Uma equipa internacional, que engloba físicos portugueses, conseguiu comprovar, pela primeira vez, os efeitos previstos pela Teoria da Relatividade Geral de Einstein relativamente aos buracos negros supermassivos, após 26 anos de observações.
Um modo de testar uma teoria física é medir o seu comportamento em casos extremos”, disse à Lusa o astrofísico Paulo Garcia, da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).
Neste caso, para testar a Teoria da Relatividade Geral de Einstein, utilizou-se o buraco negro supermassivo mais próximo da Terra (a 26.000 anos-luz de distância), localizado no centro da Via Láctea, que tem uma massa de quatro milhões de vezes a massa solar e está rodeado por um pequeno grupo de estrelas que o orbitam a alta velocidade.
Para tal, com recurso aos instrumentos GRAVITY, SINFONI e NACO, instalados no telescópio VLT, do Observatório Europeu do Sul (ESO), no Chile, os cientistas observaram uma estrela denominada S2, o objeto conhecido que passa mais próximo do buraco negro central da Via Láctea.
De acordo com Paulo Garcia, a estrela S2 passou pelo ponto mais próximo do buraco negro a 19 de maio de 2018, a uma distância menor que 20 mil milhões de quilómetros e a uma velocidade maior que 25 milhões de quilómetros por hora.
Através de medições “muito precisas” da posição e da velocidade desta estrela, conseguidas pelos três instrumentos, foi possível verificar um efeito chamado desvio para o vermelho gravitacional, indicou o astrofísico portuense.
Esse efeito acontece “quando a luz emitida pela estrela é esticada na direção dos maiores comprimentos de onda”, devido ao “campo gravitacional muito forte do buraco negro”.
A variação do comprimento de onda da luz registada na estrela “está precisamente de acordo com a variação prevista pela Teoria da Relatividade Geral de Einstein”, que explica a gravidade como uma deformação do espaço-tempo, contrastando com as leis de Newton, que explicam essa força como algo que atua à distância, esclareceu.
Esta trata-se da primeira vez que “este tipo de desvio às previsões da Teoria da Gravidade de Newton é observado no movimento de uma estrela em torno de um buraco negro supermassivo”, refere uma nota informativa do ESO sobre a descoberta.
Agora sabemos que a teoria de Einstein se mantém válida para buracos negros com massa de milhões de massas solares. Até agora, todos os testes tinham sido feitos com massas muitíssimo mais baixas, da ordem de dezenas massas solares (como foi no caso da deteção de ondas gravitacionais) ou da massa solar”, frisou Paulo Garcia.
Neste momento, a equipa esta a seguir a estrela S2, “procurando um desvio na sua órbita denominado precessão de Schwarzschild”.
“Este é o segundo efeito da teoria da relatividade que estamos à procura”, acrescentou.
As observações agora reveladas mostram um resultado “há muito procurado”, representando “o culminar de uma campanha de observações de 26 anos”, lê-se ainda no comunicado do ESO.
Mais de cem anos após a publicação do seu artigo que descreveu as equações da relatividade geral, Einstein mostrou estar certo uma vez mais – e num laboratório muito mais extremo do que alguma vez poderia imaginar”, acrescenta o documento.
A equipa portuguesa envolvida nesta investigação conta com físicos da FEUP e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, integrados na unidade de investigação CENTRA (Centro de Astrofísica e Gravitação), em colaboração com cientistas franceses e alemães.
São responsáveis pelo desenho, construção e validação da câmara de infravermelhos do GRAVITY, que combina quatro telescópios gigantes, cada um com um espelho de oito metros de diâmetro, que, em conjunto, funcionam como um telescópio de aproximadamente 130 metros.
Este instrumento permite realizar várias medições em tempo real, de modo que o instrumento aponte para o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea e se mantenha precisamente nesta posição durante as observações.