A atriz, encenadora e professora Fernanda Lapa, figura marcante da representação em Portugal para quem o teatro serve para criar beleza, provocar o público e fazer perguntas sem dar respostas, morreu esta quinta-feira em Cascais, onde estava hospitalizada, anunciou a companhia de teatro Escola de Mulheres. Tinha 77 anos.

“É com profundo pesar e imensa tristeza que a Escola de Mulheres comunica a morte de Fernanda Lapa, diretora artística desta companhia desde a sua fundação, em 1995”, escreveu a companhia num comunicado à imprensa, ao início a manhã. Horas depois, informou que o velório de Fernanda Lapa estava marcado para sexta-feira a partir das 17h00 no espaço Escola de Mulheres, na Rua Alexandre Braga, em Lisboa, e que a cremação aconteceria no sábado no Centro Funerário de Cascais, em Alcabideche, às 18h00. “Por vontade da família, apelamos a todos aqueles que queiram enviar flores que em vez disso enviem um donativo para a família do ator, recentemente assassinado, Bruno Candé Marques”, informou a Escola de Mulheres.

Ao longo de quase 60 anos de vida profissional, Fernanda Lapa tornou-se uma figura de referência pela forma inovadora de fazer teatro. Influenciou gerações de artistas e manteve uma atividade cívica constante na defesa de direitos das mulheres e na reivindicação de condições de trabalho para os criadores portugueses.

Trabalhou textos de Almada Negreiros, Jean Cocteau, Eurípides, Strindberg e Bernardo Santareno, entre outros, e revelou em Portugal autoras como Caryl Churchill, Paula Vogel e Timberlake Wertenbaker. Dirigiu nomes fortes do teatro como Maria José, Lourdes Norberto, Lia Gama, Rui Mendes, Glória de Matos, Sinde Filipe e Cucha Carvalheiro, entre muitos outros, e colaborou em criações do coreógrafo Francisco Camacho. “Exijo muito dos atores. Não é fácil, sou uma chata”, disse em janeiro último, em entrevista ao Observador.

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Várias vezes premiada, incluindo com a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura em 2005, continuava no ativo e coordenava até agora as comemorações do centenário do nascimento do escritor e dramaturgo Bernardo Santareno, que se assinala em 2020 e de quem a Escola de Mulheres vai levar a cena, previsivelmente em novembro, a obra O Punho, com versão cénica da própria Fernanda Lapa. Em janeiro tinha estreado no Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, a peça Sem Flores Nem Coroas, de Orlando Costa (pai do atual primeiro-ministro, António Costa, e amigo de longa data de Fernanda Lapa). Foi a última criação que levou a cena em vida.

Fernanda Lapa: “Há algo de utópico e idealista em mim”

Filha de Fernando Santos Lapa e de Maria Palmira Mamede de Pádua, e irmã da também atriz São José Lapa, nasceu a 11 de maio de 1943 na Junqueira, em Lisboa. É reconhecida “pelo extremo cuidado posto no trabalho dramatúrgico, na criação de universos cénicos envolventes e sobretudo na rigorosa direção de atores”, escreveram em 2006 as investigadoras Maria Helena Serôdio e Sebastiana Fadda na revista teatral Sinais de Cena. Acrescentaram: “É uma mulher elegantíssima, exigente, combativa, que desafia rotinas e ideias feitas.”

Estudou no Colégio de Santa Maria de Belém e em 1962 passou pelo Teatro dos Alunos Universitários de Lisboa (TAUL), integrando no ano seguinte o núcleo fundador da Casa da Comédia, companhia de vanguarda na década de 60 em Portugal, ao lado de Maria do Céu Guerra, Manuela de Freitas, Norberto Barroca e outros jovens artistas.

