Três cientistas japoneses: Isamu Akasaki e Hiroshi Amano, da Universidade de Nagóia, no Japão, e Shuji Nakamura, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, foram galardoados com o prémio Nobel da Física 2014, conforme foi anunciado esta terça-feira pela Academia Real Sueca de Ciências, em Estocolmo.

O prémio atribuído aos três cientistas está relacionado com a luz, em particular com as luzes LED (na sigla em inglês para light emitting diodes) azuis, capazes de emitir uma luz branca mais brilhante e mais económica. Convivemos com os LED diariamente, como nos ecrãs LCD dos televisores, computadores ou telemóveis. Ao contrário dos díodos emissores de luz (LED) vermelhos e verdes criadas nos anos 1960, só foi possível obter os LED azuis nos anos 1990. Os LED são conhecidos por serem formas mais eficientes de usar a energia elétrica para a iluminação e duram muito mais tempo do que as lâmpadas normais.

Atribuir este prémio numa área mais aplicada do que fundamental teria agradado a Alfred Nobel, diz Per Delsing, presidente do Comité do Nobel para a Física. O cientista que dá nome ao prémio privilegiava as “invenções para o benefício da humanidade”. Considerando que um quarto da energia elétrica vai para a iluminação, os LED azuis permitem utilizar essa energia de forma mais eficientes e sem recurso a mercúrio, como as lâmpadas fluorescentes. E duram muito mais. “Os LED duram até 100 mil horas, contra as mil horas das lâmpadas incandescentes e as 10 mil horas das luzes fluorescentes”, lê-se no comunicado de imprensa.

Apesar da surpresa inicial, Mikhail Vasilevskiy, professor catedrático do Departamento de Física da Universidade do Minho, disse ao Observador que compreendia esta escolha: “No ano passado o prémio Nobel foi para o bosão de Higgs, a ala mais fundamental da Física. Este ano é o outro extremo, a ala mais aplicada da investigação. Mostra bem a amplitude dos interesses e do impacto da Física.”

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Eficiência

Utilizando menos energia os LED emitem mais luz – © Johan Jarnestad/The Royal Swedish Academy of Sciences

Com o aparecimento dos LED a iluminação deixou de ser baseada no fogo. Embora o tempo das fogueiras e das lamparinas já esteja distante, as lâmpadas incandescentes tinham de aquecer um filamento para produzir luz e as lâmpadas fluorescentes produzir uma descarga por um gás. Nestes casos, a maior parte da energia elétrica era perdida na produção de calor e muito pouca usada na produção de luz. Com os LED, a eletricidade é convertida diretamente em partículas de luz – os fotões -, tornando estas lâmpadas mais eficientes no uso da energia. Esta pode ser uma boa solução para regiões do globo onde a energia elétrica é escassa.

Os díodos emissores de luz são compostos de várias camadas de materiais semicondutores: uma camada (n) com excesso de carga negativa, outra camada (p) com escassez de carga negativa, também chamada de positiva, e entre elas uma camada ativa para onde cargas negativas e positivas são atraídas devido ao estímulo elétrico. O tipo de luz criado depende do material semicondutor. Para criar a luz azul, uma das dificuldades foi criar o semicondutor adequado – o nitreto de gálio, um material que não existia na natureza.

Camadas

Ilustração das camadas negativa (n) e positiva (p) de um LED – © Johan Jarnestad/The Royal Swedish Academy of Sciences

Mas as dificuldades não ficaram por aqui, mesmo sabendo que material deveriam utilizar ainda existiam obstáculos práticos na concretização: ninguém tinha conseguido produzir cristais de nitreto de gálio com qualidade suficiente e era virtualmente impossível criar uma camada tipo p com este material, lê-se num documento preparado pelo Comité do Nobel. “Os laureados desafiaram as verdades estabelecidas. Trabalharam muito e assumiram riscos consideráveis​​. Construíram eles próprios os equipamentos, aprenderam a tecnologia e realizaram milhares de experiências. A maior parte das vezes não conseguiram, mas não desesperaram – foi mestria no laboratório ao mais alto nível.” Agora, vão poder repartir entre os três oito milhões de coroas suecas (cerca de 882 mil euros).

Isamu  Akasaki e Hiroshi Amano trabalhavam no mesmo laboratório e Shuji Nakamura num outro, na altura na empresa Nichia Chemicals (Japão), descobriram de formas diferentes como criar os cristais de nitrato de gálio, mas enquanto os dois primeiros cientistas tiveram alguns problemas em obter uma camada de tipo p, Nakamura utilizada um método mais simples e económico. Mikhail Vasilevskiy, que tem desenvolvido investigação em semicondutores, que o exemplo da Nichia Chemicals pode ser um incentivo para as empresas portuguesas. “Uma pequena empresa, como aquela onde o investigador [Nakamura] trabalhava, pode desenvolver uma tecnologia que assume grandes proporções.”

Com a invenção do LED azul foi possível recriar a luz branca neste tipo de lâmpadas. Por um lado, a sobreposição das três componentes (vermelha, verde e azul) origina luz branca. Por outro, quando um LED azul bombeia um substância fosforescente também pode originar a luz branca ou mesmo qualquer outra cor.

Quando o nitreto de gálio é adicionado ao alumínio é possível criar LED ultravioleta que, embora não emitam luz visível, podem ser utilizados para purificar as águas. “A luz ultravioleta ativa um catalisador [potenciador das reações químicas] que promove a decomposição das substâncias que constituem a sujidade”, explica o físico da Universidade do Minho.

Além da iluminação, os LED são também uma componente dos lasers, que conseguem extrair um único comprimento de onda num feixe – um feixe monocromático, de uma única cor pura. Tradicionalmente os lasers vermelhos eram usados no leitores de CD e DVD, agora podem ser os lasers azuis a fazê-lo com a tecnologia blu-ray. Como a luz azul pode ser melhor empacotada e ocupar menos espaço que a luz infravermelha, um DVD blu-ray guarda cinco vezes mais informação que um DVD. Os lasers azuis podem ainda ser usados nas fibras óticas e na computação quântica.

“Este é um apenas um exemplo de como a Física muda o mundo. É uma invenção que tem muito impacto na nossa vida, daqui a uns anos será tudo LED”, disse ao Observador Carlos Fiolhais, professor catedrático no Departamento de Física da Universidade de Coimbra. “Foi uma ideia luminosa.”