O professor da disciplina de Bioética e Deontologia Médica do mestrado integrado em Medicina, no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto, disse numa aula aos seus alunos que os homossexuais são proibidos de dar sangue porque podem transmitir a sua homossexualidade através de um gene.

A aula foi gravada e o excerto em que o professor faz esta afirmação foi reproduzido num vídeo na rede social Twitter por uma conta recém criada e com poucos seguidores. O vídeo de 1 minuto e 46 segundos mostra o slide de uma apresentação sobre “Sexualidade e Ética” e ouve-se a voz do professor, que pede para “fazer um parêntesis para clarificar uma coisa”, uma vez que está a ser discutida uma alteração à lei para permitir os homossexuais de doarem sangue.

A alguns destes indivíduos homossexuais, não lhes foi permitido doar sangue porque alguns são portadores de um gene que podem transmitir a sua homossexualidade aos seus netos e têm de ser afastados” [sic], afirma o professor, sem se perceber como é que um dador de sangue transmite o que for a um neto.

“Não é pelo facto de um indivíduo ser homossexual que não pode dar sangue, de facto isso não faria sentido nenhum. Dar sangue é dar vida a outras pessoas e um potencial de doenças”, prossegue o professor, dando exemplos como doenças a Hepatite.

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Nos comentários ao vídeo que refere que a aula foi lecionada em setembro de 2021 aparecem ex-alunos a acusar a informação de falsidade, argumentando tratar-se de uma “montagem”. No entanto, contactada pelo Observador, a Universidade do Porto admite a sua veracidade, não se tratando sequer de uma praxe, como outros comentários sugerem.

Apesar de ter sido alertada pela comunicação social e de não ter recebido qualquer queixa, a universidade refere que “iniciou de imediato uma série de procedimentos no sentido de verificar a veracidade do vídeo publicado nas redes sociais”.

Desta averiguação, foi possível confirmar que o vídeo retrata um momento da aula de 30 de setembro da disciplina de Bioética e Deontologia Médica do Mestrado Integrado em Medicina, lecionado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS)”, lê-se na resposta escrita.

No entanto, prosseguem, depois de falarem com o professor em causa receberam como justificação o argumento de que “o excerto retratado no vídeo é resultado de uma incorreta formulação na sua exposição sobre a diferença entre a abordagem ética e legal a diferentes atos médicos”.

Ainda assim, a Universidade reconhece que “as expressões utilizadas foram suscetíveis de criar interpretações” e que o próprio docente “reconheceu a importância de se explicar perante os estudantes”. Pelo que iria fazê-lo na aula desta quinta-feira.

A Universidade do Porto lembra que faz parte dos regulamentos internos não praticar “atos de discriminação, nomeadamente, com base no seu estatuto universitário e social, idade, sexo, condição física, nacionalidade, origem étnica, cultura, religião ou orientação sexual”.

A resposta enviada respondeu às perguntas do Observador sobre a veracidade do vídeo e sobre possíveis consequências para o professor em questão.

Doação de sangue. Orientação sexual deixa de ser critério de exclusão

A Direção Geral de Saúde emitiu uma norma em março para que a orientação sexual deixasse de ser um critério de exclusão quando se seleciona quem pode ou não ser dador.

João Rodrigues, ex-aluno do ICBAS, médico e ativista LGBTI assinou um comunicado com duas outras ativistas Luísa Russo e Inês Matos em que pedem que ao governo que assuma “a responsabilidade de promover  um ensino inclusivo e não discriminatório, que aborde direitos e saúde LGBTI e que foque a área da  sexologia”.

“A sexologia, como dimensão integral do ser humano, é também uma disciplina importante da  medicina. No entanto, o seu ensino é escasso e pobre. A situação é agravada em específico no contexto  de saúde LGBTI, sendo este um tópico genericamente ignorado em termos curriculares, transversalmente, ao longo de todo o curso, abordado de formas cientificamente incorretas e, infelizmente, muitas vezes  com juízos de valor por parte de docentes, proporcionando-se momentos de discriminação e LGBTIfóbicos  em sala de aula e em consulta”, escrevem, em reaçao à aula de Bioética e Deontologia Médica lecionada no ICBAS.

(artigo atualizad com comunicado de três ativistas LGBTI)