João Salgueiro juntou-se às vozes que já manifestaram ceticismo sobre a possibilidade, levantada pelo primeiro-ministro, de criação de um “banco mau” destinado a absorver o crédito malparado que pesa nas carteiras das instituições financeiras e está a prejudicar os balanços e o financiamento à economia portuguesa. Em entrevista à TSF, o antigo presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB) afirmou não se saber “qual é o modelo”, de “onde vem o dinheiro” e “com base em que regras”.
Em declarações àquela estação de rádio e ao Diário de Notícias, António Costa referiu que Portugal devia “encontrar um veículo de resolução para o crédito malparado, de forma a libertar o sistema financeiro de um ónus que dificulta uma participação mais ativa no financiamento às empresas”. E propôs a transferência de “ativos tóxicos” dos bancos para um novo veículo que os tentaria, posteriormente vender, deixando as instituições financeiras livres daquele fardo.
Para o ex-ministro das Finanças, a iniciativa só faria sentido “se já tivéssemos o problema resolvido no fundo”, porque, então, o “banco mau” serviria “para apagar os problemas do passado”. João Salgueiro desconfia do êxito do projeto: “Vamos fazer um veículo para resolver o mau crédito do passado”, mas, “se não tivermos boas perspetivas de crescimento saudável em relação à economia e ao sistema financeiro, não vai restabelecer a confiança”.
O antigo presidente da APB critica o ponto de vista de quem defende um prazo mais longo para reduzir o endividamento do Estado e do setor privado. “A dívida é o somatório dos défices”, afirmou à TSF, alertando para as dificuldades acrescidas na redução da dívida que resultaria do alargamento do período de tempo para o fazer.
O economista revelou, também, dúvidas sobre a exequibilidade da proposta do líder do Governo. “Não é nada fácil isto ser aceite” porque são apenas “quatro ou cinco” os países da União Europeia “que têm este problema”. E defendeu outro caminho, o da consolidação no setor financeiro. João Salgueiro argumenta a favor de se “fazer um segundo banco português”, que resultasse da “fusão do Novo Banco e do BCP”, que deviam ir ao mercado “buscar o capital de que necessitam”.
Teria sido mais fácil no início do programa de resgate
Teodora Cardoso também já manifestou reservas em relação ao “banco mau”. “É uma decisão muito difícil de tomar”, disse a presidente do Conselho de Finanças Públicas nesta sexta-feira, considerando que é mais complicado fazê-lo agora do que teria sido no início do programa de resgate assinado com a troika. Citada pela Lusa, a economista acrescentou que a criação de um “banco mau”, que centralizasse os créditos malparados do setor bancário, “exige capacidade do Estado para capitalizar este banco, o que deve ser muito difícil nesta altura, tendo em conta o estado da economia”.
A economista recordou que, no início do programa de resgate, “foi considerada esta possibilidade e depois foi rejeitada”, precisamente por causa do “custo que teria para o Estado” e também porque, “na altura, os bancos não pareciam estar em tão mau estado”. E concluiu: “se não foi feito na altura, é ainda mais difícil agora” criar o chamado “banco mau”.
Em fevereiro de 2016, os bancos registavam 17.984 milhões de euros em crédito malparado, mais 275 milhões de euros do que em janeiro, de acordo com o Banco de Portugal. Em comparação com fevereiro de 2015, período em que o indicador atingiu 18.339 milhões de euros, verificou-se uma redução do crédito vencido de empresas e famílias. Mais de 71% do crédito malparado tem origem em financiamentos concedidos a empresas.