A primeira derrota em casa da temporada (logo contra o último classificado), múltiplas reações tendo como protagonista a pessoa de sempre: Sérgio Conceição. Depois de um daqueles jogos em que uma noite inteira podia não ser suficiente para marcar tantas foram as oportunidades falhadas, o técnico do FC Porto teve um discurso de choque que visou vários departamentos sem que o próprio tenha esclarecido para quem estava a falar de forma direta. Mais a frio, voltou a deixar “recados” para tudo e todos no plano interno tendo como mote o orgulho e dimensão dos azuis e brancos, recordando a história dos dragões na Champions como um dos clubes com mais presenças e projetando um encontro numa prova onde os portistas têm conseguido um trajeto mais regular do que na Primeira Liga, onde leva já duas derrotas em dez encontros realizados.

FC Porto vence Antuérpia com golos de Evanilson e Pepe e iguala Barcelona na liderança do grupo da Champios

“Andei dois dias com a cabeça baixa a olhar para o símbolo, porque temos de olhar para o símbolo e perceber que clube representamos. Não só quem lidera mas também todos os sócios, adeptos, simpatizantes. Temos de olhar para o que não fizemos com o Estoril. São jogos que deixam mossa, a mim deixam-me mossa, sem dormir, com dificuldade em ficar bem disposto. Não é difícil mas deixam-me pior ainda e transmito isso ao grupo. São situações que vivemos no balneário e que se vão atenuando com o passar das horas, com a preparação para o próximo jogo. Custa. Não sabemos qual é o jogo decisivo para se perder o Campeonato, que é o nosso principal objetivo. Jogando bem, muitíssimo bem, menos bem ou mal, não podemos perder pontos desta forma… Mas isso já é passado. Sem dúvida, temos de olhar para o jogo como um exemplo para sermos mais fortes nos próximos”, apontou o técnico do FC Porto, antes de deixar mais alguns “alertas”.

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“Sou exigente comigo primeiro e depois com os outros departamentos. Falei dos lesionados porque foi aquilo que naquele momento me veio à cabeça, em relação à nossa situação. Mas não era em relação ao doutor Nélson Puga, ou a quem dirige o departamento de análise e observação, ou à comunicação… Essa exigência existe aqui todos os dias. Tornei-a pública e isso é como falar dos jogadores. Sei que há coisas que têm de ser ditas no balneário mas às vezes por estratégia e liderança acho que o devo fazer publicamente. Mas isso sou eu, assumo essa responsabilidade. Não me venham cá é com redes sociais, a dizer que o departamento médico é que os mete a treinar e a jogar. Ando aqui há muitos anos e não preciso disso. A maior prova é que tive a possibilidade de sair e não saí num ano crítico. A cláusula era paga ao FC Porto mas tenho um grande respeito ao presidente e à instituição. Não é pelo dinheiro que estou aqui”, voltou a focar.

O mote para a redenção estava dado em termos internos mas havia pontos a corrigir olhando para o que se passou com o Estoril, a começar pela eficácia. “O futebol é simples, é fazer golos na baliza adversária e não sofrer. Tive um episódio na Académica, onde as coisas estavam difíceis… Achava que a dinâmica que tinham no treino era fantástica, havia grande disponibilidade, mobilidade, e nos jogos isso não acontecia. Os jogadores tremiam um bocadinho, escondiam-se do jogo… Achei que nos treinos estava a fazer algo errado, então fiz o contrário. Durante dois dias levámos as bolas para o campo mas os jogadores não tocavam na bola. Ganhámos 3-1 ou 4-1 nesse fim de semana. Quando queremos colocar velocidade no treino, metemos baliza, finalização. 70% dos exercícios que fazemos têm baliza, finalização. Se calhar vou fazer o contrário, vou tirar [a bola]. Com o Antuérpia na Bélgica, na primeira parte tivemos duas ou três ocasiões claras e não marcámos e na segunda fizemos vários e podíamos ter feito mais. É preciso trabalhar e perceber que estamos a finalizar pouco para o que criamos mas esse criar é o primeiro passo para o golo aparecer”, salientou.

