Tem a palavra o “mestre” Jorge Jesus. O treinador do Sporting discursou esta terça-feira no Parlamento, num colóquio de homenagem ao professor Manuel Sérgio. Na sala do Senado — onde decorrem as sessões quando a Sala do Plenário está, por exemplo, em obras — Jesus dispensou formalidades, mas não escondeu o “orgulho” de falar “numa casa onde nunca tinha discursado.” Deixou uma revelação: durante um ano Manuel Sérgio fez parte da sua equipa técnica no Benfica. E ainda um acaso para alimentar um país com três diários desportivos: cruzou-se com Luís Filipe Vieira nos corredores do Parlamento e não se cumprimentaram.

Jorge Jesus foi, ao contrário do que acontece nos estádios de futebol, aplaudido por membros de todas as bancadas e no fim viu Manuel Sérgio a dar-lhe o título de “mestre”. Mestre da tática. E não só. De sistemas e táticas de jogo Jesus sempre percebeu, mas faltava-lhe algo mais. “Eu era um treinador de ataque, mas precisava de desenvolver outras áreas”, começou por contar. Então convidou Manuel Sérgio para a equipa técnica do Benfica, contando que o professor lhe confessou: “Mas eu não percebo nada de futebol”.

De acordo com o agora técnico leonino, Manuel Sérgio obrigou-o a “pensar como treinador” e lembrou-lhe que “as pessoas que estão fora do fenómeno de futebol não sabem o que é um treinador de futebol. Pensam que um treinador escolhe a tática, escolhe os jogadores e pouco mais.” O técnico dos leões confidenciou ainda que o professor aposentado da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa lhe reconhecia competência para ser professor universitário:

Ele disse-me. Vocês, os treinadores deviam ser as pessoas que deviam estar na faculdade a dar aulas sobre futebol.”

Jorge Jesus lembrou que chegou a dar uma aula na Faculdade de Motricidade Humana a convite do professor homenageado e destacou o quanto aprendeu com ele em várias fases do discurso: “Manuel Sérgio fez-me pensar e fez-me muito melhor treinador.” O treinador dos leões recordou que não foi “aluno académico” de Manuel Sérgio, mas teve o “privilégio” de ser “aluno dele particularmente.”

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Manuel Sérgio pediu depois a palavra para dizer que “toda a gente” devia “aprender com quem está na alta competição”, reconhecendo a capacidade de Jesus de lidar com “problemas de toda a ordem” enquanto lidera um balneário.

O professor confessou ainda que Jesus foi para ele “um mestre em muitos aspetos” e acrescentou ainda que “às vezes as pessoas riem-se de pessoas destas“, mas “só se riem porque não sabem aprender com elas.”

À saída do colóquio, Jorge Jesus concretizou que Manuel Sérgio o ensinou “não só na filosofia”, mas que o fez “fazer uma reflexão entre a prática e a teorização.” A propósito dos ensinamentos de Filosofia, Jesus contou o episódio de quando a sua cabeça já estava a “inchar de tanto ler”:

Ele dia sim, dia não, trazia-me sempre um livro de um filósofo para ler [Risos] Que era sessenta páginas. E eu disse: ó professor, por favor não me traga mais livros, que a minha cabeça já está a inchar de tanto ler.”

Chegou a estar prevista a presença de Rui Vitória nesta homenagem, mas o treinador do Benfica adoeceu e não se pôde deslocar à Assembleia como estava previsto. No entanto, houve um encontro imediato entre Jorge Jesus e o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, nos corredores de acesso à Sala do Senado.

Vieira foi ao Parlamento apenas dar um abraço a Manuel Sérgio antes do colóquio e saiu. Quando ia a sair, Jorge Jesus ia a chegar e cruzaram-se no corredor. Ambos foram notícia por se terem sentado à mesma mesa na semana passada num hotel em Lisboa. Muita tinta correu quanto à breve conversa que tiveram então, uma vez que o Benfica ainda mantém um processo contra Jorge Jesus no valor de 14 milhões de euros — o pedido de indemnização por ter trocado o Benfica pelo Sporting no verão de 2015. Esta terça-feira cruzaram-se, mas nem uma palavra.

Jesus saiu da Assembleia a sorrir. O “carinhas” da Amadora, que dedicou toda a vida ao futebol, tinha discursado na Assembleia.