Agora que o Mundial chegou à última ronda da fase de grupos, já está toda a gente a começar a perder cabelos. Até quinta-feira, 28 de Junho, dia dos últimos jogos decisivos para definir o mata-mata dos oitavos de final, muitos mais se perderão. E isto não tem nada a ver com queda provocada pelos nervos – é que já há muitas selecções a ficar pelo caminho, e com elas vão-se também muitos penteados. O que significa que esta é a altura ideal para registar as melhores prestações capilares dos jogadores das 32 selecções que chegaram ao Rússia 2018.

Uma coisa é certa: independentemente do que venha a acontecer daqui para a frente, é muito provável que já se tenha encontrado o grande penteado deste Mundial, um título que no futebol moderno tem quase tanta importância como o de homem do jogo. Brasil, o país que já tinha oferecido ao mundo a meia bola na testa de Ronaldo (o fenómeno, claro), voltou a provar que Deus é brasileiro ou, pelo menos, que pode muito bem ser o cabeleireiro de Neymar.

“Spaghetti al dente”, escreveu Eric Cantona, ex-jogador e guru do comentário futebolístico, no seu Instagram. A imagem assim legendada mostrava o próprio com um monte de esparguete em cima da cabeça. E a homenagem, como muitas outras que se espalharam pelas redes sociais de todo o mundo, era para o penteado de Neymar no primeiro jogo do “escrete” no Mundial, contra a Suíça.

Os brasileiros, tão rápidos na arte do meme como da finta, consolaram-se do desaire em campo com vários momentos de comédia sobre o cabelo de Neymar, o que, vendo bem as coisas, não deixou de ser um serviço prestado à sua nação pelo craque maior da canarinha. E não aconteceu por acaso: entre outras coisas importantes que terá levado para a Rússia, Neymar fez-se acompanhar pelo seu cabeleireiro-amigo de infância, Nariko, e por um colorista que conheceu quando ainda jogava em Barcelona, Wagner Tenorio. O resultado tem mudado de jogo para jogo, o que traz ainda mais emoção ao decisivo Sérvia-Brasil que se joga esta quarta-feira (27 de Junho, 19h, SIC).

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Adeus moicano, voltarás sempre

Esta vitória precoce do Brasil pode tirar algum ritmo à competição capilar, mas nunca se sabe, e é preciso pensar jogo a jogo. Assim como, recorrendo a outro chavão de flash interview futebolística, é preciso sair de cabeça erguida – que é como quem diz, há muitos jogadores já de saída do Mundial que merecem receber o devido reconhecimento pelos seus esforços a nível do penteado.

É o caso de dois dignos representantes de Marrocos – Nabil Dirar e Faycal Fajr. Não só Marrocos jogou muito mais futebol do que aquele que se pode supor pelo único ponto angariado na competição, como estes dois jogadores terão executado triangulações certeiras com a máquina zero para desenhar no couro cabeludo uma bandeira do país e uma estrela, respectivamente.

Ainda a nível dos valores individuais, será sentida a falta de jogadores como Mile Jedinak, que trouxe da Austrália uma combinação de barba e capelo capaz de competir com as melhores cabeleiras dos anos 80; Kendall Waston, da Costa Rica, que apostou em rastas curtas com as pontas alouradas; ou Luis Advincula, o peruano que tem um nome tão marcante como o seu descolorado total.

Também já se pode decretar que o triunfo do moicano com riscas angulares laterais, muito evidente neste Mundial, sai enfraquecido da fase de grupos à conta da eliminação de jogadores como Anibal Godoy (Panamá), Christian Cueva (Peru) ou Ramin Rezaeian (Irão). É um golpe duro, mas este penteado, tão querido pelo mundo do futebol, sobreviverá.

O futebol é um descolorado de equipa

Toda a gente sabe que um craque faz sempre falta. Mas, se recorrermos aos livros de estilo da modalidade, é um facto que o futebol é um jogo de equipa. E há, felizmente, equipas que levam isso a sério mesmo quando o assunto é o cabelo.

Ainda que ande no ar um certo aroma de regresso da Inglaterra às velhas glórias, que tem posto os ingleses a referir o Mundial de 66 a cada duas frases, a verdade é que os ingleses têm um cabelo, em geral, demasiado fino (a família real britânica que o diga). Aproveitando a desvantagem do adversário nesse departamento, a Tunísia, no primeiro jogo do grupo, entrou em campo confiante e com os penteados bem estudados. Cabelos muito escuros, espessos, brilhantes pela modelação firme do gel, garantiram uma vantagem clara à selecção do norte de África – que será difícil de superar, seja por que equipa for, até ao final do campeonato.

Já a Coreia do Sul decidiu deixar a sua marca colectiva por outra via – a via dos cabelos descolorados ou pintados de ruivo. No conjunto da selecção asiática, são muitos (e merecedores, talvez, de um estudo mais aprofundado) os casos desses. Mas a liderar, um pouco como acontece no campo, está Cho Hyun-woo, o carismático guarda-redes da equipa. Não só exibe um cabelo ruivo difícil de esquecer, como acumula a atitude ousado com um moicano digno de respeito.

Perante isso, pode-se dizer que os cabelos claros e bem penteados de selecções como a Dinamarca ou a Suécia, e as várias poupas vindas da América do Sul, têm de começar a aprender a diferenciar mais o seu jogo.

Os clássicos nunca ficam ralos

Nem sempre é fácil estabelecer o que é um clássico, sobretudo em futebol. É óbvio que a definição se deixa contaminar por aquela sensação boa de um encontro antigo entre duas equipas que há muito rivalizam (um Brasil-Argentina, por exemplo, ou um Alemanha-Inglaterra), mas para o caso presente basta aplicar duas das definições possíveis do dicionário, ambas presentes e bem representadas neste Mundial da Rússia.

Existe o clássico de algo “que de há muito é habitual”. Aqui encaixa aquele conforto de se saber que Sadio Mané, do Senegal, terá na cabeça aquela longa linha recta e clara que atravessa o seu cabelo em comprimento, ou seja, lateralizada – para se usar um dos termos preferidos dos comentadores televisivos. Ou mesmo aquela curiosidade mórbida de voltar a encontrar Domagoj Vida, da Croácia, com o leu longo rabo de cavalo em combinação com cabelo rapado. Ou ainda, arriscando um pouco na possibilidade de a madeixa verde de Maria José Valério já ter o seu próprio estatuto de it-girl, é de destacar que William Troost-Ekong, da Nigéria, aplicou a mesma moda no seu cabelo.

Na mesma categoria, nada como oferecer uma nota de apreço aos saudosistas: tanto aos jogadores modernos estilo Bjarnason, da Islândia, que mantém acesa a chama dos cabelos compridos com corte direito, ou Lee Yong, da Coreia do Sul, que não teme usar uma fita na linha lendária de Steve Foster, como os verdadeiros representantes de outros tempos, que é o caso de Ricardo Gareca, treinador do Peru, fiel à imagem estrela rock dos anos 70.

Por fim, há aquelas pessoas, os raros, os ditos predestinados, que juntam a esta uma outra definição de clássico: “que é de estilo impecável”. Estiveram só nas bancadas, mas estiveram lá e isso basta para continuarem a fazer história: Higuita e Valderrama foram à Rússia com os mesmos penteados com que sempre representaram a Colômbia e não deixaram por mãos alheias o título de ícones capilares. Com clássicos assim, ninguém pode levantar cabelo.