A acusação do Ministério Público segundo a qual Tony Carreira plagiou 11 canções de autores estrangeiros poderá ser o primeiro caso do género a chegar aos tribunais portugueses. É esta a convicção do cantor e músico Tozé Brito, que falou ao Observador na condição de administrador da Sociedade Portuguesa de Autores (SPA), cooperativa que representa artistas e criadores. O mesmo responsável explicou como se calculam as indemnizações nestes casos, concluindo ser impossível saber quanto terá Tony Carreira de pagar caso a acusação seja provada.

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“Creio que, a concretizar-se, será o primeiro caso a ir a tribunal, porque normalmente as acusações de plágio envolvem associados da SPA, do lado de quem acusa e de quem é acusado, e nós fazemos a mediação, não chega a haver investigação e julgamento”, explicou Tozé Brito na quarta-feira à tarde, depois de conhecida a notícia de que o cantor Tony Carreira foi acusado de plágio em 11 canções, com a colaboração do compositor Ricardo Landum, também arguido.

Gonçalo Moreira Rato, responsável pelo gabinete de Propriedade Intelectual da sociedade de advogados SRS, tem a mesma convicção: casos de plágio em música são geralmente resolvidos por acordo extrajudicial. “Com esta envergadura, suponho que seja o primeiro a ser julgado, se for julgado”, disse o advogado.

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O Ministério Público sustenta que desde 2012, até hoje, os arguidos “têm vindo a dispor de composições musicais alheias e da sua matriz, introduzindo-lhes alterações e arranjos como se fossem suas e sem que com isso tenham criado obras distintas, genuínas e íntegras”, de acordo com a agência Lusa. A mesma fonte indica estar a decorrer o prazo para que seja requerida a abertura de instrução, não sendo certo que vá haver julgamento. Se houver, decorrerá no Tribunal da Propriedade Intelectual, em Lisboa, especializado nestas matérias.

“Chegam dezenas de casos por ano à SPA, sobretudo na área da música, e nós nomeamos peritos, dois ou três maestros com curso superior na área da música, para avaliarem se houve plágio”, disse Tozé Brito. “Quase nunca se consegue provar, porque é necessário estabelecer a existência de uma clara intenção de copiar e isso, em música, é muito difícil. Na literatura é mais fácil.”

Tony Carreira é associado da SPA, mas, segundo o administrador, a cooperativa não foi chamada a pronunciar-se sobre este caso, o qual terá tido origem numa queixa-crime apresentada ao Ministério Público pela Companhia Nacional de Música (CNM). O cantor de “Sonhos de Menino” considerou a queixa “oportunista e injustificada”, em comunicado emitido na quarta-feira pela agência Regi-Concerto, que o representa.

Em declarações à SIC, Tony Carreira afirmou que “não há aqui crime”. “Este assunto começou há dez anos e já está resolvido e sanado com os autores de algumas canções”, acrescentou, sem outros detalhes.

O Observador tentou contactar, sem êxito, o responsável pela CNM, Nuno Rodrigues. A Sony Music, editora de Tony Carreira desde o ano passado, não quis pronunciar-se.

“Não há uma percentagem mínima de letra ou música que tenha de ser igual ao original para que se considere que houve plágio”, sublinhou o administrador da SPA. “Obras minhas já apareceram copiadas, até fora de Portugal, e a Sony Music, que é a minha representante, quando tentou avaliar se havia plágio encontrou longas sequências de notas iguais, vários compassos, o que é muito mau sinal. Mas depois não se conseguiu demonstrar que tinha havido intenção de copiar.”

O advogado Gonçalo Moreira Rato fez notar que, nestes casos, a acusação pode pedir uma indemnização ou apenas uma condenação penal: multa ou pena de prisão até três anos. Este último caso “é duvidoso” que aconteça, disse o advogado.

Tozé Brito assinalou que além dos “direitos patrimoniais” – que podem ser reclamados pelos autores originais, ou os seus representantes, e incidem sobre a venda de discos físicos, vendas digitais e concertos – também pode haver lugar ao pagamento de indemnização relativa a “direitos morais”, previstos no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, lei de referência nestes casos.

Os “danos patrimoniais” calculam-se matematicamente. Tozé Brito exemplificou. Se um cantor publicar um álbum com 10 canções e duas delas forem cópias de outras, retira-se 20% ao lucro obtido com as vendas totais. No caso dos concertos, encontrando-se a percentagem de temas copiados, de entre o alinhamento total do espetáculo, retira-se à receita de bilheteira a percentagem correspondente.

“Este caso é complicado porque já não é a primeira vez que Tony Carreira é acusado de plágio”, afirmou Tozé Brito. “Há alguns anos, a editora Universal queixou-se de plágio em três canções e como ambos são associados da SPA nós mediámos. As partes chegaram a acordo, com Tony Carreira a admitir que não era autor mas adaptador das canções. Pagou uma indemnização à Universal, cujo valor a SPA não conhece. As três canções passaram a ser creditadas com o nome dos autores originais e Tony Carreira tem agora menor percentagem sobre os direitos de autor.”