A vítima do vídeo de 13 minutos divulgado esta quarta-feira e que chocou os utilizadores das redes sociais já apresentou queixa à PSP. O rapaz, que se estima ter entre 16 e 18 anos, e que terá sido agredido por colegas na escola, deslocou-se pessoalmente às instalações da PSP da Figueira da Foz, onde terá contado os pormenores do que se terá passado em 2014, ano do vídeo – embora as imagens só agora tenham sido divulgadas. Foi, aliás, a divulgação do vídeo a precipitar a queixa.

O comando da PSP de Coimbra emitiu um comunicado em que confirma a queixa da vítima e revela que a investigação será conduzida pela PSP local, a da Figueira da Foz, em coordenação com o Ministério Público. Foram identificados oito alegados agressores: quatro maiores de 16 anos, que serão alvo de procedimento criminal e que estão indiciados, entre outros, pelos crimes de sequestro e ofensa à integridade física. E outros quatro, menores de 16 anos, que serão alvo de processos tutelares no tribunal de Família e Menores, disse fonte policial – uma vez que são abrangidos pela Lei Tutelar Educativa.

O vídeo terá sido filmado no verão passado (2014) durante as férias escolares. A vítima terá revelado o momento e as circunstâncias do ocorrido. Nesta altura a PSP já teria conseguido também identificar a maior parte dos intervenientes e o local onde teriam ocorrido as agressões.

As imagens mostram, ao longo de 13 minutos, um jovem a ser agredido por colegas, alegadamente do sexo feminino. Além da vítima, são vistos, pelo menos, dois rapazes e quatro raparigas. Duas delas agridem-no ao murro e à bofetada enquanto o insultam. A vítima não reage. Ora tem as mãos atrás das costas ou dentro dos bolsos. Há, ainda, alguém que filma e ri.

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Segundo a lei, e por ser menor, têm que ser os seus pais a apresentar queixa. E podem fazê-lo durante os seis meses após o conhecimento dos factos. Logo, apesar de o vídeo ter sido feito no ano passado, segundo a PSP, caso os pais do menor só agora tenham tomado conhecimento do crime podem denunciá-lo.

Segundo o jornal Diário As Beiras,  a PSP reforçou o patrulhamento nas três escolas frequentadas pelos alegados agressores, depois de várias ameaças via redes sociais.

Fonte da PSP explicou ao Observador que o vídeo chegou ao seu conhecimento através da rede social Facebook em forma de comentário a uma publicação que dava a conhecer o programa “Estou Aqui” na noite de terça-feira.

“Foi imediatamente enviado o vídeo para as informações para obter mais informações”, assegurou fonte policial.

Instituto de Apoio à Criança pede que vídeo seja analisado

O Instituto de Apoio à Criança (IAC) solicitou, entretanto, ao Ministério Público que analise o  vídeo divulgado na noite de terça-feira no Facebook. O vídeo tornou-se viral na internet, com mais de meio milhão de visualizações e cerca de 20 mil partilhas em poucas horas, suscitando centenas de insultos e comentários de repúdio e apelos à intervenção das autoridades judiciais, PSP e Comissão de Proteção de Crianças e Jovens em Risco.

Em declarações à agência Lusa, o secretário-geral do IAC, Manuel Coutinho, disse que o Instituto de Apoio à Criança apresentou “a situação para análise” ao Ministério Público.

A vice-presidente do IAC, Dulce Rocha, acrescentou à Lusa que as circunstâncias divulgadas no vídeo “revelam especial censurabilidade” que, na sua opinião, apontam para um crime público que já não depende de queixa.

“Como é um crime com um conjunto de pares, com agressões reiteradas por várias pessoas”, o jovem estava indefeso e o vídeo foi para as redes sociais “poderemos entender que se trata de um crime de ofensas corporais qualificadas”. “Mesmo que o jovem já tenha 16 anos eu penso que há um circunstancialismo que aponta” para este crime, sustentou.

Para Manuel Coutinho, estas situações de “ofensas à integridade física e psicológica dos pares, nomeadamente de jovens em idade escolar, mostram muitas vezes a forma disruptiva como as pessoas hoje em dia convivem”.

“Estes casos surgem nas escolas porque é onde as crianças e os jovens estão, mas normalmente estes casos vêm das comunidades e das famílias”, adiantou.

Manuel Coutinho ressalvou que “a maior parte dos jovens é saudável e respeitador dos outros, mas infelizmente ainda há muitos jovens que gostam da cultura da violência”.

É necessário todos perceberem que “ridicularizar, agredir, fazer troça não pode ser algo de positivo, tem que ser algo que tem de ser combatido”, defendeu, acrescentando que os autores dos maus-tratos, sejam físicos, psicológicos ou emocionais, “têm que ser chamados à responsabilidade”.

Para o psicólogo, este é “um problema” que deve preocupar a sociedade e as famílias. “Todos somos responsáveis pelos nossos atos e temos de perceber que filhos e que jovens cada um de nós está a educar”.

Na sua opinião, o “desrespeito pela dignidade humana e pela pessoa humana” é também fruto da violência que se vive de uma forma geral na sociedade.

“A sociedade não está a conseguir conter em tempo útil toda esta violência” que se vem manifestando entre os pares e que “põe também a tónica, muitas vezes, nos jogos que as crianças e jovens têm online em que a violência é gratuita” e a vida humana nada vale, vencendo quem “é mais agressivo ou mais violento”, diz.

“Como os filtros não existem, por vezes, a realidade ultrapassa a ficção e os jovens transpõem para a vida do dia-a-dia aquilo que vêem no mundo imaginário”, advertiu o também psicólogo e coordenador do SOS-Criança do IAC.