A peça Medeia é Bom Rapaz valeu-lhe distinções em 1992 e foi remontada em 2018 (©JOSÉ MANUEL MARQUES)

“O teatro que faz a pergunta e dá a resposta não me interessa”

Foi na Casa da Comédia que se iniciou como atriz profissional, com Deseja-se Mulher, um texto célebre de Almada Negreiros encenado por Fernando Amado. Tinha 20 anos. Nove anos depois, em 1972, aquele mesmo texto serviu-lhe para a estreia como encenadora, mas essa experiência foi difícil e muitas décadas depois continuava a ser recordada com reticências: “Achei que poderia encenar, que tinha percebido o que o Almada queria. Não correu mal, mas jurei para nunca mais”, referiu em entrevista ao Observador publicada em janeiro último.

Fez o curso de assistente social no Instituto Superior de Serviço Social, em Lisboa, e trabalhou durante uma década na reabilitação de cegos na Fundação Sain, onde conheceu o médico e psicólogo António Martinho do Rosário, que ficou na história com o pseudónimo literário Bernardo Santareno.

Decidiu aderir ao Partido Comunista em 1978, mas considerava-se nos últimos anos uma militante pouco interventiva. “As minhas escolhas é que me fizeram lá chegar”, disse ao Observador, em janeiro. “A perceção do mundo em que vivia, ter trabalhado muitos anos em reabilitação de cegos, com o Santareno, ter visto os estropiados que vinham da Guerra Colonial, ter participado nas greves académicas na Faculdade de Letras. Fui abrindo os olhos para o que me rodeava.”

Professora e diretora do conselho do departamento de artes cénicas da Universidade de Évora até agosto de 2012, e de onde se reformou, também deu aulas na Escola Profissional de Teatro de Cascais e na Universidade Intergeracional (UNIESTE).

Autora da mensagem do Dia Mundial do Teatro deste ano, a convite da Sociedade Portuguesa de Autores, defendeu que se exija um plano de desenvolvimento teatral com futuro e que se aposte na força do teatro para as transformações que a atualidade exige. No mesmo texto explicava por que motivo se escolhe ser dramaturgo. “Esta opção traz implícitas muitas consequências e uma delas é que o homem de teatro necessita do público de uma maneira carnal, pois o teatro é, em si mesmo, a expressão artística mais carnal de todas, uma expressão em que o verbo ou a sugestão ou a situação emocional elaborada pelo autor, tem de ser encarnada por um ator, que cada vez que a peça está no palco a diz ao vivo para um público vivo”, sustentou.

Mãe de três filhas, uma das quais perdeu em 2001 (a bailarina e coreógrafa Mónica Lapa), manteve uma intervenção cívica em torno de direitos das mulheres, mas nem sempre aceitou ser classificada como feminista. Durante mais de 25 anos dirigiu a companhia teatral lisboeta Escola de Mulheres — que criou juntamente com Isabel Medina, Cucha Carvalheiro, Cristina Carvalhal, Aida Soutullo,
Conceição Cabrita e Marta Lapa — com o propósito de divulgar a criação e a escrita teatral feminina.

“Ao longo dos séculos, a voz das mulheres foi silenciada em várias áreas, e também na Cultura, e não vale a pena escamotear esta realidade. Sofremos, ainda, as sequelas dessas mordaças, embora muito se tenha avançado, a partir do 25 de Abril em Portugal, pela luta das forças progressistas, mas sobretudo das próprias mulheres e das suas organizações”, afirmou.

Através de uma bolsa da então Secretaria de Estado da Cultura, em cujo processo de candidatura apresentou cartas de recomendação de Bernardo Santareno, José Gomes Ferreira e Miguel Tamen, Fernanda Lapa viajou até à Polónia em 1979 e aí frequentou a Escola Superior de Encenação de Varsóvia. Nesta escola diplomou-se em encenação e realizou a seguir estágios no Teatro Laboratório de Grotowski, no Teatro Contemporâneo de Wroclaw e no Teatro Stary de Cracóvia.

“Era um país cheio de traumas, foi retalhado pelos franceses, pelos alemães, pelo russos”, recordou recentemente. “Penso que do ponto de vista político eram todos muito conservadores e, no entanto, vi grandes espetáculos. Também tinham tradição e condições financeiras para isso. Vi teatro com condições excelentes, bem apetrechados.”

