Preservar o património, estimular o turismo e reforçar o desempenho da economia são enormes objetivos a alcançar com tão poucas pessoas. Mas por muito que muitos duvidem, a preservação e a promoção do nosso património cultural aumenta as receitas do turismo e, consequentemente, estimula, direta e indiretamente, o potencial de crescimento e desenvolvimento das comunidades e, por consequência, do país. É claro que estas contratações não são para já e, quando forem, os seus resultados só serão mensuráveis a longo prazo e não parecerão muito mensuráveis aos olhos dos estatísticos, o que, por conseguinte, desmoraliza qualquer investidor que busque a riqueza instantânea.

Mesmo assim, o Governo anunciou, através do Ministério da Cultura, que irá lançar no próximo ano um concurso para a contratação de mais 74 vigilantes e 40 conservadores-restauradores que, previsivelmente, ficarão afetos aos diversos organismos da Direção-Geral do Património Cultural, dada a especificidade das profissões em causa.

É certo que, para quem se recorda, já em 2020 a DGPC anunciava este mesmo número de contratações nesse ano para a função de assistentes técnicos para os museus, tendo-se repetido a mesma informação em 2021 por parte dos tutelares da pasta. Aparente, o Ministério das Finanças foi, mais uma vez, responsável pela cativação das verbas designadas para este projeto de recursos humanos. Agora, aos vigilantes e assistentes, o Ministro da Cultura acrescentou futuras contratações de conservadores-restauradores. Estes são fundamentais e, direi mesmo, há muito esperados não só nos organismos afetos à DGPC, mas também aos restantes museus espalhados pelo país, nas suas várias tutelas.

A cultura não tem sido sempre bem tratada pelos Governos ao longo destas quase cinco décadas de democracia, independentemente da sua forma de representação nos sucessivos Conselhos de Ministros. É certo que tem havido exceções, de um lado ao outro do espectro político, com notável trabalho feito por alguns Secretários de Estado e Ministros da Cultura, que se têm empenhado em trazer a merecida visibilidade deste setor, com projetos estruturados, com ideias, com vontade. Mas também sabemos que o peso desta pasta não tem sido suficiente para conseguir exigir dos Governos o que merece para se alavancar. Sem querer entrar na discussão política sobre o passado, interessa-me, sobretudo, olhar para o presente e contribuir para um melhor futuro comum. Um futuro onde a Cultura seja reconhecida como um repositório de ideais, de tradições e de conhecimento e como um projetor de esperanças e de novos roteiros para a inovação. Sim, é verdade: por muito espanto que cause, não é só da tecnologia que nasce a inovação! Muito longe disso: a cultura, nas suas tão diversas formas tem aí um papel fundamental, brotando de dentro do voraz estímulo disruptivo que habita nos criadores.

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Cuidar da Cultura, compreendê-la, suportá-la e divulgá-la melhora a qualidade da educação da comunidade, estimula o desenvolvimento social e, com resultados imediatamente mais validáveis, suporta transversalmente toda a economia, com o Turismo atualmente tão na crista da onda e tão dependente da Cultura para garantir a sua consistência. Sem a Cultura – a nossa “cultura” portuguesa, tal como ela é: com a riqueza da multiculturalidade universalista deste “povo pivô”, como a nós se refere Martin Page – não teríamos a possibilidade de suportar o balanço desse movimento turístico a que assistimos. Ninguém cá ficaria apenas para apanhar sol, se aqui não estivesse, provavelmente, a mais rica e completa cultura gastronómica que se pode encontrar, se não houvesse o património edificado único que temos, se não estivesse representada na herança que nos corre nas veias não apenas quinhentos, mas milhares de anos de partilhas culturais e de fusões identitárias, se não tornássemos visitáveis os encantos materiais que guardamos escrupulosamente nos nossos mais de quatrocentos museus.

Mas também é por isto que somos portugueses: queixamo-nos por malformação genética e achamos sempre que a vizinha tem uma galinha mais rechonchuda. Na verdade, quando olhamos para fora, salvo muito poucas exceções, até mesmo a nível europeu, não encontramos menos lamúrias do que as nossas com o que achamos sempre ser o descaminho da cultura.

Se no setor do Turismo vemos o emprego a aumentar por força do crescimento económico verificado no setor (que ronda uma média de 10% anuais na última década, de acordo com os dados do Turismo de Portugal), no caso dos museus encontramos um crescimento do número de visitantes no mesmo período de cerca de 6 milhões anuais para cerca de 20 milhões, de acordo com os dados da Pordata, o que demonstra bem a importância deste setor para aumentar a frequência e duração dos turistas no nosso país, com as óbvias vantagens financeiras diretas que daí advêm.

Por isso, aumentar a quantidade e a qualidade dos recursos humanos ao serviço dos museus, nomeadamente na área da Conservação e Restauro, deverá ser um vetor determinante para os responsáveis desta pasta, de modo a garantir condições adequadas de preservação dos bens culturais, mantendo a sua melhor condição e preservando o seu valor. Pedro Adão e Silva parece querer ir nesse sentido, desconhecendo-se, para já, quando e de que forma conseguirá concretizar tal vontade e se, até lá, nenhuma cativação do Ministro das Finanças colocará, mais uma vez, mais um ano, um travão neste projeto antigo. Cumprindo-se ou não esta vontade, espera-se que o Ministro da Cultura possa, também, iniciar o fundamental processo para um sistema de acreditação profissional de uma atividade que até hoje continua sem qualquer regulação, sendo ainda praticada por muitos supostos profissionais sem formação académica adequada, à mercê das donas Cecílias Gimenez que vão parasitando no mercado.