Cultura, coesão social e empresas são os três pilares do ambicioso projeto que a Câmara Municipal do Porto (CMP) apresentou na Trienal de Milão para dar vida ao abandonado Matadouro Industrial, em Campanhã. Os 29 mil metros quadrados de terreno vão ser ocupados por galerias, auditórios, acervos e escritórios, e o projeto inclui a construção de passagens para o metro do Estádio do Dragão e para a estação de comboios de Contumil.
De acordo com a CMP, a obra é para estar pronta a meio do próximo mandato (as eleições autárquicas acontecem em 2017 e Rui Moreira é candidato), o que significa que os concursos e procedimentos necessários para a sua concretização vão começar imediatamente.
O custo estimado é de 10 milhões de euros, explica ao Observador o assessor de Rui Moreira, Nuno Santos. O valor vai sair dos cofres da autarquia, que também vai candidatar o projeto a fundos comunitários. Renovado o espaço, serão construídos uma passagem para o Metro do Estádio do Dragão, e, a sul, um acesso pedonal melhorado entre a VCI e a estação de comboios de Contumil, paralelo ao que já existe. Depois de o edifício e as acessibilidades estarem construídas, Nuno Santos explica que a ideia é que o projeto seja autossustentável, mantido por quem o ocupar.
O antigo Matadouro, que começou a ser construído há mais de 100 anos na zona da Corujeira, em Campanhã, irá comportar 10 áreas diferentes. A primeira é uma “Área de Empresas Criativas e Tecnológicas” nacionais e internacionais, de diferentes áreas criativas e tecnológicas. Destina-se a “grupos económicos e a médias empresas”, bem como a “promotores de novas ideias de negócio”, pode ler-se no documento “Porto Before Porto”, que Rui Moreira levou a Itália na passada quinta-feira.
O há muito esperado “Museu da Indústria” terá ali um espaço, com uma coleção permanente composta por “centenas de peças, máquinas e documentos” provenientes dos setores mais representativos do desenvolvimento industrial da cidade e da região, como o têxtil, a moagem, a fundição e a metalomecânica.
Os polos dedicados à “Arte e Comunidade” serão coordenados por agentes multidisciplinares que desenvolvam práticas em áreas sociais e artísticas, em articulação com o tecido social de Campanhã. Terá, também, a valência de “Reserva de Arte Contemporânea“, dando resposta a necessidades de espaço de reserva por parte de colecionadores e artistas do Porto
A “Nave-multiusos” vai estar reparada para acolher diversos tipos de apresentações, sejam conferências, eventos sociais ou projeções de cinema. No “Laboratório de Gastronomia” pretende-se “projetar a gastronomia tradicional atlântica junto ao grande público” e promover a “investigação e inovação para novos chefes.
1 – Área de Empresas Criativas e Tecnológicas
2 – Museu da Indústria
3 – Espaço de Arte e Comunidade
4 – Reservas de Arte Contemporânea
5 – Nave multiusos
6 – Laboratório de Gastronomia
7 – Estúdios Média e Audiovisual
8 – Artes e Ofícios Tradicionais
9 – Pólo de Desporto
10 – Residências Artísticas
O antigo matadouro também vai estar dotado de “Estúdios Média e Audioviosual” para produção e gravação nas áreas do cinema, rádio, televisão e música, com espaços para arrendamento comercial e outros vocacionados para projetos pedagógicos emergentes.
Outra das valências alocadas será destinada às “Artes e Ofícios Tradicionais“, que incluirá, por exemplo, locais de trabalho para encadernadores, estofadores, carpinteiros e outros artesãos. Servirá também para acolher “Residências Artísticas”, com estúdios que incluem uma área de residência e de outra de apresentação pública destinadas a artistas nacionais e estrangeiros.
A filosofia de arquitetura, a cargo da sociedade Garcia & Albuquerque, Arquitetos, tem por base a tentativa de preservação da imagem de caráter fortemente industrial que ainda hoje marca aquele conjunto arquitetónico. “O desenho dos novos espaços necessários para dar resposta ao programa, nomeadamente os auditórios, acervos, galerias e escritórios, respeita a estrutura e métrica existentes”.
Estão previstas apenas duas demolições. A primeira tem como objetivo diminuir o impacto paisagístico com a criação de um pequeno bosque. Será “alargada a mancha verde, com a plantação de novas árvores”. Algumas coberturas de edifícios também serão ajardinadas. A segunda demolição servirá para criar o o “Pólo de Desporto“, uma zona destinada a atividades desportivas.
Uma construção republicana, inspirada na Alemanha
Em 1910, o edil decidiu aprovar a construção de um novo matadouro na cidade, uma vez que a capacidade do matadouro de S. Diniz estava esgotada. O projeto aprovado é da autoria do engenheiro Avelino de Andrade e seguiu a influência do matadouro alemão Offenbach, construído em 1904, em vez de construir em altura. Daí que a área ocupada seja extensa, 29 mil metros quadrados.
Só em 1923 é que o Matadouro Industrial do Porto começou a funcionar, sendo que a inauguração oficial aconteceu em 1932. Havia quatro “pavilhões de matança”, como se chamavam. Dois destinados a bois, um para porcos e outro para vitelas e carneiros. Por fora, os pórticos e janelas arqueadas parecem não condizer com as funções para as quais o edifício foi construído.
Na década de 1990 o matadouro foi encerrado, tendo servido nos últimos anos como abrigo a alguns animais ou palco de espetáculos pontuais. Apesar das diversas atualizações que sofreu ao longo do tempo — está classificado como Imóvel de Interesse Patrimonial — a Junta de Freguesia de Campanhã garante que as infraestruturas são ainda as originais. Uma identidade que será preservada. Mas apenas por fora. Dentro de quatro paredes, haverá vida. A apresentação para o público em geral é esta quarta-feira, a partir das 18h30, no local onde tudo vai nascer.