Oito cubos e 22 fotografias vão ocupar o espaço público, a partir de sexta-feira, no Parque das Nações, em Lisboa, mostrando como a fotojornalista Monique Jaques viu crescer, durante cinco anos, as mulheres palestinianas de Gaza. A exposição — que dá o arranque ao programa “Abril em Lisboa”, promovido pela empresa municipal EGEAC — documenta o dia a dia de jovens palestinianas de Gaza entre os sete e os 23 anos.

Monique Jaques — nascida nos Estados Unidos e residente em Istambul, na Turquia — chegou pela primeira vez àquele “sítio extremamente difícil” em 2012, “para cobrir o conflito, como qualquer outro jornalista”. Aí conhece uma jovem que a convida a ficar, vive com a família dela, tornam-se amigas e é ela que a apresenta a muitas outras meninas e mulheres de Gaza. “Apercebi-me de duas coisas: todas as imagens eram de violência (…) e todas as imagens eram de homens”, recorda. “Isto não é o que vejo”, percebeu. E decidiu fazer diferente.

É uma sociedade islâmica extremamente conservadora, se comparada com a Turquia, ou mesmo com a Cisjordânia. Há a ideia de que as mulheres não devem ser fotografadas”, conta, em entrevista à Lusa, durante uma pausa na montagem da sua primeira exposição, em Lisboa, que ficará no Parque das Nações, até 30 de abril. O trabalho foi, portanto, demorado. “Não é que os jornalistas não queiram fazer [histórias mais aprofundadas], a questão é que os órgãos de informação não as querem, preferem manchetes e ‘flashes’ ao dia a dia das pessoas”, constata a fotojornalista de 32 anos, que vai aceitando trabalhos para financiar o que lhe interessa fazer.

Contrariamente ao que se possa pensar no Ocidente, o mais fácil foi fotografar as palestinianas em crianças. “Quando são mais velhas, é mais difícil”, realça, recordando a jovem que fotografou a surfar e que viu passar da infância à idade adulta. Casou-se, cobriu-se, teve um filho e nunca mais pôde deixar-se fotografar. Mas nem Gaza nem sítio nenhum são a preto e branco, mas com muitas matizes. Alguns dos seus amigos dizem-lhe que este território palestiniano (uma estreita e sobrelotada faixa de terra encravada entre Mediterrâneo, Egito e Israel) se “está a abrir mais”, e que as redes sociais trouxeram “todo um mundo para as mulheres”.

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Na prática, “estão limitadas no que podem fazer, não é muito seguro saírem para se manifestarem”. Mas “muitas ‘blogam'”, porque perceberam que “a melhor forma de contribuírem para a mudança é falarem e contarem as suas histórias”, conta. O trabalho publicado no livro “Gaza Girls: growing up in the Gaza Strip”, que dá o mote à exposição, resulta do que as fotografadas registaram em diários íntimos, a partir dos quais a fotojornalista premiada trabalhou.

“É uma história universal sobre crescer e decidir que tipo de mulher, que tipo de pessoa se quer ser”, resume, sublinhando que “temos todos os mesmos instintos básicos e desejos”. Ser uma jovem adolescente em Gaza “é muito complicado”, mas, afinal, “elas também querem viajar, ver o mundo e depois regressar a casa”. Num mundo “perfeito”, Monique gostava de exibir o seu trabalho na Palestina, mas “Gaza não está preparada”. Não há sequer um historial de convivência com a arte ou a fotografia no território, oprimido entre o radicalismo do Hamas e a prepotência do Estado de Israel.

“Talvez volte [a Gaza], para mais agora com os protestos… não sei. É o mesmo que abandonar a família. Trabalhei com elas cinco anos, não dá para dizer que nunca mais as verei”, admite.

É muito difícil não nos transformarmos em ativistas em Gaza, onde não há água, nem eletricidade, nem medicamentos, mas sou jornalista e foquei-me no trabalho que estava a fazer”, explica. “É muito difícil ser otimista sobre a situação, porque parece que ninguém, de nenhum dos lados, quer mesmo resolver a questão. O que é triste, porque, no final do dia, são pessoas como estas miúdas que realmente sofrem, e não os políticos”, critica.

Monique ainda está concentrada em divulgar este trabalho, mas depois é possível que olhe para “o pesadelo” da América, onde nasceu. E continuará a apontar o dedo ao que está mal. Por exemplo: as escolas de fotojornalismo estão cheias de mulheres, que depois não chegam a fotojornalistas profissionais. “É um clube de homens”, retrata. “Somos mais sonoras e estamos a fazer muito barulho, as pessoas estão a ouvir, porque têm de o fazer, alguns editores foram afastados na sequência do ‘#metoo’ [movimento viral que começou em outubro de 2017 e tem chamado a atenção, através das redes sociais, para o fenómeno do assédio sexual e da discriminação laboral]”, constata. “Mas acredito na ação. Não são precisas declarações, basta contratar mais mulheres”, sugere.