Aos 40 anos José Carlos Pereira emigrou. A mulher, dentista, estava com dificuldades em encontrar trabalho em Portugal e partiu para o Reino Unido há cinco anos. Ele, com propostas de trabalho em troca de recibos verdes em Portugal, acabou por juntar-se a ela. “O país não está bem. O setor também não e a situação não mudará tão depressa”, diz ao Observador.
Está a trabalhar num hospital público na sua especialidade, em Medicina Interna. Por cá, licenciara-se em 2000 pela Faculdade de Medicina, em Lisboa. Não fez logo a especialidade, mas andou a fazer serviço de banco nos hospitais. Passou pelos hospitais de Santarém e Garcia de Orta, em Almada. E como especialista no Amadora-Sintra.
“Decidi ir por razões familiares. A situação estava cada vez pior e ainda está e tivemos que rever a nossa vida”, conta ao Obervador.
Cecília, a sua mulher, tinha sido mãe quando as portas se abriram no Reino Unido. Durante os últimos cinco anos, José Carlos visitava-a com regularidade. Era uma vida de cá e lá. Por cá, trabalhava como interno e fazia algumas horas noutros hospitais. “Os hospitais deixaram de ter dinheiro para contratar. Tinha propostas, mas eram todas precárias e a recibos verdes. E acabei por emigrar este ano”, disse.
O sistema de saúde inglês é “completamente diferente do português”. “A forma de trabalho, os protocolos, é tudo completamente diferente”, acrescenta. O médico considera estar a ter uma “excelente experiência em termos curriculares e clínicos”. E não pensa, para já, em voltar. Até porque tem um filho e um salário bem melhor do que o que teria em Portugal.
Depois de uma greve de médicos que durou dois dias e do anúncio do ministro da Saúde, Paulo Macedo, de abertura de novas vagas, José Carlos continua firme. “Dificilmente vamos ter condições em Portugal tão depressa. Já não é a primeira vez que abrem estas vagas fantasma”, acusa.
Do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, Daniel Leal, 30 anos, também não espera que a situação económica e a sua influência no setor da Saúde sofram grandes evoluções nos próximos tempos. “Eu quero voltar, mas daqui a dez quinze anos”, disse ao Observador.
Fez Medicina em Lisboa mas optou por ir viver para Nova Iorque para a especialidade em Medicina Interna. “Na altura [2009/2010] custou-me imenso tomar a decisão, mas começava-se a falar nos cortes e eu comecei a ver os ordenados. E acabei por decidir ir”, diz ao Observador. Na realidade, Daniel quer especializar-se em medicinas alternativas “o que não está muito explorado em Portugal”. A ideia dele é aprender o máximo para, mais tarde, abrir uma clínica em Portugal.
“Tenho contacto de colegas que fizeram faculdade comigo e que estão descontentes. Os mais próximos estão em Portugal”, conta.
Daniel admite que todos os seus colegas e amigos estão empregados “a fazer a especialidade”. “O problema é que a especialidade é muito mal paga e, quando se acaba, os contratos são muito limitados e o vencimento é muito baixo”, diz. Também no setor privado, o panorama não é mais fácil. “O privado também começa a ficar saturado. Fazem muitas horas extraordinárias e são mal pagos”, conta. Por outro lado, alerta, “há muitos que se queixam mas continuam a gostar de viver em Portugal. E vão ficando”.