Em 1992 Fernanda Lapa venceu o Prémio Se7e de Ouro para a Melhor Encenação e o Prémio da Associação Portuguesa de Críticos de Teatro com Medeia é Bom Rapaz, de Luis Riaza, espetáculo de grande repercussão pública apresentado no extinto Teatro do Século, em Lisboa, com João Grosso e Rogério Samora (remontado em 2018, com André Leitão e Ruy Malheiro). Foi-lhe também entregue o prémio especial Procópio em 1999 e o Globo de Ouro da SIC para Melhor Espetáculo por A Mais Velha Profissão, em 2005.

No cinema, teve papéis em A Recompensa (1978), de Arthur Duarte; Rosa Negra (1992), de Margarida Gil; O Pai (1997), de Luís Filipe Costa; ou O Mistério da Estrada de Sintra (2007), de Jorge Paixão da Costa.

Também trabalhou em televisão. Por exemplo, em 2001 na série da RTP O Processo dos Távoras (escrita por Francisco Moita Flores) e onde também entraram Henrique Viana, João d’Ávila, Júlio Cardoso, Lia Gama, Canto e Castro e João Lagarto, ou ainda em 2006 na telenovela da TVI Doce Fugitiva.

O teatro “é uma arte muito perseguida, sempre o foi ao longo da história”, disse Fernanda Lapa no início deste ano. “Penso que o teatro serve para as pessoas terem momentos de prazer estético e para colocar questões, mas sem dar respostas. O teatro que faz a pergunta e dá a resposta não me interessa. Não deve perder de vista que há uma ideia e há uma provocação. Provocar o pensamento crítico do espectador, provocar reações, emoções, mas não fazer adormecer o público numa espécie de sonho bonitinho, sem que o público leve alguma coisa para casa. Isso não é nada comigo.”

Fernanda Lapa “foi uma das primeiras mulheres no espaço dos grandes encenadores de teatro”, comentou André Teodósio (©JOÃO MIGUEL RODRIGUES)

Ministra da Cultura: “Deixa um legado de paixão e dedicação”

A ministra da Cultura, Graça Fonseca, lamentou a morte de Fernanda Lapa, que classificou como uma “figura ímpar da história do teatro português nos últimos 50 anos”. Numa publicação na rede social Twitter, o Ministério da Cultura salientou que Fernanda Lapa deu, através do seu trabalho, “oportunidade, palco e voz às mulheres na representação”.

Numa nota de pesar enviada à imprensa ao fim da manhã de quinta-feira, Graça Fonseca acrescentou que a artista “deixa um legado de paixão e dedicação, que deve sempre ser continuado”. Foi “alguém que constantemente se transformou pela arte e, também, com arte, transformou o teatro português e, com ele, um pouco de nós”, acrescentou a nota da ministra da Cultura.

André e. Teodósio: “Não há quem possa fazer teatro sem o fazer com coisas que aprendeu com a Fernanda”

André e. Teodósio, um dos responsáveis pelo grupo Teatro Praga, lembrou esta quinta-feira que Fernanda Lapa “foi uma das primeiras mulheres no espaço dos grandes encenadores de teatro e foi impulsionadora do teatro contemporâneo”. Acrescentou: “Uma pessoa sempre muito generosa, atravessou vários tipos de teatro, estudou no estrangeiro, conseguiu trazer várias coisas para Portugal que não existiam, sempre partilhou com toda a gente os seus conhecimentos e investiu em pessoas novas.”

À Rádio Observador, o ator e encenador recordou que Fernanda Lapa “foi das primeiras pessoas” que o contrataram para trabalhar, para um espetáculo no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. “Eu sabia muito pouco de teatro. Ela sempre a partilhar, a investir nas pessoas, quer as conhecesse quer não. Partilhava o seu conhecimento como uma enorme dádiva, foi uma figura ímpar e muito importante no teatro em Portugal.”

