Num ano “de transição” para a indústria portuguesa de calçado, cujas exportações caíram 13,8% em valor até julho, após recuarem 8,2% em 2023, o setor tenta inverter a tendência apostando na automatização, subcontratação e novas marcas.

Em declarações à agência Lusa em Milão, Itália, onde até terça-feira 39 empresas portuguesas participam na maior feira de calçado do mundo — a Micam –, o diretor comercial da Kyaia revelou que o grupo de Guimarães se prepara para lançar uma nova marca de sapatos unissexo no outono/inverno de 2025.

A apresentar “no final de outubro” aos agentes com que a empresa trabalha, a nova marca terá a designação Fred & Frederico (numa homenagem ao filho do fundador do grupo, Fortunato Frederico) e, segundo Paulo Monteiro, insere-se num segmento de calçado de “moda ‘outdoor'” que “não se enquadra no ADN” das outras marcas do grupo (Fly London, Softinos e As Portuguesas, esta última resultado de uma parceria com o grupo Amorim).

De acordo com o diretor comercial da Kyaia, a estratégia da nova marca passa por “tornar o calçado de ‘outdoor’ num produto que possa ser usado no dia a dia, como um produto de moda”, e tem como alvo o “público jovem”.

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O responsável assume que “é um risco” lançar uma nova marca no atual contexto internacional, de retração de consumo devido à instabilidade geopolítica e às mais altas taxas de juro e de inflação, mas considera que no segmento da moda ‘outdoor’ “existe algum potencial de crescimento”, que a Kyaia “quer explorar”.

O objetivo é afirmar a nova marca nos mercados onde as restantes insígnias da empresa já estão presentes, com destaque para o Reino Unido, Estados Unidos e Canadá. “Estamos também a tentar entrar na Escandinávia, onde estamos à procura de agentes”, acrescenta Paulo Monteiro.

Já Reinaldo Teixeira, fundador do grupo Carité, está a apostar na automatização, robotização e subcontratação como argumentos competitivos na atual conjuntura internacional adversa, assim como em novos mercados de exportação.

O grupo de Felgueiras — que produz 5.000 pares por dia, nas cinco fábricas que possui em Felgueiras, Celorico de Basto e Castelo de Paiva — lidera um consórcio de 45 parceiros que, num investimento de 60 milhões de euros, enquadrado no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), se propõe desenvolver até ao final do próximo ano a “fábrica inteligente do futuro”.

Intitulado FAIST, o projeto reúne universidades, empresas e instituições do sistema científico e tecnológico e está a desenvolver novas soluções que incluem desde ilhas de automação a linhas integradas e plataforma digitais, com o objetivo de conceber sistemas de produção “o mais automatizados possível”.

“Isto vai permitir-nos fazer um produto diferenciado”, salientou Reinaldo Teixeira, explicando que o que se pretende “não é aumentar a capacidade produtiva, mas reduzir minutos de produção e fazer um produto com maior qualidade, valor e preço final mais elevado”.

“Vai custar-nos menos a produzir e vamos vender mais caro”, sintetizou. Com uma faturação na ordem dos 50 milhões de euros nos últimos anos, o grupo Carité exporta praticamente toda a produção, tendo a Alemanha, Países Baixos, França e EUA como principais mercados.

Após ter perdido, pelo fator preço, alguns concursos internacionais no segmento do calçado profissional, a empresa — que em 2020 forneceu 80.000 pares de botas militares à NATO e gostaria de calçar também o exército português – está ainda a apostar na subcontratação de gáspeas para tornar alguns dos seus produtos mais competitivos.

“Estamos a fazer algumas gáspeas fora do país, em Marrocos e na Índia”, afirmou Reinaldo Teixeira, explicando que esta estratégia lhe permite também contornar a atual “dificuldade em encontrar mão de obra na área do corte e costura” em Portugal.

As exportações portuguesas de calçado recuaram 11,3% em quantidade e 8,2% em valor em 2023, face ao ano recorde de 2022, com 66 milhões de pares de calçado vendidos por 1.839 milhões de euros. Já nos primeiros sete meses de 2024, as exportações portuguesas de calçado nacional acumularam uma quebra homóloga de 13,8% em valor, para 1.013 milhões de euros, e de 1,6% em volume, para 41,5 milhões de pares.

Descrevendo 2023 como um período “de forte contenção” e 2024 como sendo “de transição”, o setor espera que 2025 seja “um ano de forte afirmação do calçado português nos mercados internacionais”.