Carlos Brito, responsável de informática do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ), veio dizer este sábado que é responsável pelos problemas com o programa informático Citius e pela consequente paralisação da justiça portuguesa, mas o Sindicato dos Funcionários Judiciais diz que as declarações deste funcionário não são verdadeiras no que diz respeito à saída da antiga equipa que geria o programa.

Em entrevista (link apenas disponível para assinantes) ao Expresso, Carlos Brito disse que a equipa que saiu em fevereiro de 2013 “saiu de um dia para o outro, […] sem deixar um papel, um código“. O sindicato contesta esta alegação e em nota enviada à redação, António Marçal, secretário-geral desta organização, disse que os funcionários deixaram indicações explicitas para a gestão do programa.

“[Os funcionários] Deixaram nas instalações em que trabalhavam, em Coimbra, absolutamente tudo o que existia, incluindo bastante documentação, quer em forma de documento, quer em registos numa base de dados de acompanhamento de tarefas de análise funcional e desenvolvimento. Não fizeram a devida entrega, com toda a necessária passagem do conhecimento ao IGFEJ, porque este não o quis”, escreve António Marçal.

O sindicato explica que os funcionários disseram em janeiro de 2013 que pretendiam terminar a comissão de serviço como equipa de desenvolvimento do H@bilus/Citius, mas sem terem obtido resposta, requisitaram eles próprios o fim do contrato a partir de dia 1 de março. No início de fevereiro, e ainda sem resposta do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, os funcionários terão recebido cartas que indicavam o fim dessa comissão de serviço e que no dia seguinte se deveriam apresentar nos seus serviços de origem, ficando assim desfeita esta equipa.

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O secretário-geral do sindicato alega que nas instalações do serviço em Coimbra ficaram “todos os computadores com a respetiva informação e todos os servidores ligados e deixaram as chaves das instalações em cima de uma secretária”. Segundo Carlos Brito disse ao Expresso, os funcionários “nunca produziram um documento sobre o funcionamento do sistema” e deixaram às equipas que depois disto assumiram a gestão do Citius “um puzzle”. A falta de conhecimento sobre a plataforma informática é indicada como uma das principais causas da paralisação informática deste sistema que está a causar entraves à resolução dos processos que estão em tribunal.

Segundo disseram à Lusa várias fontes ligadas ao processo, a equipa tinha procedimentos e um modelo de desenvolvimento baseado em ferramentas específicas e “todas as tarefas eram registadas e acompanhadas desde a sua análise funcional até à sua colocação em produção, passando pela fase de desenvolvimento, testes, qualidade e produção de documentação”. Até à saída da equipa, existia uma base de dados estruturada com o histórico e documentação de todas as atividades, que foi deixada em pleno funcionamento. Nesse acervo documental estavam mais de 100 mil documentos.

O sindicato recorda igualmente o relatório elaborado a pedido do Ministério da Justiça (MJ) e entregue em junho de 2012 – “Planeamento para reorganização do Mapa Judiciário” -, no qual são sugeridos três cenários para melhor adaptar o sistema informático às alterações que o novo mapa traria. Na altura, ainda o mapa tinha 39 comarcas e o prazo para a reforma entrar em vigor era outro (mais cedo). Dois anos antes, já tinha sido apresentado, por duas vezes (janeiro e dezembro), segundo o sindicato, um projeto de reformulação dos sistemas de informação da justiça, que descrevia de forma exaustiva todo o sistema atual e alertava, numa secção autónoma, para os constrangimentos existentes na atual estrutura.

O relatório enviado ao Ministério da Justiça em junho de 2012 refere que os cenários propostos potenciam a diminuição do volume de informação que consta no sistema, “pela separação do arquivo e dos documentos (comum a todos) e pela alteração do modelo de dados, eliminando a duplicação ou redundância”. É igualmente defendido, entre outras, uma “estreita colaboração com os conselhos (CSM [Conselho Superior de Magistratura] e CSMP [Conselho Superior do Ministério Público] ou PGR [Procuradoria Geral da República]) para definição de regras que suportem a movimentação dos processos (redistribuição) e decisão sobre casos particulares (não contemplados)”.

Dos três cenários apresentados, a equipa considera que “é preferível que [o sistema] seja estruturado sobre uma base de dados única para evitar futuras migrações e para se começar, desde já, a suprimir serviços de sincronização de dados entre bases de dados, que constituem sempre um fator que comporta alguma instabilidade“.

No documento, a equipa recorda a tutela de uma lista de desenvolvimentos ao sistema que haviam sido anteriormente propostos e que nunca foram feitos, por falta de autorização para tal. No relatório de auditoria divulgado em julho, a Inspeção Geral de Finanças já tinha alertado para os custos da evolução das aplicações informáticas do Ministério da Justiça e para a necessidade de racionalizar recursos, defendendo que as tarefas ligadas à plataforma Citius “passem a estar na dependência direta da equipa do Citius”.