O julgamento dos recursos das coimas de 225 milhões de euros aplicadas pelo regulador a 12 bancos por troca de informação com impacto no crédito a clientes começou esta quarta-feira, com os bancos visados a insistirem na nulidade da prova.

Nas exposições introdutórias que marcaram o início do julgamento dos recursos interpostos por 10 bancos, no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, às coimas aplicadas, em setembro de 2019, pela Autoridade da Concorrência (AdC), esta reafirmou os termos da condenação administrativa, que deu como provada a troca, entre os visados, de informação sensível, durante mais de 10 anos (de maio de 2002 a março de 2013), relativa aos preços a praticar nos créditos à habitação, ao consumo e às empresas.

Tal como o BPI havia suscitado há um mês, na sessão preparatória do julgamento, os mandatários dos bancos visados insistiram na nulidade da prova, invocando a jurisprudência que considerou inconstitucional a apreensão de correio eletrónico em processos contraordenacionais, assunto sobre o qual o TCRS apenas se pronunciará na fase final do julgamento.

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Várias defesas afirmaram ir provar, durante o julgamento, que a informação relativa aos spreads a aplicar nos créditos a conceder foi trocada entre funcionários que não tinham qualquer poder de decisão, que recorriam a essa prática em vez de fazerem consulta à informação disponível ou recorrerem a clientes mistério.

Referiram, ainda, que o processo de alteração dos spreads é “longo e complexo”, dependendo de muitas variáveis, minimizando a relevância da informação alvo do processo movido pela AdC e contestando que esta não tenha procedido a uma análise dos efeitos nem do contexto económico-jurídico, que, nomeadamente, enquadrasse o período da crise financeira de 2008.

A AdC exibiu um gráfico com as subidas dos spreads aplicados aos créditos, que atribuiu à necessidade de compensar a queda abrupta da taxa Euribor, salientando que foi precisamente a partir dessa altura que se intensificou a troca de informação relativa aos spreads a praticar por cada instituição.

Para o mandatário da AdC Henrique Salinas, neste tipo de infração a conduta é suficiente só por si, não implicando a existência de um resultado.

O processo, que nasceu em 2012, a partir de uma denúncia apresentada pelo Barclays, o qual veio a beneficiar da dispensa total do pagamento da coima (clemência), deu origem à condenação de 14 bancos por prática concertada de troca de informação comercial sensível, entre 2002 e 2013, nomeadamente com partilha de tabelas de spreads a aplicar aos créditos a clientes.

Na decisão conhecida em setembro de 2019, a AdC condenou a Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, a Caixa Económica Montepio Geral (CEMG) em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo em 350.000 euros cada um, a Union de Créditos Inmobiliarios em 150.000 e o Banif em mil euros.

A Abanca, também visada no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa.

Na sessão desta quarta-feira, o advogado do Banco BIC Portugal Alberto Saavedra questionou que a instituição tenha sido condenada por atos praticados pelo BPN, banco de que adquiriu ativos e que “morreu, e com ele a responsabilidade criminal”.

Também a mandatária do BES Liliana Santos referiu o facto de este estar insolvente, depois de uma “alteração profunda e irreversível que equivale à morte de uma pessoa física”, pelo que, defendeu, “a responsabilidade deveria ter sido extinta”.

Vários dos mandatários referiram ainda a “perplexidade” perante o montante das coimas, questionando ainda que, no seu cálculo, a AdC tivesse tido em conta o volume de negócios de 2018.