Era nesse contexto que aparecia então a partida com o Antuérpia, num regresso à Liga dos Campeões onde os azuis e brancos se têm sentido bem mais confortáveis. “Ainda não descobri onde está esse chip, que chip é esse. Vocês perguntam sempre sobre esse chip… Não estou a falar dos tempos das vacas gordas mas estou aqui há sete anos. Trabalhamos de tal forma, com essa tal exigência, rigor e disciplina… Não estou a falar de mim, agora dou toda a moral a todos os departamentos. Trabalhamos para ganhar títulos. Este é o meu sétimo ano aqui e trabalha-se sempre da mesma forma. Houve um jogo em que devíamos ter sido mais competentes, houve erros que cometemos, mas nos jogos em que ganhámos na Liga dos Campeões também houve coisas a retificar. Faz parte da vida dos treinadores e dos jogadores. Não há chip para mudar, esse chip está metido a partir do momento em que assinamos contrato com este clube. Temos que dar ao pedal, seja contra o V. Guimarães, Antuérpia ou Vilar de Perdizes”, voltou a enfatizar na antecâmara.

Vontade não faltou, ao contrário da inspiração sobretudo na hora de finalizar. Esse foi o principal problema do FC Porto, que voltou a falhar uma daquelas exibições de arrebatar plateias mas criou as oportunidades mais do que suficientes para ganhar de forma sólida e até tranquila. Ao invés, em cima do minuto 90 e com mais um em campo, arriscou sofrer o empate após nova falha de David Carmo que motivou uma assobiadela bem audível no Dragão. Depois, mais uma vez, apareceu Pepe. O mesmo que tinha decidido quem marcava a grande penalidade colocando ordem na casa para não haver dúvidas, o mesmo que foi sempre dando várias instruções para a equipa estabilizar, o mesmo que foi à área contrária marcar de cabeça o 2-0 e tornar-se o mais velho de sempre a fazer um golo na Champions. Assim se fez história e evitaram males maiores, que podiam terminar com a queda do (David) Carmo e da (Santa) Trindade da dupla Pepê-Evanilson, de novo nos melhores momentos ofensivos dos azuis e brancos mas sem conseguir o golo que “fechasse” o jogo.

Ficha de jogo

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FC Porto-Antuérpia, 2-0

4.ª jornada do grupo H da Liga dos Campeões

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro: Maurizio Mariani (Itália)

FC Porto: Diogo Costa; João Mário, Pepe, David Carmo, Zaidu (Jorge Sánchez, 83′); Alan Varela, Eustáquio; André Franco (Danny Namaso, 83′), Pepê; Taremi (Francisco Conceição, 68′) e Evanilson (Fran Navarro, 83′)

Suplentes não utilizados: Cláudio Ramos, Fábio Cardoso, Grujic, Nico González, Romário Baró, Toni Martínez, Gonçalo Borges e Bernardo Folha

Treinador: Sérgio Conceição

Antuérpia: Lammens; Van den Bosch, De Laet (Bataille, 46′), Coulibaly, Wijndal (Corbanie, 68′); Yusuf, Vermeeren, Kerk (Ejuke, 75′); Ekkelenkamp, Balikwisha (Muja, 68′) e Ilenikhena (Janssen, 75′)

Suplentes não utilizados: De Wolf, Devalckeneer, Tuypens e Horemans

Treinador: Mark van Bommel

Golos: Evanilson (32′, g.p.) e Pepe (90+1′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Yussuf (20′), Vermeeren (45+2′), David Carmo (58′), Wijndal (62′) e Francisco Conceição (84′); cartão vermelho direto a Ekkelenkamp (50′)

Quando se pensava que o FC Porto ia aproveitar o embalo dos adeptos para partir para uma vantagem que desse outro conforto para o resto da partida, o Antuérpia soube controlar esse potencial ímpeto ofensivo sem grandes calafrios e criou até a primeira oportunidade do encontro com Balikwisha a surgir em boa posição isolado na área após uma perda de bola em zona proibida de Alan Varela para rematar com perigo ao lado (8′). André Franco, de novo titular em movimentos da direita para o meio para abrir espaço às subidas de João Mário, e Zaidu, de regresso às opções após uma ausência de quase dois meses, eram duas das unidades que mais tentavam agitar o jogo ofensivo dos dragões mas o penúltimo e o último passe continuavam a falhar entre os reparos de Sérgio Conceição, sendo que o primeiro lance de perigo dos azuis e brancos nasceu de uma zona de pressão mais alta aproveitando um erro do guarda-redes Lammens perante o condicionamento de Taremi para André Franco fazer a assistência e Evanilson, sozinho na área, rematar ao lado (15′).