André Teodósio: “Fernanda Lapa lutou contra um mar de homens encenadores”

Além do teatro, Fernanda Lapa teve também uma presença importante na televisão. André e. Teodósio recorda que isso lhe deu visibilidade e mediatismo, o que a atriz e encenadora usou de forma ativista. “Reivindicava os direitos dos artistas, os estatutos, o investimento na arte. Era uma pessoa fundamental no panorama, estava cheia de projetos, ainda agora estava a celebrar, dentro daquilo que eram os seus interesses, um autor marginalizado ao longo de história, Bernardo Santareno. Sempre teve interesse por linguagens e artistas diferentes. Foi uma grande encenadora que lutou contra um grande mar de homens encenadores para marcar o seu nome e fez uma companhia, chamada Escola de Mulheres. O seu legado é imenso e tocou várias pessoas de várias gerações. Não há quem possa fazer teatro sem o fazer com coisas que aprendeu com a Fernanda, mesmo que não o diga diretamente. É algo que está inscrito nos corpos, na forma de dizer o texto, na sua maneira de pensar os espetáculos”.

Beatriz Batarda: “Será sempre moderna, provocadora, desafiante”

Maria do Céu Guerra: “Sempre leal, sempre talentosa, sempre trabalhadora”

“Estreei-me com a Fernanda Lapa na Casa da Comédia em 1963”, lembra Maria do Céu Guerra. “Éramos as duas muita meninas, fomos amigas toda a vida. Era uma mulher muito séria, muito talentosa e sobretudo muito igual a si própria. Nunca a vi cometer uma desonestidade, uma coisa menos clara. O trabalho dela foi sempre no mesmo sentido, o sentido era o da cultura acima de tudo, a investigação acima de tudo, o ensino, por onde ela passou, a lealdade para com aqueles em quem ela confiava e a desconfiança em relação àqueles de quem ela desconfiava.”

Maria do Céu Guerra: “Fomos amigas toda a vida”

Nas palavras de Maria do Céu Guerra, Fernanda Lapa “nunca transigiu, foi uma pessoa sempre leal, sempre talentosa, sempre trabalhadora, empreendedora, deixa um grande espaço, um exemplo de lealdade e de qualidade.” “Estou muito chocada com isto. É um grande desgosto”, reagiu.

“Pertenceu à Barraca, grupo que eu fundei”, recordou Maria do Céu Guerra. “Nos primeiros anos deu-nos muito companheirismo, muita alegria, trabalhámos, criámos…. Mais tarde, trabalhei novamente com ela na Barraca, já como encenadora e também foi uma experiência muito boa.”

Ruy Malheiro, diretor de produção da Escola de Mulheres: “Deixa-nos um pilar da história do teatro em Portugal”

Ruy Malheiro, ator e atual diretor de produção da Escola de Mulheres, recordou-a como “uma atriz e encenadora fantástica”. Seguro de que “deixa um legado inegável no panorama da história do teatro em Portugal e da cultura em geral”, lembrou a responsável máxima pela Escola de Mulheres como “uma diretora de atores de excelência”. “Era o que ela mais gostava de fazer: encenar e dirigir espetáculos, não obstante ter um percurso muito singular também em televisão e em cinema”, acrescentou.

Ruy Malheiro: “Deixa-nos um pilar da história do teatro nacional”

“Trabalhar ao lado da Fernanda foi sempre muito, muito, muito especial. Uma grande amiga, uma grande parceira, uma grande lutadora, desde sempre lutou pelos direitos das mulheres em particular, das pessoas em geral, das pessoas da artes. Deixa-nos um pilar da história do teatro em Portugal”, disse Ruy Malheiro.

Marcelo Rebelo de Sousa: “Militante teatral, inconformada”

O Presidente da República lamentou a morte de Fernanda Lapa, enaltecendo a sua “voz interventiva nas questões do teatro, da cultura e da intervenção cívica”. Numa mensagem publicada no site da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa enviou sentidas condolências à família e assinalou que Fernanda Lapa teve uma “longa e ativa carreira como atriz, encenadora, professora e militante teatral, inconformada” com o, citando palavras da própria, “‘papel de subalternidade a que a mulher tem sido reduzida no teatro português’”.

