Três meses depois do Tribunal de Contas dar luz verde ao Projeto de Renda Acessível previsto para a Rua de São Lázaro, na encosta que liga o Martim Moniz ao Campo dos Mártires da Pátria, a Câmara de Lisboa revela as primeiras imagens do conjunto de 16 edifícios, nos quais vão nascer 131 imóveis (103 casas de renda acessível) divididos em tipologias T0, T1 e T2, com rendas entre os 100 e os de 350€.
Pela sua centralidade e dimensão, diz a CML, é uma das “âncoras” da estratégia do município para repovoar e reviver Lisboa.
O prazo de conclusão da obra é de 36 meses, após a desocupação total do espaço – o que ainda não aconteceu. E que se arrasta no tempo. Já em 2016, os comerciantes da Rua de São Lázaro se mostravam indignados por terem de abandonar as suas lojas para ali nascerem habitações a preços reduzidos. Dois anos depois, a Associação Comércio Tradicional Rua de São Lázaro, na freguesia de Santa Maria Maior, criticava a atitude da autarquia de não negociar, “mas sim a impor o abandono das lojas que ocupavam há décadas” em troca de indemnizações “ridículas”.
A autarquia, na Assembleia Municipal, veio a reconhecer, ainda em 2018, ter encontrado uma “solução para um número já importante de arrendatários e ocupantes precários” e prosseguiam as reuniões relativamente aos restantes.
Com a desocupação dos espaços comerciais atuais, prevista para os próximos meses, será possível a renovação dos pisos térreos dos novos edifícios, permitindo a construção de espaços comerciais e a abertura de “áreas de logradouros de uso comum para as famílias”.
É um passo em frente no caminho traçado por Fernando Medina na área da habitação, que assenta em ter mais gente a viver no centro da cidade, “mais jovens, mais classes médias”, como frisa autarca, de forma a reduzir os movimentos pendulares e, consequentemente, a poluição, mas que, no entanto, tem encontrado resistência.
Não só por parte dos proprietários privados, que se revelaram renitentes ao Programa Renda Segura, que arrancou a 18 de maio e terminou, a 30 de junho, com 337 candidaturas (45 de alojamento local) como, neste caso, do próprio Tribunal de Contas (TdC).
Em janeiro de 2019, esta instituição recusou o visto prévio a este projeto da Câmara de Lisboa devido ao contrato de construção e reabilitação dos imóveis celebrado entre o município e a empresa Neonsmiles, no valor de dez milhões de euros, para a recuperação dos 16 imóveis. O chumbo foi justificado com o facto do contrato em causa se tratar de uma Parceria Público Privada e não de um “contrato de concessão”.
A CML, face a esta decisão, apresentou recurso, considerando que o projeto era “absolutamente crucial para assegurar habitação para as classes médias” e que “não podia ser comprometido por questões de natureza burocrática e administrativa”. O braço de ferro, que se arrastou durante mais de um ano, terminaria em abril de 2020 com o TdC a dar razão ao recurso apresentado pela CML e a conceder o visto prévio (emitido sem qualquer recomendação à autarquia) ao Contrato de Concessão.
O projeto previsto para a Rua Gomes Freire, em Arroios, também no âmbito do Programa de Renda Acessível, passou por uma situação semelhante no final de 2019, quando o TdC emitiu o visto prévio, depois de o ter colocado em stand by por considerar que o modelo encontrado pela CML era uma parceria público-privada que não seguia “minimamente as rigorosas exigências do regime jurídico” das PPP, e que havia um “conjunto de vantagens contratuais para a concessionária” e “uma repartição de riscos desfavorável para o ente público”.
Com os projetos desbloqueados, Fernando Medina tenta aproximar-se do objetivo de 6 mil casas com “valores comportáveis pelas famílias”, que definiu para este mandato. No entanto, só no primeiro sorteio para a atribuição de 120 casas de renda acessível, a 12 de março de 2020, houve 3170 candidaturas.
Segundo a CML, das 120 casas que foram a concurso, 20 estão situadas num edifício da Rua Eduardo Bairrada, na Ajuda, que estava alocado a renda social e que a câmara reabilitou nos últimos meses. Os restantes imóveis estão dispersos por várias zonas da capital: como seja nas torres do Alto da Eira, na Mouraria, em Campolide, Campo de Ourique, Avenidas Novas, Alcântara e em bairros municipais de Marvila, Olivais, Parque das Nações, Lumiar, Beato e Benfica.
O lançamento de um novo concurso está previsto ainda este mês.