Os belgas pressionavam de forma agressiva, os portistas levavam já dois foras de jogo como nas outras três partidas juntas da Liga dos Campeões mas era notório que, com bola pelo chão, mobilidade e velocidade, eram melhores do que o adversário. Faltava esse salto da teoria para a prática, com o domínio a falhar depois na ligação ao último terço, deixando o encontro num duelo sem balizas. Com isso, e até ao final da primeira meia hora de jogo, Taremi foi o único a tentar visar a baliza de Lammens, primeiro num cabeceamento que saiu fraco após cruzamento largo de Zaidu da esquerda e depois num remate em posição privilegiada de pé esquerdo que passou ao lado num lance que seria anulado por fora de jogo. Todos percebiam a ansiedade do iraniano para que as coisas corressem bem e essa imagem ficaria bem patente uns minutos depois.

Num lance em que o FC Porto conseguiu ganhar a bola no meio-campo contrário e Evanilson assistiu rápido Pepê para o remate travado por Lammens, Kerk empurrou Eustáquio na área e quase ofereceu um penálti desnecessário aos dragões. Entre os possíveis marcadores, com o capitão Pepe por perto a dar uma sentença final, a bola ficou nas mãos de Evanilson que inaugurou o marcador dando continuidade ao hat-trick que fizera na Bélgica (32′). Ao mesmo tempo, Pepê foi ter com Taremi e pediu calma ao avançado, a quem o brasileiro dedicou o 1-0 enganando Lammens. Os fantasmas da derrota com o Estoril estavam ainda presentes no relvado mas todos davam o mote para apagar esse percalço, com o número 9 cada vez mais envolvido nas ações ofensivas e a ter um remate perigoso às malhas laterais perto do intervalo (44′).

A segunda parte não trouxe grandes alterações em relação às características do primeiro tempo mas os minutos iniciais acabaram por dar um golpe quase fatal ao Antuérpia, com Ekkelenkamp a ter uma entrada mais dura à canela de Zaidu e a ver o cartão vermelho direto (52′). Como se não bastassem os dois médios já com cartões, Mark van Bommel perdia a terceira unidade que podia de quando em vez tentar desequilibrar em termos numéricos no corredor central e o FC Porto tinha a passadeira estendida para fazer o que quisesse do encontro. Nos minutos que se seguiram, não quis fazer muito. E até arriscou fazer ainda menos perante mais um erro de concentração de David Carmo, a ir à queima num lance com Ilenikhena que só não valeu uma expulsão direta porque o avançado dos belgas estava ainda no seu meio-campo (58′).

Sérgio Conceição no banco e Pepe no relvado pediam à equipa para ter calma. Com velocidade em todos os seus movimentos, à procura das variações rápidas de corredores, mas com segurança em todos os momentos para não deixar espaços sem bola tendo mais unidade em campo. Houve ligeiras melhorias, pelo menos as suficientes para que o Antuérpia deixasse de ameaçar sequer chegar ao último terço, mas voltou aquela pecha da finalização em duas ocasiões, com Evanilson a receber de Pepê após mais uma grande jogada do brasileiro recebendo no espaço entre linhas mas a ver Lammens a defender o remate cruzado (72′) e André Franco a ter um desvio ao lado isolado na área após cruzamento de João Mário (76′). O FC Porto continuava a desperdiçar golos feitos, desta vez por André Franco (82′) e Pepê (89′), e ainda apanhou um susto numa bola em que David Carmo teve uma má abordagem a um passe em profundidade que deixou Muja sozinho a atirar ao lado (89′). Ouviram-se assobios, Pepe deu a volta: na sequência de um canto curto, Francisco Conceição cruzou da direita e o central marcou de cabeça ao segundo poste o 2-0 (90+1′).