Nunca se falou tanto em startups e em inovação como nos últimos anos – à escala nacional e internacional. O fenómeno de Silicon Valley contagiou outros pólos criativos pelo mundo e Lisboa está hoje definitivamente no mapa das capitais empreendedoras europeias. Uma tendência passageira? “As startups não são uma moda, mas um novo paradigma de inovação e colaboração empresarial”, responde Pedro Rocha Vieira, co-founder & CEO do programa de aceleração Beta-i.

Reflexo disso é, na sua opinião, a consistência na inovação e no investimento em conceitos disruptivos ao longo dos últimos anos. No entanto, as startups falham. E falham muito, na ordem dos 90% a dois anos, sublinha Stewart Noakes, COO da Fábrica de Startups. É na reversão destes números que os programas de aceleração podem fazer toda a diferença.

A Beta-i e a Fábrica de Startups são dois dos programas de aceleração existentes no país e também parceiros do programa Ativar Portugal Startups, promovido pela Microsoft Portugal, que desde o seu lançamento em 2015 já apoiou mais de 120 startups, centrando-se de momento em 31 projetos empreendedores.

Como o próprio nome indica, não são incubadoras no sentido tradicional, mas programas, com uma duração temporária – de dias, semanas ou poucos meses – em torno de desafios específicos, explica Pedro Rocha Vieira. O foco é o crescimento do próprio negócio. O Lisbon Challenge é um dos programas organizados pela aceleradora Beta-i, vocacionado para startups tecnológicas que tenham já um produto ou protótipo. “Durante três meses, as startups enfrentam, no nosso escritório, os desafios do crescimento, têm mentoria de vários empreendedores nacionais e internacionais de sucesso, e workshops intensivos”, sublinha Pedro Rocha Vieira, garantindo que em apenas três meses são visíveis as grandes mudanças nos negócios que a Beta-i ajuda, dado o ambiente muto focado e dinâmico. Para as fases iniciais de uma startup, a Beta-i organiza também o Beta-Start, focado na transformação de uma ideia num protótipo e na definição do modelo de negócio.

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“Nenhuma licenciatura ou MBA no mundo consegue preparar verdadeiramente o empreendedor para o que vai acontecer”, afirma Stewart Noakes. Os programas de aceleração são, assim, uma forma de colocar a ideia no terreno e guiam o empreendedor na validação dessa ideia e no desenvolvimento do negócio, além de o apresentar a “um novo mundo de parceiros, investidores e mesmo competidores”. Estas são as grandes vantagens para o COO da Fábrica de Startups.

Entre os programas promovidos por esta aceleradora, destacam-se dois. No Ideation Week, cinco dias intensos de trabalho de campo, por vezes vocacionados para um único setor, como a saúde ou o turismo, os empreendedores entram em contacto com grandes nomes das indústria e tentam encontrar soluções inovadoras para os desafios. O FabStart destina-se, por sua vez, a equipas de três a quatro empreendedores que querem validar a sua ideia e modelo de negócio junto de potenciais clientes.

Formação da ideia e prototipagem – o primeiro nível do desafio

“A principal causa do falhanço das startups é ainda o facto de estas tentarem trazer para o mercado produtos que não são necessários ou desejados”, garante Stewart Noakes. Os programas de aceleração, por requererem validação extra e insights dos consumidores, acabam por obrigá-las a passar este primeiro desafio.

Também neste contexto, as equipas diversificadas fazem toda a diferença: “a diversidade de visões do mundo, skills e insights numa equipa é essencial na validação e no início de uma startup; é a receita do sucesso”, afirma. Depois, à medida que vão crescendo, as equipas necessitam de ir conhecendo, através dos programas de aceleração, outras pessoas que estão de qualquer forma ligadas no mesmo ecossistema.

Também Pedro Rocha Vieira enfatiza a importância de os empreendedores testarem uma ideia e confirmarem se as pessoas a procuram. “Para quem está agora a começar é mesmo importante desenvolver uma solução que resolva um problema real”, afirma, acrescentando que o pior erro que os empreendedores cometem é cederem ao ego, não aprenderem com os clientes e entrarem logo num modo “vendas”. “Não é possível alcançar boas vendas com pessoas que não conhecemos e com as quais não conversamos. É como ter um presente de aniversário para oferecer a alguém que não conhecemos… Do que é que ela gosta?” Para o co-founder e CEO da Beta-i, a frase generalizada entre designers – “a forma segue a função” – deve ser um mandamento entre startups, porque, na verdade, o que é desenhado tem de funcionar bem nas mãos das pessoas.

E as grandes corporações?

Se é certo que inovar faz parte dos skills de uma startup, o mesmo já não se aplica às grandes empresas, dado o tipo de resistências burocráticas e, principalmente, o facto de terem muito a perder. Os programas de aceleração são, neste contexto, uma ponte essencial entre as duas realidades. A Beta-i está a apostar no desenvolvimento de programas de aceleração verticais e para intermediação entre startups e grandes corporações, dado que as primeiras podem ser “críticas para as estratégias de inovação das grandes empresas, em torno de setores específicos, como o turismo, a fintech, smart cities, indústria 4.0, agroalimentar, retalho ou educação”, explica Pedro Rocha Vieira. E o inverso também se aplica.

“As aceleradoras providenciam um cenário onde startups e grandes companhias podem encontrar-se”, sublinha Stewart Noakes. Enquanto as primeiras se focam na inovação, as segundas são boas a melhorar o que já têm e a aumentar as fontes de receita. “O ADN é diferente, mas isso não é mau”, garante. Afinal, a maioria das startups partilha um desejo: tornar-se uma grande empresa.