A linha da meta estava na mesma direção que a linha do horizonte. O mar não é um mau lugar para se querer ser o primeiro a chegar. Gerben Thijssen, da Intermarché-Wanty, antecipou-se a todos na chegada à Avenida dos Descobrimentos, em Lagoa, e conquistou a segunda vitória num caminho, que ainda vai curto, mas onde se quer redimir. Antes do início de 2024, o belga não competia desde outubro. Corria-se o Tour de Guangxi, na China, e Thijssen achou por bem gravar publicar nas redes sociais o colega de equipa estónio, Madis Mihkels, a fazer olhos em bico, atitude que foi interpretada como um gesto discriminatório. Ambos foram afastados da corrida pela própria equipa e, mais tarde, a UCI obrigou-os ao pagamento de uma multa e a frequentarem um curso educacional.

Longe da altura do ano em que o Algarve é mais requisitado, o sul de Portugal tem promovido um encontro anual de estrelas onde se convencionou que pelotão é o outro nome dado a uma constelação que anda de bicicleta. Apesar de, nesta fase da época, ainda não estarem a brilhar ao melhor nível, o caminho abre-se para um ano em que o calendário, além das clássicas e das grandes voltas, também inclui na mira dos binóculos os Jogos Olímpicos. Apesar dos picos de maior interesse da temporada ainda estarem longe, a Volta ao Algarve era uma bela entrada para abrir o apetite.

A preparação faz-se a ritmos diferentes. Remco Evenepoel é a Ursa Maior do pelotão. “Adoro o Algarve”, confessou o belga que conquistou a prova em duas ocasiões (2020 e 2022) e procura chegar à terceira vitória na classificação geral, registo que apenas Belmiro Silva (1977, 1981 e 1984) atingiu. O ciclista da Soudal – Quick Step, que se vai estrear no Tour em 2024,  chegava à 50.ª edição da Volta ao Algarve depois de uma vitória ao seu estilo na Clássica da Figueira da Foz onde atacou a 55 quilómetros da meta e seguiu sozinho para a vitória. Porém, a primeira de cinco etapas (embora com Remco nunca se saiba o que esperar), previsivelmente, não era a mais propícia a um triunfo do corredor de 24 anos ao contrário das chegadas ao Alto da Fóia (quinta-feira), do contrarrelógio (sábado) e da chegada ao Alto do Malhão (domingo).

Wout van Aert, compatriota de Remco Evenepoel, também marca presença na Volta ao Algarve, ainda que com objetivos diferentes. Visando os principais objetivos da época, um dos maiores nomes da Team Visma/Lease a Bike, rebatizada Jumbo-Visma, prepara em Portugal o ataque à Volta à Flandres e a Paris-Roubaix. De olho nas clássicas, as aspirações do belga na prova nacional eram as etapas. “Vou escolher os meus dias. São várias grandes etapas e um contrarrelógio. Acima de tudo, espero voltar para casa com boas pernas e ótimas experiências”, disse Wout van Aert. Por sua vez, a INEOS, que trouxe Filippo Ganna e Thomas Pidcok, viu Geraint Thomas ser distinguido pela organização com o Prémio Prestígio ainda antes de se começar a pedalar.

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As primeira incidências da etapa que ligava Portimão a Lagos num traçado de 200 quilómetros com duas inócuas contagens de montanha, uma de quarta e outra de terceira categoria, e uma meta volante na Vila do Bispo, aconteceram ainda com percurso neutralizado com uma série de problemas mecânicos. No momento da partida real, a grande ausência era a de João Almeida (UAE Team Emirates), que também este ano vai tentar a sorte no Tour, devido a uma constipação que também o afastou da Clássica da Figueira. Iúri Leitão (Caja Rural), campeão mundial de omnium e campeão europeu de scratch, desfalcou o pelotão à última da hora,

Rui Costa, que também abdicou da Clássica da Figueira, regressou à competição na Volta ao Algarve depois de já ter estado em ação em Espanha durante o mês de janeiro. A primeira etapa também não era propriamente a ideal para o ciclista agora a representar a EF Education. Era esperada uma chegada ao sprint, mas, mesmo assim, houve quem arriscasse a fuga. Os sete corajosos foram Tobias Bayer (Alpecin Deceuninck), Fábio Costa (Feirense), Tomás Contte (Aviludo-Louletano), Diogo Narciso (LA Alumínios), Noah Campos (Kelly/Simoldes/Oliveirense), César Fonte (Boavista) e Gonçalo Amado (Mortágua).

Cabia à Arkéa, à Intermarché-Wanty e à Bora anularem a distância de três minutos para esse grupo para darem a Arnaud Démare, Gerben Thijssen e Jordi Meeus, respetivamente, em condições de disputarem a vitória. Noah Campos foi o primeiro a ser apanhado. O único que não se conformou em ser engolido foi  Tobias Bayer que sentiu, a 52 quilómetros do fim, ter energia para continuar a fuga a solo. Na meta volante de Vila do Bispo, Tomás Contte (quatro segundos) e César Fontes (dois segundos) fizeram um esforço extra para ficarem com as bonificações que sobraram depois da passagem pelo austríaco (seis segundos).

O piso empedrado onde o pelotão seguia a cerca de 30 quilómetros do final causou problemas aos ciclistas. Metade do grupo principal atrasou-se numa zona de passagem estreita. Muitos corredores caíram e outros tiveram que ficar obrigatoriamente parados devido ao entupimento causado pelos corpos e bicicletas tombados. Wout van Aert e Sepp Kuss foram dos principais afetados. Tobias Bayer não beneficiou desta agitação como se poderia esperar e acabou alcançado.

Na ponta final, equipas como a Soudal-Quick Step, a EF Education, a Uno-X Mobility e a Tudor Pro Cycling Team também fizeram uma candidatura a terem alguém no sprint. Porém foi Gerben Thijssen da Intermarché-Wanty o mais forte na ponta final e arrecadou a camisola amarela. Jordi Meeus, que venceu nos Campos Elísios em 2023, chegou aos últimos metros desacompanhado, mas conseguiu o terceiro lugar. Marijn van den Berg, da EF Education, ficou em segundo. O melhor português foi Rui Oliveira (6.º), da UAE Team Emirates.