) acusava do crime de associação criminosa e da prática de 35 crimes de tráfico de seres humanos, relativos a vítimas timorenses.
A acusação do MP, igualmente consultada pela Lusa, entendia que estes três portugueses eram “funcionários e encarregados das explorações agrícolas” e “responsáveis por arranjar locais de trabalho para os ‘trabalhadores/vítimas’ explorados”.
Contudo, na decisão após o debate instrutório do processo, realizado nas instalações do Tribunal de Beja, a juíza do Juízo de Competência Genérica de Cuba decidiu não os pronunciar.
Mas, segundo a decisão instrutória, com exceção destes, os outros 48 arguidos vão ser julgados, “em coautoria material e concurso efetivo, pela prática de um crime de associação criminosa”.
Por tráfico de pessoas, a juíza decidiu que vão ser julgados por 20 crimes cinco arguidos e uma empresa, por oito crimes quatro arguidos e por sete crimes oito arguidos.
Trinta e quatro arguidos vão responder por um crime de branqueamento de capitais, cinco por crimes de detenção de arma proibida e um por um crime de tráfico de estupefacientes, pode ler-se na decisão instrutória.
A juíza decidiu não pronunciar todos os arguidos da prática de 20 dos crimes de tráfico de seres humanos, ou seja, ‘caíram’ os relativos às vítimas timorenses.
Também não foram pronunciados 28 arguidos — dos quais 20 pessoas e oito empresas — de 35 crimes de tráfico de seres humanos, igualmente relativos às vítimas de nacionalidade timorense, e 16 arguidos pela prática de um crime de branqueamento de capitais.
A decisão alude que, “pese embora a acusação faça referência à existência de, pelo menos, 55 vítimas, certo é que apenas surgem devidamente concretizadas e identificadas 35 pessoas”, pois, “20 dos 31 cidadãos timorenses” que residiam num monte em Cuba (Beja) “não foram localizados e identificados”.
Contactado pela Lusa, Pedro Pestana, advogado de seis dos arguidos no processo, revelou que pretende recorrer desta decisão instrutória para o Tribunal da Relação de Évora.
“Mas foi uma vitória para a defesa fazer cair muitos dos crimes de que todos os arguidos vinham acusados, pese embora não tenhamos tido oportunidade de produzir prova nem apresentar testemunhas no debate instrutório”, argumentou.
O advogado indicou ainda que, com esta decisão instrutória, “dos 26 arguidos que estavam em prisão preventiva, 10 saíram em liberdade” – cinco deles seus clientes -, ficando submetidos a outras medidas de coação.
Este caso remonta a 23 de novembro de 2022, quando a Polícia Judiciária (PJ) efetuou uma operação no distrito de Beja em que deteve 35 suspeitos “fortemente indiciados” por crimes de associação criminosa, tráfico de pessoas, branqueamento de capitais e falsificação de documentos, entre outros.
Na altura, a PJ indicou que os suspeitos integravam “uma estrutura criminosa dedicada à exploração do trabalho de cidadãos imigrantes”, referindo que a investigação continuava.
Segundo o despacho de acusação, o processo envolvia um total de 51 arguidos, dos quais 41 pessoas, 32 delas de nacionalidades estrangeiras, e 10 empresas.
Os arguidos estavam acusados de mais de 60 crimes, a maioria de tráfico de seres humanos, incluindo vítimas timorenses, ucranianas, argelinas, marroquinas e moldavas.