O chefe do Estado assinalou o “importante projeto como a Casa da Comédia, com Fernando Amado nos anos 1960”, e a “companhia Escola de Mulheres, de que foi uma das fundadoras, em 1995”. “Um dos seus legados, com a Escola de Mulheres, é o trabalho constante sobre textos de ou sobre mulheres, desde os clássicos da Antiguidade (como Medeia) até autoras contemporâneas como Caryl Churchill ou Paula Vogel”, destacou.

Nos últimos tempos, sublinhou ainda o Presidente da República, Fernanda Lapa coordenou “as comemorações do centenário de Bernardo Santareno, de quem foi aluna e amiga”, defendendo que a atriz “nunca deixou de ser uma voz interventiva nas questões do teatro, da cultura e da intervenção cívica”.

PCP: “Ligação à luta dos trabalhadores até ao fim”

O Partido Comunista Português manifestou “profundo pesar” pela morte de Fernanda Lapa e enalteceu que a “ligação” da atriz “à batalha pela igualdade remonta ao período da ditadura fascista”. “A sua ligação à luta dos trabalhadores, à defesa da cultura, à causa da liberdade, da democracia e do socialismo estiveram presentes até ao fim da sua vida”, sublinhou o partido, segundo o qual a “generosidade militante” de Fernanda Lapa a levou em março último, quando da comemoração em Lisboa dos 99 anos do partido, a declamar o poema de José Carlos Ary dos Santos “A Bandeira Comunista”.

Um comunicado do secretariado do Comité Central do PCP, citado pela agência Lusa, assinalou a criação da Escola de Mulheres, que “deu expressão no teatro a uma das batalhas de Fernanda Lapa: a da igualdade entre mulheres e homens, no teatro e na vida”.

“A atriz e encenadora foi dirigente do Sindicato dos Trabalhadores do Espetáculo, durante vários mandatos, bem como do Movimento Democrático de Mulheres”, destacou o PCP, informando que a artista militou no partido a partir de 1978 e que “toda a sua militância, ativa, presente e empenhada, de grande dedicação ao partido, foi feita no Setor Intelectual da Organização Regional de Lisboa”.

A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, publicou uma mensagem nas redes sociais a sublinhar o papel de Fernanda Lapa na afirmação da voz das mulheres “num mundo ainda de homens”.

Figuras públicas e instituições reagiram. “Vulto incontornável da cena teatral em Portugal”, disse Diogo Infante

Ao longo do dia, colegas, figuras públicas e diversas instituições e estruturas artísticas partilharam comentários sobre a morte de Fernanda Lapa. Atores muito mais jovens do que a artista utilizaram as redes sociais para expressar condolências, testemunhando que se sentem influenciados pelo seu legado.

Citado pela agência Lusa, o ator Nuno Lopes lamentou os “dias cada vez mais tristes”, enquanto a atriz e encenadora Susana Arrais agradeceu a Lapa por tudo o que fez por si “como aluna, como atriz, como mulher em Portugal”.

“Foi cedo para partires”, escreveu o ator Ruy de Carvalho na rede social Instagram. A mensagem emotiva fazia referência à morte de vários atores nos últimos meses. “Mas que ano terrível… Eras ainda uma miúda, Fernanda, quando te conheci…
tu e a tua querida irmã São José Lapa. Conhecia-te há mais de seis décadas…
É muito tempo… Foi cedo para partires.”

Alexandra Lencastre saudou a “querida, maravilhosa, talentosa, generosa Fernanda”, que fará “tanta falta”, enquanto Diogo Infante enalteceu o “vulto incontornável da cena teatral em Portugal”.

O diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II, Tiago Rodrigues, considerou que se perdeu “uma extraordinária artista e um exemplo de integridade”. Já o realizador Vicente Alves do Ó, também citado pela Lusa,  afirmou que “o país perdeu um tesouro” e o secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, Nuno Artur Silva, falou em “talento e integridade”.

Com “profunda tristeza, reconhecimento e admiração pela pessoa, personalidade e labor artístico de Fernanda Lapa”, a equipa da Companhia de Teatro de Braga partilhou que foi “com total incredulidade” que leu a notícia da morte da encenadora e atriz. “Será com mais vontade e determinação, agora também em sua memória, que a CTB continuará a comemorar Bernardo Santareno. Está neste momento a decorrer uma ação nesse contexto (hoje mesmo terá lugar uma sessão). Trata-se da Leitura Encenada do ‘Crime da Aldeia Velha’, com 20 participantes e dirigida pelo Philippe Leroux. Será um momento de Homenagem e saudade à Memória de Fernanda Lapa a um dos seus últimos projetos: a Comemoração Nacional do Centenário do nascimento de Bernardo Santareno”, lê-se na nota da CTB.

No Instagram, a atriz Beatriz Batarda disse que Fernanada Lapa “foi uma mulher que soube ocupar o seu corpo e o seu espaço” e “sabia que seguir o caminho artiístico é o mesmo que escolher uma vida de luta, entre a resistência e a resiliência, entre a gratidão e a transgressão, entre a generosidade e a perda, a paixão e a solidão”, o que “não é para todos”. Referiu-se à artista como uma pessoa ensinava os atores “zangada”: “Zangada com a mediania e a leviandade”.

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Havia dias que, de um cigarro para o outro, rabujávamos junto ao portão da escola. Rabujávamos porque partilhávamos o mesmo amor pelos jovens alunos de teatro, porque aspirávamos que fossem mais rijos, mais determinados, mais certeiros nas razões pelas quais são movidos. Porque a Fernanda sabia que seguir o caminho artístico é o mesmo que escolher uma vida de luta, entre a resistência e a resiliência, entre a gratidão e a transgressão, entre a generosidade e a perda, a paixão e a solidão. E isso não é para todos. Mas é nosso dever prepará-los, dizíamos entre cigarros. A Fernanda foi uma mulher que soube ocupar o seu corpo e o seu espaço. Cheia. A representar era irreverente, sempre quente. As suas encenações transpiravam o rigor e respeito que a herança secular de quem faz Teatro obriga . Ensinava zangada. Zangada com a mediania e a leviandade, zangada porque transbordava de paixão. Serás sempre moderna, provocadora, desafiante

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Na mesma rede social, Albano Jerónimo dirigiu-se à atriz para dizer “obrigado”, destacando a “eterna luta de um teatro no feminino” e a “personalidade arrebatadora”. “Obrigado por me teres oferecido o primeiro bombom em teatro (foram sete personagens num espetáculo) em formato de Valsa de Baltimore da Paula Vogel”, escreveu, referindo-se à peça dirigida por Fernanda Lapa e apresentada em 2004 no Teatro da Comuna, em Lisboa, em que contracenou com Carla Chambel  e Pedro Carmo.

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A Plateia — Profissionais de Artes Cénicas manifestou “profundo pesar” pela morte de Fernanda Lapa, “figura incontornável do teatro português, imagem de luta e resistência e de profundo amor e dedicação à arte teatral”. “Esteve sempre, até ao fim, dedicada à procura de melhores e mais justas condições de trabalho na cultura”, salientou a estrutura.

O recém-criado Movimento pelos Profissionais das Artes Performativas considerou que não se pode “deixar passar em branco a triste notícia, para o setor da cultura em Portugal, da morte, de quem muito contribuiu para o teatro em Portugal”.

A Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC) de Lisboa lamentou “profundamente” a morte de Fernanda Lapa e referiu-se a ela como “nome maior do teatro português”.

Ouvido pela Rádio Observador, o ator João d’Ávila disse lamentar “imenso” a morte de Fernanda Lapa. “Éramos colegas, além disso éramos amigos. Era uma pessoa muito importante no teatro português.”